Por Marcela Ayres e Camila Moreira
BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) - O Banco Central já não vê a inflação no centro da meta em 2017, destacando em seu Relatório de Inflação que conduzirá uma política monetária "especialmente vigilante", o que fortalece a possibilidade de novo aumento de juros já na próxima reunião do Copom, em janeiro.
Diante da crescente desancoragem das expectativas do mercado para o avanço do IPCA, alimentada por conturbado ambiente político e fiscal no Brasil e por um ajuste de preços relativos considerado mais demorado e intenso, o Banco Central havia esticado em outubro o horizonte de convergência da inflação a 4,5 por cento para 2017 ao invés de 2016.
Mas no documento divulgado nesta quarta-feira, passou a ver o IPCA a 4,8 por cento em 2017. No último relatório, de setembro, o BC enxergava o índice em 4,0 por cento no terceiro trimestre de 2017.
Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Gonçalves, essa é a grande novidade do documento. "Consolida a percepção de que vão subir a Selic de novo no começo do ano", disse.
Desde julho a taxa básica de juros segue em 14,25 por cento ao ano, maior patamar em nove anos. O BC vinha mantendo a Selic inalterada apesar da deterioração das expectativas para a inflação, contando com a fraqueza econômica para o arrefecimento dos preços domésticos.
"Achamos que aumentou bastante a probabilidade de elevar os juros no início do ano", disse o economista sênior do banco de investimento Haitong, Flávio Serrano, que antes do relatório ainda previa estabilidade da Selic, mas que agora vai mudar sua projeção.
"Parece que o BC vai fazer ajuste para reduzir a probabilidade de estourar o teto da meta (em 2016). Então a gente acha muito provável subir a taxa de juros em janeiro, com ciclo modesto, de 125 pontos", acrescentou.
No relatório, o BC reconheceu que outras ações de política macroeconômica podem influenciar a trajetória de preços, mas reafirmou que "que cabe especificamente à política monetária manter-se especialmente vigilante, para garantir que pressões detectadas em horizontes mais curtos não se propaguem para horizontes mais longos".
As sinalizações de preocupação com a inflação do Banco Central não foram suficientes para elevar as taxas dos contratos de juros futuros nesta manhã, que recuavam em um dia marcado por baixo volume de negócios, mas os operadores do mercado futuro seguem apostando em uma alta em janeiro.[nL1N14C0K0]
Em pesquisa Focus divulgada nesta semana, economistas de instituições financeiras já apontavam expectativa de uma alta de 0,5 ponto percentual na Selic na reunião do Copom em janeiro. [nL1N14A0EU]
2016
Para 2016, o BC também ajustou sua expectativa de inflação para cima, com o IPCA a 6,2 por cento, contra 5,3 por cento anteriormente. Em relação a 2015, a projeção para a inflação subiu a 10,8 por cento, ante 9,5 por cento antes, tendo como pano de fundo uma expectativa para a atividade econômica também pior, com declínio do Produto Interno Bruto (PIB) de 3,6 por cento ante 2,7 por cento.
Para 2016 a expectativa é de queda de 1,9 por cento do PIB.
Nos cálculos do BC, a chance de a inflação ultrapassar o teto do intervalo de tolerância da meta está em torno de 41 por cento em 2016, e de 20 por cento em 2017.
A meta central de inflação é de 4,5 por cento pelo IPCA, mas com margem de 2 pontos percentuais neste ano e em 2016 e de 1,5 ponto em 2017.
INCERTEZA FISCAL E RISCO INERCIAL
O BC assinalou no documento que a inflação em patamares elevados hoje reflete também "incertezas quanto à velocidade do processo de recuperação dos resultados fiscais e à sua composição".
O relatório trouxe ainda que a recente depreciação cambial e a inércia inflacionária representam "riscos relevantes", afirmando, em contrapartida, que o arrefecimento dos preços monitorados e os efeitos das ações de política monetária recentemente implementadas devem favorecer a desaceleração da inflação ao consumidor.
O BC repetiu que "adotará as medidas necessárias de forma a assegurar o cumprimento dos objetivos do regime de metas, ou seja, circunscrever a inflação aos limites estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), em 2016, e fazer convergir a inflação para a meta de 4,5 por cento, em 2017".