Por Camila Moreira e Rodrigo Viga Gaier
SÃO PAULO/RIO DE JANEIRO (Reuters) - A produção da indústria brasileira registrou em dezembro o oitavo aumento seguido mas ainda assim encerrou 2020 com a maior queda em quatro anos diante das consequências da pandemia de coronavírus, pressionada principalmente pelo setor de automóveis.
Apesar da sequência de ganhos, a indústria como um todo terminou 2020 com recuo na produção de 4,5%, segundo ano seguido de perdas após registrar contração de 1,1% em 2019, segundo os dados divulgados nesta terça-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Foi a retração anual mais forte desde 2016, quando houve queda de 6,4%, e a indústria enfrenta agora incertezas relacionadas às medidas de estímulos e ao desemprego alto.
Em dezembro, a indústria teve alta de 0,9% na produção em comparação com novembro e acumulou em oito meses ganhos de 41,8%, o que elimina a perda de 27,1% registrada entre março e abril, ápice do isolamento social para contenção da Covid-19.
Com esses resultados, o setor industrial está 3,4% acima do patamar de fevereiro de 2020 e termina o quarto trimestre com ganho de 5,1% sobre os três meses anteriores, quando houve alta de 22,3%.
Na comparação com dezembro de 2019, a produção teve alta de 8,2%. Ambos os resultados ficaram acima das expectativas em pesquisa da Reuters com economistas de avanço de 0,2% na variação mensal e de 6,3% na base anual.
"A indústria vem positiva com perfil disseminado, mas tem espaço muito importante a recuperar. Isso não é só pandemia, é algo que vem há alguns anos", afirmou o gerente da pesquisa, André Macedo.
VEÍCULOS
Os dados do IBGE mostraram que em 2020 a maior pressão negativa foi exercida por veículos automotores, reboques e carrocerias, com contração de 28,1% contra o acumulado de 2019, pressionada principalmente, pelos itens automóveis, caminhão-trator para reboques e semirreboques, caminhões e autopeças.
Na comparação de 2020 com o ano anterior, todas as grandes categorias tiveram queda, com destaque para bens de consumo duráveis (-19,8%) e bens de capital (-9,8%).
"Ambas têm a dinâmica de produção muito associada à indústria de automotores. No caso da primeira, com influência dos automóveis, como os carros, e no caso da segunda, os equipamentos de transporte, como caminhões", explicou Macedo.
Em dezembro, três das quatro grandes categorias econômicas e 17 de 26 ramos pesquisados tiveram ganhos, o que para Macedo mostra regularidade de crescimento na produção industrial nos últimos meses.
A principal influência segue sendo a de veículos automotores, reboques e carrocerias, com ganho de 6,5% no mês e acumulando expansão de 1.308,1% na produção nos últimos oito meses. Na outra ponta, a produção de produtos alimentícios apresentou queda de 4,4% em dezembro sobre novembro.
Já entre as categorias econômicas, bens de capital e bens de consumo duráveis cresceram 2,4% no mês.
Depois das perdas vistas em março e abril, a indústria passou a se beneficiar de estoques muitos baixos aliados à mudança da demanda de serviços para bens.
Mas a recuperação da indústria, embora tenha encontrado base nas medidas de auxílio do governo e na flexibilização do isolamento, ainda depende da uma retomada do mercado de trabalho, que vem mostrando mais dificuldades. O fim do pagamento do auxílio emergencial em dezembro também preocupa.
"Os programa de transferência de renda, manutenção de emprego e crédito estão por trás dessa recuperação e alcançaram uma contigente importante da população e ajudaram no movimento (da indústria)", disse Macedo. "Agora há fatores que inibirão, como se o auxílio vai continuar ou não. O mercado de trabalho vai ser determinante para sustentar a indústria e a economia como um todo."
A mais recente pesquisa Focus do Banco Central mostra que os economistas esperam ganho de 5,02% da produção da indústria em 2021, com um aumento de 2,40% em 2022.
"Olhando para frente, a maior incerteza segue concentrada na retirada dos estímulos que têm contribuído positivamente para a indústria. Alguns indicadores já mostram que a manufatura pode perder algum fôlego nos próximos meses", disse em nota a economista da XP Lisandra Barbero, calculando crescimento de 3,5% da produção industrial em 2021.