O economista francês Gabriel Zucman, 37 anos, defende que empresas multinacionais paguem imposto mínimo de 15% sobre o lucro conforme acordo assinado em 2021 por 136 nações.
Se o país onde fica a sede da empresa tiver alíquota menor, os países onde as empresas atuam poderão cobrar a diferença. No Brasil, grandes empresas já têm tributação acima disso sobre os lucros.
Zucman também sugere que se chegue a um acordo global para implantar outra regra: imposto de 2% sobre o patrimônio para quem tem mais de US$ 1 bilhão. Seria cobrado no país onde as pessoas viveram mais tempo. “É justiça fiscal”, afirmou.
O economista é diretor do Observatório Fiscal da União Europeia e professor da École d’Économie de Paris (Escola de Economia de Paris). Falou do tema na reunião de ministros do G20 em São Paulo em 29 de fevereiro.
A seguir, trechos da entrevista:
- patrimônio e renda – “[Quem tem mais de US$ 1 bilhão] teria que pagar a cada ano em Imposto de Renda pelo menos 2% de seu patrimônio. Alguém que já pague muito imposto não teria muito a pagar”;
- elisão fiscal – “Para quem é muito rico, a noção de renda não é muito clara. É fácil manipular e declarar ao Fisco renda muito pequena ou mesmo renda zero”;
- arrecadação – “Um imposto mínimo coordenado do ponto de vista internacional de 2% sobre a fortuna dos bilionários resultaria em US$ 250 bilhões. Não há muitos bilionários. São 3.000 em escala global”;
- alíquota – “Uma proposta de 2% é bastante modesta. Não estamos falando de confisco. É algo muito longe da revolução comunista. É só uma medida de justiça fiscal mínima para tentar resolver o problema fundamental da regressividade dos sistemas fiscais contemporâneos”;
- resistência – “As pessoas que têm grandes fortunas detestam pagar impostos sobre o patrimônio. Isso é um bom sinal. Quer dizer que é realmente o imposto que funciona”;
- patamar mais baixo – “É preciso começar [pelos bilionários], mostrar que aprendemos com os erros do passado, que nós conseguimos tributar com eficiência os que têm a maior capacidade contributiva e que hoje pagam menos. Depois, poderemos abaixar o patamar [para outros níveis de patrimônio]”;
- imposto de 15% sobre multinacionais – “Não há necessidade de um consenso global. Basta que haja um certo número de países líderes que sejam uma massa crítica em termos do número de consumidores e que digam: se as empresas quiserem continuar a ter acesso ao nosso mercado, terão de pagar mais impostos”;
- repasse de imposto aos preços – “Em mercados nos quais há muita concorrência, em que as empresas não têm poder de mercado e não podem realmente definir preços, isso é menos provável. […] Os aspectos positivos dominam muito claramente os potenciais aspectos negativos em termos de pequenos aumentos de preços”;
- tributação com mudança de país – “Caso você tenha se tornado extremamente rico no Brasil, passando 50, 60 anos no país, e agora tenha escolhido se reposicionar em um local de baixa tributação, o Brasil deveria continuar a tributá-lo. Podemos discutir se 10 ou 15 anos. Mas não há nenhuma razão para parar de tributar imediatamente”;
- imposto e desenvolvimento – “[Países] mais ricos têm […] altas taxas de impostos obrigatórios, de cerca de 35% a 50% do PIB. Os mais pobres têm taxas baixas, de 5% a 10% do PIB. Se quisermos desenvolvimento, temos de investir massivamente na educação, em saúde e em infraestrutura. E não podemos fazer isso sem pagar impostos”;
- cooperação – “A OCDE [Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico] conseguiu desempenhar um papel positivo em termos de criação de novas formas de cooperação fiscal internacional. Desde 2018 está sendo criada uma troca automática de informações bancárias entre países e territórios como a Suíça, as Ilhas Cayman, que tradicionalmente tinham um sigilo bancário muito, muito rigoroso, concordaram em partilhar os seus dados bancários com outros países, incluindo o Brasil”;
- Trump – “Não devemos pensar que, se [Donald] Trump regressar ao poder [nos EUA], em novembro tudo vai parar. Teremos simplesmente de fazer um esforço para inventar novas formas de multilateralismo entre os países em que existe vontade política para avançar na luta contra as desigualdades e no sentido da justiça tributária”;
- G20 em São Paulo – “Eu presto homenagem à liderança do Brasil [no G20]. Fóruns da OCDE, do G20 etc., ignoraram completamente justiça fiscal e progressividade tributária. Pela 1ª vez, se discutiu esses assuntos com os ministros e Finanças do G20 em São Paulo e com outros ministros também que foram convidados”.