Por Rodrigo Viga Gaier e Camila Moreira
RIO DE JANEIRO/SÃO PAULO (Reuters) - A inflação oficial do Brasil surpreendeu em dezembro e subiu mais do que o esperado, por conta dos preços dos alimentos e transportes, mas ainda assim fechou 2017 no menor nível em 19 anos e abaixo do piso da meta pela primeira vez, mantendo o caminho aberto para mais redução dos juros básicos.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou no ano passado alta de 2,95 por cento, nível mais baixo desde 1998 (1,65 por cento) e depois de ter encerrado 2016 com avanço de 6,29 por cento, informou nesta quarta-feira o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O resultado ficou abaixo da meta do governo de 4,5 por cento, com margem de 1,5 ponto percentual para mais ou menos, algo inédito desde que o regime de metas de inflação foi definido, em 1999.
Só em dezembro, o IPCA acelerou a alta a 0,44 por cento, sobre 0,28 por cento em novembro, e acima da expectativa em pesquisa da Reuters de alta de 0,30 por cento. O resultado no ano também superou o esperado, de 2,80 por cento.
A pressão no último mês do ano veio principalmente da alta de 0,54 por cento nos preços de Alimentação e Bebidas, após sete meses seguidos de deflação, devido às festas de fim de ano.
O grupo Transportes também subiu bastante (1,23 por cento) no mês passado, com destaque para os preços de passagens aéreas mais altos (22,28 por cento) e da gasolina (2,26 por cento). Juntos, com impacto de 0,18 ponto percentual, estes dois itens representaram 41 por cento do IPCA de dezembro.
Mas apesar de os alimentos terem pesado no mês passado, 2017 marcou a única vez que o grupo apresentou deflação anual (1,87 por cento) desde a implantação do Plano Real em 1994, por conta da supersafra.
"Não se deve esperar a repetição da queda de alimentos este ano, uma vez que a safra não será tão boa e haverá aumento da demanda. Mas não se deve esperar alta forte, e sim um realinhamento", explicou o gerente da pesquisa no IBGE, Fernando Gonçalves. "O que se deve esperar para o IPCA é um padrão novo, porém controlado."
Na outra ponta, o maior impacto positivo no ano foi exercido por Habitação, com alta de 6,26 por cento nos preços, seguido de Saúde e Cuidados Pessoais, com avanço de 6,52 por cento.
Segundo o IBGE, 10 itens do IPCA de 2017 responderam por 87 por cento do indicador, sendo boa parte formada por preços administrados. Só o impacto do preço da gasolina foi de 0,41 ponto percentual no ano passado.
JUROS
O nível fraco de inflação mantém aberto o espaço para o BC continuar reduzindo os juros básicos depois de terem terminado o ano passado na mínima histórica de 7 por cento, em meio ao ritmo gradual de recuperação econômica.
"A inflação vai voltar a reagir em 2018, mas ainda vemos cenário de expectativas bastante ancoradas, inclusive no centro da meta de 2018", disse o analista de inflação da consultoria Tendências, Marcio Milan, que projeta a Selic a 6,75 por cento e a inflação a 4,1 por cento no fim deste ano.
A expectativa em geral é de novo corte na taxa de 0,25 ponto percentual em fevereiro, como vem sendo indicado pelo BC, e os juros futuros já mostram apostas em nova redução em março.
Os principais riscos para a condução da política monetária ao longo de 2018 não devem vir da inflação, mas sim do câmbio e das incertezas políticas, de acordo com o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno.
"O fator eleição tende a deixar o cambio volátil, e o BC deve adotar um postura mais cautelosa após fevereiro", disse ele, que também projeta apenas mais um corte de 0,25 ponto percentual na taxa de juros.
A inflação ter fechado 2017 abaixo do piso da meta obrigaria o presidente do BC, Ilan Goldfajn, a redigir uma carta aberta para explicar o motivo desse quadro.
Entretanto, o BC costuma arredondar a segunda casa do resultado da inflação após a vírgula, o que levaria o IPCA de 2017 a ficar exatamente no piso. Questionado, o BC afirmou que ainda não poderia informar imediatamente se a carta seria divulgada ou não.