O presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Antônio Gustavo Rodrigues, disse hoje (19) que, apesar da evolução tecnológica e das novas ferramentas de segurança oferecidas pelos bancos, ainda há enorme preocupação com o uso do dinheiro em espécie, que não é rastreável.
Por isso, em palestra no 7º Congresso de Combate e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo, Antônio Gustavo destacou que é preciso tomar medidas para restringir a circulação e proibir ou dificultar a adoção de pagamentos em dinheiro.
"Isso para qualquer pagamento. Se você vai comprar um carro, uma casa, não vai ficar carregando mala de dinheiro. Para qualquer tipo de pagamento, não é razoável que uma pessoa carregue grandes quantidades de moeda. Em princípio, eu diria que devia ser proibido pagar em dinheiro a partir de R$ 30 mil. Até mesmo menos do que isso já é muito dinheiro para ficar carregando. Devíamos seguir o exemplo de outros países e ter leis proibindo pagamentos acima desse valor em dinheiro”, afirmou Antônio Gustavo.
Ele ressaltou ainda que é preciso haver sinergia entre os órgãos reguladores e os regulados para que a troca de informações contínua permita o combate efetivo à lavagem de dinheiro. “Apesar de o Coaf [conselho ligado ao Ministério da Fazenda] não ser regulador, interage tanto com reguladores quanto com regulados, especialmente na área da lavagem de dinheiro, que requer muita troca de informações e entendimento para que processos identifiquem situações que permitam ao Coaf trabalhar e assim ajudar a polícia e o Ministério Público”.
Segundo Antônio Gustavo, como unidade de inteligência financeira, o Coaf trabalha recebendo informações de vários setores econômicos, principalmente os bancos e quanto mais essas instituições forem capazes de detectar situações suspeitas e informar o Coaf, melhores serão as informações para a polícia e o Ministério Público.
“Tivemos uma enorme evolução nos sistemas brasileiros, mas é preciso uma ótima relação entre o Banco Central e os bancos para que esse trabalho seja cada vez melhor, porque, do outro lado, tem sempre o bandido querendo esconder, burlar ou evitar a norma. Eles [bandidos] estão sempre inventando novas formas, e nós temos de estar sempre conversando para descobrir essas novas formas e tampar os buracos”, disse Antônio Gustavo.
Para o presidente do Coaf, os sistemas de segurança e de detecção de fraudes estão avançados, e cada vez que se descobre alguém "guardando dinheiro no apartamento", quer dizer que essa pessoa não quis colocar o dinheiro no banco justamente por saber que poderia ser pego. "Depois que o criminoso está com o dinheiro, ele vai querer lavar esses valores; então, já vai cometer um segundo crime. Estamos trabalhando na segunda fase. Se esse sistema não estivesse funcionando, os criminosos que estão guardando dinheiro em espécie, estariam colocando no banco. Se eles não colocam, já é um sinal de que o sistema está funcionando”, acrescentou.
Antônio Gustavo ressaltou que o banco precisa conhecer bem seu cliente, já que bilhões de transações são feitas diariamente e nem sempre é possível perceber o crime em todas elas. Em algumas situações, porém; a transação chama a atenção: “Há momentos em que o custo de conhecer um empresário que movimenta R$ 100 mil vai ser o mesmo de conhecer o trabalhador informal que ganha R$ 1.000. Então, é preciso ter um esquema de análise de risco para saber onde alocar recurso. Isso não é surpresa, a própria receita trabalha assim”.
De acordo com o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, que promove o congresso, o setor bancário é muito ativo no fornecimento de dados relevantes para as autoridades responsáveis pelo combate à lavagem de dinheiro. Conforme dados da Febraban, em 2016, o volume de comunicações de operações suspeitas ao Coaf ultrapassou 56 mil. Este ano, somente até agosto, foram comunicadas quase 40 mil operações. O setor bancário continua como o principal remetente de comunicações ao Coaf, sendo que 17% dessas comunicações transformaram-se em abertura de investigação no ano passado.
“Temos aperfeiçoado, ano a ano, as maneiras de enfrentar o desafio considerável de analisar os possíveis desvios de comportamento e identificar possíveis irregularidades. Os bancos empregam recursos tecnológicos de altíssima qualidade, adotando rígidas regras de controle e contratando profissionais cada vez mais qualificados e atentos”, destacou Portugal.
Segundo Portugal, o trabalho feito pelos bancos é exclusivamente de informação e auxílio às autoridades, às quais cabe investigar e punir criminosos. “Temos ressaltado que somente as autoridades públicas têm o poder, os instrumentos e a responsabilidade de aprofundar as investigações, de proibir e de apontar e punir os culpados. O setor privado não tem nem a responsabilidade, nem os instrumentos para tal e é, na maioria das vezes, também vítima desses crimes”, afirmou. Os bancos não têm poderes legais para impedir que clientes façam saques de valores expressivos das contas, e somente uma lei federal pode proibir isso, acrescentou.