Por José de Castro e Isabel Versiani
SÃO PAULO (Reuters) - O Banco Central manteve nesta quarta-feira, por unanimidade, a taxa Selic no piso histórico de 6,50% ao ano pela décima reunião consecutiva, um recorde, e ressalvou que, embora o balanço de riscos para a inflação tenha evoluído de maneira favorável, o risco relacionado à agenda de reformas é preponderante, o que pede manutenção do juro básico no atual patamar.
A sinalização dada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), segundo economistas, é de que cortes de juros só ocorrerão após a aprovação da reforma da Previdência no plenário da Câmara dos Deputados, o que de acordo com algumas estimativas mais otimistas pode acontecer em julho.
A indicação do BC contraria, assim, o entendimento de parte do mercado de que a percepção de que a reforma caminha para ser aprovada seria suficiente para determinar um corte da taxa. E se dá num momento em que a economia corre risco de entrar em recessão técnica, as expectativas de inflação perdem força –afastando-se mais do centro da meta-- e o mercado vê o ambiente político mais benigno.
"O Copom introduziu um viés 'dovish', deixou a porta aberta (para uma redução dos juros)", disse Alberto Ramos, diretor do departamento de pesquisas econômicas do Goldman Sachs para a América Latina. "(Mas) acho que só vai de fato considerar cortar em julho se a reforma da Previdência for aprovada em primeiro turno no plenário da Câmara. Se essa votação não acontecer, ou se for aprovado um texto muito aguado, pode decidir não cortar."
A decisão do BC nesta quarta-feira veio em linha com a apontada por pesquisa Reuters. No mercado de derivativos da B3, a aposta predominante era de estabilidade da Selic para esta quarta-feira, mas contratos futuros de DI chegaram a indicar na semana passada mais de 20% de probabilidade de corte de 0,25 ponto percentual.
Na B3 e na pesquisa Focus do Banco Central, o mercado já projeta Selic perto de 5,75% ao fim deste ano.
PROJEÇÕES
As projeções do Copom para a inflação --tanto no cenário de mercado quanto no de referência-- indicam IPCA abaixo do centro da meta em 2019 e 2020, o que poderia ser visto como um reforço à perspectiva de alívio monetário.
No cenário de mercado, que considera projeções para câmbio e juros de analistas consultados pelo Banco Central para a pesquisa Focus, o Copom projeta alta para o IPCA de 3,6% em 2019 e de 3,9% em 2020. Em maio, as estimativas eram de 4,1% e 3,8%, respectivamente.
A meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para este ano é de 4,25%. Para 2020, cai para 4,00%.
No cenário de referência, que leva em conta taxas de juros e de câmbio constantes, o Copom prevê IPCA de 3,6% para 2019 e de 3,7% para 2020. Em maio, os prognósticos estavam em 4,3% e 4,0%, respectivamente.
"O Banco Central sinalizou que está pronto para cortar os juros", disse Eduardo Velho, economista-chefe da GO Associado, para quem a sinalização de agora é "praticamente igual" à feita pelo Copom em agosto de 2016, quando o BC chamava a atenção para a importância do projeto que estabeleceu o teto de gastos.
"(Mas) acho que o cenário mais provável é que (o Copom) comece a recuar a taxa de juros a partir da segunda reunião do segundo semestre", acrescentou o economista, referindo-se ao mês de setembro. Velho projeta Selic de 5,5% ao fim de 2019.
RISCO EM AMBAS AS DIREÇÕES
O BC excluiu o termo "simétrico" para se referir ao balanço de risco à inflação --utilizado no comunicado da decisão de maio. E informou que em seu cenário básico para a inflação permanecem fatores de risco em ambas as direções.
O Copom citou três riscos: dois domésticos e um externo. Para o colegiado, uma "eventual frustração" das expectativas para reformas e ajustes necessários à economia brasileira pode afetar prêmios de risco e elevar a trajetória da inflação no horizonte relevante para a política monetária.
Esse risco é intensificado, segundo o Copom, com a eventual deterioração do cenário externo para economias emergentes.
Do lado benigno para a inflação, o "elevado" nível de ociosidade da economia pode continuar produzindo trajetória prospectiva abaixo do esperado para a alta dos preços.
Ainda no comunicado, o Copom reiterou que a conjuntura econômica prescreve política monetária estimulativa, "com taxas de juros abaixo da taxa estrutural" -aquela que, teoricamente, não estimula nem restringe o crescimento econômico e mantém a inflação na meta. Também eliminou trecho que mencionava que sua avaliação sobre o cenário econômico poderia não ser concluída a curto prazo.
O texto do comunicado deu sequência às mudanças gradativas feitas pelo colegiado do BC no sentido de se ajustar ao cenário de atividade econômica e inflação mais fracas, o que tem corroborado expectativas de cortes da Selic nos próximos meses.
Em fevereiro, o Copom disse que o balanço de riscos para a inflação mostrava "assimetria" para uma inflação mais elevada. Já em março, o colegiado passou a considerar riscos simétricos, com atividade econômica em "ritmo aquém do esperado", mas em processo de retomada.
Em maio, o Banco Central manteve a leitura de balanço de riscos simétrico para a inflação, mas sugeriu piora na avaliação para a economia ao dizer que os indicadores sinalizavam "continuidade" do arrefecimento da economia do fim de 2018 para o início de 2019, esperando retomada do processo de recuperação "gradual".
Além disso, na ata da reunião de maio, o Copom reconheceu que os riscos associados à ociosidade dos fatores de produção haviam se elevado na margem.
Com a manutenção da Selic nesta quarta-feira, o Copom evita mexer nos juros pela décima reunião consecutiva, um recorde do regime de metas de inflação no Brasil. Entre setembro de 2015 e agosto de 2016, o colegiado do BC deixou os juros em 14,25% por nove reuniões seguidas.
A próxima reunião de política monetária do BC está prevista para os dias 30 e 31 de julho.