Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - Um severo aperto nas contas do governo levou o Ministério da Economia a suspender “praticamente todas” as despesas de custeio de ministérios previstas para dezembro, gerando riscos à prestação de serviços públicos no fechamento do ano e deixando a atual gestão na dependência de um acordo entre o governo eleito e parlamentares para dar novo drible na regra do teto e destravar gastos emergenciais ainda em 2022.
Mesmo após flexibilização da norma fiscal para bancar benefícios sociais neste ano, a ampliação de despesas obrigatórias pressionou as contas, o que levou a pasta a anunciar uma necessidade total de bloqueio de 15,4 bilhões de reais.
Após a trava nos gastos na última semana, o governo Jair Bolsonaro tem disponível para todas as despesas discricionárias de ministérios em dezembro --que incluem investimentos e também despesas administrativas como com contas de luz e água-- apenas 2,4 bilhões de reais, equivalente a 1,6% do total do ano.
“Despesas importantes que seriam realizadas neste ano ou no começo de 2023 não poderão mais ser empenhadas, e praticamente todas as despesas discricionárias que seriam pagas em dezembro estão suspensas”, informou o ministério em nota.
Com a escassez de recursos, a Polícia Federal chegou a suspender a emissão de passaportes, enquanto serviços de distribuição de água por caminhões pipa em regiões carentes também passaram por dificuldades --essas ações foram recompostas, segundo o governo.
O ministério não detalhou quais as áreas mais críticas no momento. Em valores nominais, os maiores bloqueios foram feitos nas áreas de Desenvolvimento Regional (3,9 bilhões de reais), Saúde (3,8 bilhões de reais) e Educação (2,4 bilhões de reais).
APOSENTADORIAS
As despesas obrigatórias também são um ponto de atenção, depois que a força tarefa do governo para reduzir a fila de espera do INSS levou os gastos a um nível maior do que o estimado anteriormente.
“O governo está com dificuldade de fechar os gastos da Previdência neste ano porque houve aumento das concessões”, disse à Reuters o consultor de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara Ricardo Volpe. “O governo terá que comprimir outros gastos ou buscar caminhos para poder gastar acima do teto.”
Em busca de uma solução para o impasse, a Casa Civil enviou ao Tribunal de Contas da União (TCU) uma consulta sobre a possibilidade de editar uma medida provisória liberando créditos extraordinários --que não são contabilizados no teto-- para garantir o pagamento dos benefícios previdenciários. A análise pelo TCU está prevista para quarta-feira.
A pasta da Economia afirmou que estão assegurados os pagamentos de todas as despesas obrigatórias, tais como aposentadorias, pensões e outros benefícios do INSS. Procurado, o Ministério do Trabalho e Previdência não respondeu de imediato.
A pasta ainda informou que espera fazer uma reavaliação de despesas até meados deste mês, o que poderia abrir margem para destravar gastos.
Além da despesa mais alta do INSS, também colaborou para a pressão nas contas a aprovação da Lei Paulo Gustavo, de incentivo ao setor cultural. A despesa prevista, de 3,9 bilhões de reais, foi obrigatoriamente reservada no Orçamento após decisão judicial, mesmo que seja baixa a chance de desembolso dos recursos ainda neste ano.
A solução do problema enfrentado pela gestão Bolsonaro, que entrou em seu último mês de mandato, pode vir da PEC apresentada pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para retirar despesas do teto em 2023.
Um dos dispositivos da PEC da Transição libera o uso de 6,5% do excesso de arrecadação do governo, a partir de 2023, em despesas sem contabilização na norma fiscal. O governo eleito, deputados e senadores agora negociam que a medida tenha validade já em 2022, o que liberaria 23 bilhões de reais, destravando as despesas bloqueadas de ministérios, além de recursos de emendas parlamentares.
“Eu acho que a solução vai ser antecipar (regra de) receita (extra) de 6,5% para 2022. Se liberar, o governo resolve todos os problemas”, disse nesta segunda-feira o líder do PT na Câmara dos Deputados, Reginaldo Lopes (MG), que é membro da transição de governo.
(Por Bernardo Caram)