BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro voltou a adotar uma retórica contrária ao uso de vacinas contra Covid-19 tendo como base dados e informações erradas no momento em que o país alcançou 100 milhões de pessoas com o ciclo vacinal completo e uma forte redução do contágio e mortes pelo coronavírus.
Em entrevista nesta quinta à Rádio Novas de Paz, de Pernambuco, Bolsonaro afirmou que a vacina ainda é uma interrogação e disse que discutir a imunização "virou crime", apontando que quando ele questiona os imunizantes, logo é chamado de negacionista.
"Quando você começa a discutir vacina, virou mais do que um tabu, virou crime. Vem logo o pessoal te acusando de negacionista, terraplanista, um montão de coisas", disse.
"Agora a vacina ainda é uma interrogação", emendou.
Dados e estudos do próprio governo e de instituições de pesquisa governamentais, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), entretanto, comprovam que a redução do número de infectados e óbitos por Covid se deu principalmente com a ampliação da vacinação no Brasil.
Para sustentar a sua tese equivocada contra a eficácia da imunização, Bolsonaro disse que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, tomou duas doses da vacina e sempre usa máscara, mas mesmo assim foi contaminado por Covid-19 na viagem que fez aos Estados Unidos.
Queiroga integrou a comitiva que acompanhou o presidente em eventos, entre eles na abertura da Assembleia-Geral das Nações Unidas, e teve um quadro leve da doença. Especialistas apontam que as vacinas não garantem que uma pessoa vacinada não será infectada, mas reduzem significativemente a probabilidade de apresentarem um quadro grave da doença e de morrerem por causa dela.
O presidente afirmou que não tomou a vacina e não foi contaminado. Ele questionou o fato de pessoas terem ido aos EUA e contraíram a doença e ele não, insinuando --novamente sem provas-- que haveria um lobby da indústria farmacêutica para vender vacinas ao país.
Em sua argumentação, Bolsonaro disse erradamente que nem metade da população do Japão se vacinou contra Covid. Contudo, cerca de 66% da população japonesa já foi completamente vacinada, conforme dados da Our World in Data.
Já o ministro da Economia, Paulo Guedes, em viagem esta semana aos Estados Unidos e numa outra linha em relação a Bolsonaro, afirmou que a prioridade e maior preocupação é com a vacina. "É a prioridade número um", disse o ministro.
Bolsonaro voltou a defender, na entrevista desta quinta, o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes contra Covid-19. Ele disse que nos próximos dias terá uma "notícia bomba" em relação ao uso da hidroxicloroquina e ivermectina, dizendo, mais uma vez sem quaisquer evidências, que milhares de pessoas poderiam ter sido salvas com o uso dessas medicações para o que chama de tratamento precoce.
Contudo, publicações renomadas nacionais e internacionais já descartaram a eficácia desses medicamentos contra o coronavírus. Além disso, alguns desses remédios podem ter efeitos colaterais em determinados pacientes.
(Reportagem de Ricardo Brito)