O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, espera que a meta de zerar o déficit primário em 2024 seja mantida em março. Com a edição da MP (Medida Provisória) 1.202, de 2023, vai reonerar 17 setores da economia brasileira a partir de abril, além de sustar a redução de alíquota previdenciária de 20% para 8% sobre o salário do funcionalismo para os municípios com até 156.216 habitantes.
A medida também limita a compensação de créditos tributários obtidos por empresas por meio de decisão judicial e extingue até 2025 os benefícios tributários concedidos às empresas de promoção de eventos por meio do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos).
A iniciativa visa a aumentar a arrecadação federal neste ano. Na prática, dará um fôlego a Haddad para contornar a exigência de que a meta fiscal seja revisada em março.
É que no mês em questão, o Tesouro Nacional divulgará o relatório bimestral das contas públicas. No documento, apontará se há ou não frustração de receitas.
O governo se lançou na difícil missão de obter receitas extras de R$ 168,5 bilhões e, assim, cumprir o objetivo fiscal. A medida é praticamente inexequível, de acordo com economistas.
Por causa disso, a meta teria de ser alterada para acomodar algum déficit. Com a MP na praça, o ministro poderá argumentar que tem expectativa de novas receitas a partir de abril.
Por essa razão, manteria a meta zero por mais algum tempo, na expectativa de ir arrancando o que for possível do Congresso. Assim, se consolida a forma de atuação do titular da Fazenda –ele sabe que precisa continuar a pressionar para arrecadar mais em 2024 e assim conseguir mais dinheiro, ainda que seja atendido apenas parcialmente.
Ao convencer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a baixar a MP da arrecadação no apagar das luzes de 2023, Haddad teve um objetivo principal: chamar a atenção para o que considera distorções tributárias e tentar arrancar algo do Congresso até o fim do 1º trimestre.
Efeitos da MP
A medida tem 3 pontos para aumentar arrecadação do governo em 2024. Eis abaixo quanto a equipe econômica espera obter em receitas:
- créditos tributários via judicial – ao impor um teto para compensar créditos tributários obtidos por empresas por meio de decisão judicial, a estimativa é obter R$ 20 bilhões em 2024;
- reoneração da folha – com o aumento da tributação sobre a folha de pagamento das empresas e de parte das cidades a partir de 1º de abril, o governo calcula arrecadar R$ 6 bilhões neste ano;
- Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – por causa da pandemia, o Perse foi criado para aliviar prejuízos do setor, que ficou parado por causa de longos períodos em que era proibido fazer aglomerações: as empresas só liquidavam dívidas tributárias e previdenciárias “conforme a sua capacidade de pagamento”. Ou seja, ficava tudo a perder de vista. O gasto tributário estimado pelo Fisco para 2024 é de R$ 6 bilhões. O governo quer compensar a despesa projetada com a reoneração parcial da folha.
O mais provável, no entanto, é que a MP seja convertida em projeto de lei. É o caso do trecho que trata da reoneração da folha de pagamentos. Nesse caso, é improvável que a cobrança se dê ainda em 2024.
Já os outros 2 itens têm mais chances de prosperar ainda neste ano –não se sabe se por meio da MP 1.202, já baixada, ou também tudo via projeto de lei.
Desoneração
Da forma como o Congresso aprovou, a prorrogação da desoneração valeria a partir de 1º de janeiro de 2024. Há uma estimativa de que o impacto da prorrogação da desoneração seria de pelo menos R$ 18,4 bilhões em 2024.
Do valor total da renúncia fiscal, R$ 9,4 bilhões seriam para as empresas privadas de 17 setores. Outros R$ 9 bilhões seriam para os municípios com até 156.216 habitantes em razão da redução de alíquota previdenciária de 20% para 8% sobre o salário do funcionalismo.
A desoneração permite às empresas dos setores beneficiados pagar alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários. A medida abrange setores como calçados, call center, construção civil, comunicações, confecção e vestuário, entre outros.
Mudanças do governo
O governo definiu que a tributação sobre a folha voltará a incidir a partir de abril de 2023. Haverá uma “desoneração parcial” para o 1º salário mínimo. Aremuneração que ultrapassar essa faixa sofre a tributação normal (de até 20%) ao INSS (contribuição patronal).
A desoneração da folha de pagamento de empresas havia sido aprovada pelo Congresso neste ano de 2023. Valeria até 2027. Lula vetou a medida.
Em 14 de dezembro, o Congresso derrubou o veto por ampla margem. Na Câmara, foram 378 votos contra o Planalto e só 78 a favor. No Senado, 60 votos para derrubar o veto e 13 pró-Lula.
A decisão de Haddad de baixar uma medida provisória para derrubar a votação do Legislativo se deu na 5ª feira (28.dez). Foi a mesma data em que o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), promulgou a lei já com o veto de Lula anulado.
Reações
Haddad causou irritação em vários setores da economia –entre prefeitos e no comando do Congresso. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chegou a dizer que a MP causa “estranheza”. Congressistas também pediram a Pacheco para devolver a medida provisória.
Em 29 de dezembro, a CNM (Confederação Nacional dos Municípios) disse que irá pressionar a União a rever a revogação da redução de alíquota previdenciária para as pequenos e médias cidades.