Por Ann Saphir e Howard Schneider
(Reuters) - No verão norte-americano de 2005, Philip Jefferson passou várias semanas aprendendo com a colega Amy Vollmer, professora da Swarthmore College, como desenvolver bactérias geneticamente para resistir a antibióticos, um interlúdio incomum para um professor titular de economia.
Jefferson diz que sua breve incursão no campo de Vollmer deu a ele novas ideias para ensinar em sua própria disciplina. Segundo Vollmer, anos depois Jefferson lhe disse ter sido uma das melhores coisas que ele já havia feito.
Jefferson, agora reitor da Davidson College, na Carolina do Norte, está prestes a ultrapassar novamente os limites depois de ser escolhido pelo presidente dos EUA, Joe Biden, para se juntar à diretoria do Federal Reserve, que administra o banco central da maior economia do mundo.
Ele e a economista da Michigan State University Lisa Cook e a ex-diretora do Fed Sarah Bloom Raskin se apresentarão na quinta-feira ao Comitê Bancário do Senado dos EUA para uma audiência de confirmação.
Se Cook e Jefferson forem confirmados, seria a primeira vez que dois diretores negros atuariam ao mesmo tempo na diretoria do Fed, formada por sete membros, sendo Cook a primeira mulher não branca a ocupar o cargo.
Raskin, cuja nomeação como vice-presidente de supervisão do Fed a tornaria a principal reguladora bancária do Fed, quase certamente atrairá a maior parte das perguntas dos senadores.
Suas opiniões sobre o risco climático e as exigências de capital dos bancos --saudadas por alguns democratas como provavelmente sinalizadoras de mais restrições para Wall Street e criticadas pelos republicanos pelo mesmo motivo-- serão submetidas a um escrutínio particular.
Mas investidores também estão ansiosos para saber exatamente em que espectro da política monetária estão os três indicados --nenhum dos quais respondeu aos pedidos da Reuters para comentários--, num momento em que o Fed se prepara para combater a inflação nas alturas.
POMBAS OU FALCÕES?
Analistas de Wall Street esperam que o Fed comece a apertar a política monetária no próximo mês, elevando as taxas de juros no ritmo mais rápido em décadas e encolhendo seu balanço patrimonial de forma acelerada, à medida que desfaz medidas de emergência que lançou para limitar os danos econômicos da pandemia de Covid-19.
Muitos desses mesmos analistas também classificaram todos os três indicados do Fed como inclinados à ala "dovish" --isto é, mais preocupados em apoiar o lado do pleno emprego do duplo mandato do Fed do que em combater a inflação, que muitas vezes afeta o crescimento econômico e o mercado de trabalho.
Eles chamam atenção para o apoio de Raskin a uma abordagem mais lenta no aperto monetário em 2013, quando ela estava na diretoria do Fed. E citam o foco da pesquisa de Jefferson na pobreza e o de Cook no peso que a desigualdade exerce sobre o crescimento econômico como evidência de que tolerariam uma inflação mais alta como o preço de um mercado de trabalho mais forte.
Dito isso, está longe de estar claro com que força qualquer novo membro do Fomc faria campanha em prol de uma política monetária estimulativa com a inflação atingindo seu nível mais alto desde 1982, consumindo os ganhos salariais e tornando mais difícil para os norte-americanos --famílias de baixa renda em particular-- sobreviver.
De fato, Andy Levin, da Dartmouth College, diz que o olhar que os indicados voltam aos norte-americanos comuns sugere o oposto, pelo menos por enquanto.
"É ruim para as pessoas comuns se a inflação ficar em 5% ou continuar subindo", disse ele. "Todos eles serão fortes defensores do mandato duplo, mas isso não significa ser complacente com a inflação."
É um tema também ouvido de Michelle Holder, presidente da Equitable Growth, um think tank amplamente focado na desigualdade econômica.
"Considerando o peso, a enorme importância que a inflação tem para a maioria das famílias e indivíduos norte-americanos, o Fed simplesmente tem que fazer o controle primário da inflação", disse ela à Reuters. Embora isso não signifique que o Fed pode parar de se preocupar com empregos, "controlar a inflação provavelmente tem de ter precedência agora".
É um tema que os democratas, preparando-se para o que pode ser uma audiência acalorada na quinta-feira, estão ansiosos para enfatizar.
Nesta quarta-feira, o escritório do presidente do Comitê Bancário do Senado, Sherrod Brown, divulgou memorando dizendo que Cook "acredita que precisamos colocar os trabalhadores em primeiro lugar em nossa economia, concentrando-nos no mandato de pleno emprego do Fed e reduzindo os preços para que os salários cheguem mais longe", enquanto Jefferson "atacaria os desafios econômicos enfrentados por todos os norte-americanos que foram deixados para trás em nossa economia".
FOCO NA INFLAÇÃO?
Além disso, com todos os três indicados se juntando a um Fed notavelmente unido na necessidade de remover a acomodação da política monetária, é improvável que mesmo visões "dovish" fortemente defendidas mudem isso.
"Em um nível muito alto, o mandato é bastante claro, de modo que o 'grosso' não vai mudar e as perspectivas não vão mudar dependendo de quem está sentado nas cadeiras", disse o presidente do Fed de Atlanta, Raphael Bostic, em entrevista realizada em janeiro.
O senador Pat Toomey, o principal republicano do comitê bancário, sugeriu que os indicados são partidários, em parte por causa da atenção a questões como desigualdade racial e mudança climática.
Mas, em algum nível, os indicados personificam a pesquisa aprofundada do próprio Fed sobre as implicações econômicas de tais questões.
Uma vez que a inflação esteja mais contida, disse Bostic, "você verá muitos de nós nos inclinando para dizer que começamos '(com inflação) mais baixa por mais tempo', começamos a 'ser pacientes', agora que temos a inflação sob controle, vamos voltar a isso tipo de abordagem".
Ainda assim, quem conhece os indicados diz que seria um erro fazer muitas suposições sobre quais serão suas perspectivas.
Trevor Logan, professor de economia da Ohio State University, citou um projeto de pesquisa com Cook que começou como uma "aposta" em uma nova abordagem que ela estava adotando para extrair dados do censo.
"Comecei essencialmente a duvidar dela e acabei de queixo caído" quando acabou funcionando, disse ele. "Fiquei continuamente impressionado com a criatividade dela."
A ideia de que Jefferson seria um "pombo" (inclinado a políticas monetárias mais expansionistas) "provavelmente não está certa", disse o professor de economia da Swarthmore College, Mark Kuperberg, que trabalhou e almoçou com Jefferson regularmente por duas décadas. Ele disse que Jefferson como economista "está bem no meio do caminho".
John Caskey, outro colega do departamento de economia de Swarthmore, recusou-se a especular sobre os aprendizados de Jefferson acerca da política monetária, mas lembrou o período do candidato como microbiologista há muitos anos. "Ele tem uma mente aberta", disse Caskey.