Um novo projeto de lei que menciona criptomoedas foi apresentado na Câmara dos Deputados semana passada. De autoria do deputado Geninho Zuliani (UB/SP), o projeto visa limitar a possibilidade de penhora de criptomoedas no Brasil.
De maneira geral, o PL 743/2022 fala sobre “bens impenhoráveis”, ou seja, que não podem ser liquidados em caso de dívidas. A nova lei inclui os criptoativos nesta categoria de bens, respeitado o limite de 40 salários mínimos.
Atualmente, o salário mínimo oficial do Brasil é de R$ 1.212 por mês, o que significa que quantias de criptomoedas no valor de até R$ 48.480 não serão penhoráveis. Esta lei também fala sobre fundos de investimento, títulos de renda fixa e caderneta de poupança.
“XIII – criptoativos do tipo moeda digital (altcoins), com representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço expresso não seja superior a quarenta salários mínimos”, diz a lei.
Contudo, existem algumas exceções que podem resultar na penhora de criptomoedas. Em primeiro lugar, se o valor superar o limite de 40 salários mínimos. Além disso, se o devedor tiver outra reserva monetária em seu nome, estará sujeito à penhora.
O novo projeto está em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJC).
Especialista fala sobre a nova lei
Mas o que significa uma maior dificuldade de penhora para criptomoedas? Antes de mais nada, é preciso saber o que é a penhora de bens. A advogada e professora do Insper Tatiana Revoredo explica o que é esse processo.
“A penhora se caracteriza pela constrição judicial de bens, em geral, dados pelo devedor em garantia de execução de dívida não paga, para que a obrigação seja satisfeita. É um ato de expropriação forçada pela quantia certa devida, superando a resistência do devedor”, explica.
Ou seja, a penhora é um recurso judicial executado em caso da falta de pagamento de uma dívida. Se o devedor se recusa a pagar, parte de seus bens é expropriada para arcar com o pagamento.
Logo, a penhora atua como uma forma de estimular o cumprimento de contratos. De fato, Zuliani utilizou este argumento como justificativa do seu PL, afirmando que não poderia excluir totalmente as criptomoedas do sistema de penhora.
Ao mesmo tempo, ele defende que a impenhorabilidade tenha certos limites. No caso do PL, a quantia de até 40 salários mínimos não poderá ser penhorada. Valores acima disso, contudo, estarão sujeitos a esse tipo de expropriação.
De acordo com Revoredo, a limitação da penhora tem o objetivo de garantir o pagamento ao credor, mas sem prejudicar o devedor. Essa proteção visa sobretudo os pequenos investidores, que muitas vezes possuem apenas uma aplicação.
“A intenção do legislador foi a de preservar as reservas do pequeno poupador, isto é, preservar os interesses daquele que mantém depósitos em caderneta de poupança com o nítido propósito de resguardar as economias pessoais ou para algum fim específico, e não aquelas importâncias mantidas a produzir renda enquanto não empregadas”, diz Revoredo.
Jurisprudência brasileira
O PL 743/2022 foi embasado em uma jurisprudência criada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) sobre um caso de 2014. Na ocasião, o TJSP reafirmou a impenhorabilidade dos fundos de investimento e também das criptomoedas.
No caso de 2014, criptomoedas chegaram a ser incluídas como itens passíveis de penhora, mas o credor recusou. De acordo com os autos do processo, a recusa se deu pelo fato das criptomoedas “não possuirem valor certo”.
Revoredo destaca que as criptomoedas alvo da penhora precisam estar em uma plataforma que possa ser acionada pela Justiça. Ou seja, uma exchange ou empresa que negocie criptomoedas. Sem isso, o credor precisaria provar que o devedor possui criptomoedas fora dessas plataformas.
“A penhora de bitcoins só é possível, somente o credor prove que seu alvo possui esse tipo de investimento. Este é o entendimento da 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, que não acolheu pedido de um banco neste sentido”.
Por fim, a lei não menciona especificamente o Bitcoin, mas sim as altcoins. Portanto, isso significa que, até o momento atual, o BTC está de fora de qualquer possibilidade de penhora. Mas a lei ainda precisa tramitar pela Câmara e depois no Senado, para finalmente ir à sanção do presidente da república.