Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) -O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta quarta-feira que a autoridade monetária entende que é muito importante perseguir a meta de inflação, mas compreendendo as limitações colocadas por uma crise quase sem precedentes.
Com a fala, Campos Neto relativizou a viabilidade do cumprimento do objetivo para 2022 num momento em que ele é visto com cada vez mais desconfiança pelo mercado, em contraste com a postura assumida pelo BC logo após a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em outubro, quando a mensagem era de que ainda via convergência à meta de inflação do ano que vem com o ritmo de aperto monetário adotado.
Em conferência promovida pelo Bank of America, Campos Neto disse nesta tarde que o BC começa a ver desancoragem nas expectativas de inflação à frente, com um nível de desancoragem para 2022 que tem ganhado terreno nas últimas semanas.
No boletim Focus mais recente, a estimativa para a inflação em 2022 subiu a 4,96%, ante meta central de 3,5%, com margem de 1,5 ponto para mais ou para menos.
Segundo Campos Neto, o BC tem sido transparente sobre como vê as pressões inflacionárias e sobre como está agindo.
"Achamos que é muito importante perseguir a meta de inflação, entendendo as limitações de uma crise que tem quase nenhum precedente, mas entendendo que a disseminação através das cadeias de preços tem sido muito mais intensa do que antecipávamos", afirmou.
Questionado especificamente se a prioridade do BC ainda seria entregar a inflação de 2022 na meta e se o ciclo de aperto monetário para tanto precisaria ser encerrado até a reunião do Copom de março do ano que vem, Campos Neto não foi assertivo quanto à possibilidade de a missão ser atingida, ressaltando as dificuldades enxergadas pela autarquia.
"Temos destacado que o nosso objetivo é trazer a inflação para a meta. E também destacamos que os componentes qualitativos da inflação têm piorado muito mais que esperávamos", disse ele, chamando atenção para o processo de propagação do aumento de preços.
"Também fomos surpreendidos sobre o quão persistentes alguns dos choques têm sido", complementou.
De acordo com o presidente do BC, os bancos centrais podem cometer o erro de subir as taxas de juros muito rápido, o que pode atrapalhar a percepção sobre o impacto defasado da ação, ou muito devagar, o que acaba demandando taxas mais elevadas por mais tempo à frente.
"O objetivo é não cometer nenhum desses erros, é ter a compreensão de quais são os perigos de cair em qualquer desses lados, entendendo que os diferentes países veem esse dilema de forma diferente."
"Se você tem um país que tem uma memória inflacionária mais vívida, você tende a acreditar que é muito importante assegurar que a desancoragem da inflação não comece a afetar os preços da economia de uma forma que crie uma inércia que é mais elevada e que poderia ter sido evitada por uma postura mais proativa", disse.
Em outubro, o BC elevou a Selic em 1,5 ponto, ao nível atual de 7,75% ao ano, antevendo à época outro ajuste de igual magnitude na próxima reunião do Copom, que ocorre nos dias 7 e 8 de dezembro.
Parte das apostas do mercado, contudo, é de que um ajuste maior será necessário diante de um quadro inflacionário que mostrou-se mais desafiador e persistente, em meio a incertezas principalmente de cunho fiscal.
FISCAL
Sobre o panorama fiscal, Campos Neto voltou a avaliar que um prêmio de risco alto foi pago para desvio fiscal que não foi tão grande, em referência à mudança na regra do teto de gastos proposta na PEC dos Precatórios.
Na semana passada, ele já havia passado igual mensagem.
O presidente do BC também reforçou que houve melhora recente no resultado primário e frisou ser importante haver indicação, pelo governo, de qual será o arcabouço vigente para sinalizar a trajetória de gastos públicos adiante.
(Por Marcela Ayres; Edição de Maria Pia Palermo e Isabel Versiani)