Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - Em meio a uma disputa interna no governo sobre o déficit zero proposto pela equipe econômica para 2024, o ministro dos Transportes, Renan Filho, saiu em defesa do titular da Fazenda, Fernando Haddad, ao mesmo tempo em que afirmou que não acredita em resistência do Congresso caso seja proposta uma mudança da meta fiscal no início do ano que vem.
"O que garante sustentabilidade fiscal é limite para gasto. Meta não é limite para gasto. Você entende bem a diferença das palavras. Meta é o objetivo, e sempre é mais audaciosa do que o limite. O que o arcabouço fiscal faz é impor limite para gasto, e é o que o Brasil precisa", afirmou o ministro em entrevista à Reuters.
Apesar de afirmar que uma meta rígida pode engessar o governo no início do próximo ano, Renan Filho defendeu o ministro da Fazenda e disse que não há necessidade de mexer agora na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que deve ser votada na próxima semana com a meta de zerar o déficit em 2024.
"Não precisa mudar essa meta no final de ano. Porque para mudar a meta na LDO agora vai mudar muita coisa. Porque a LDO mexe em todas as metas, onde vai o dinheiro... Se você tiver interlocução com o Congresso você pode mudar em fevereiro, março, quando vir para onde vai a arrecadação", disse.
"Se o problema vai ser em março, muda a meta em março. Porque ele (Haddad) precisa também de um tempo para conciliar a reforma da casa com as possibilidades financeiras que ele tem", acrescentou.
Filho do senador Renan Calheiros (MDB-AL), ex-governador de Alagoas e também senador eleito, o ministro dos Transportes tem uma linhagem de negociadores no Congresso e acredita que o governo não teria dificuldades para mudar a meta de 2024 mais para frente, se for necessário.
"Eu acho que era melhor mudar a meta no que vem, desde que tenha condições política. Eu acho que o governo tem essa interlocução política", disse, defendendo que é possível conversar sobre eventual mudança com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que já defenderam o déficit zero.
A discussão sobre a meta de déficit zero apresentada pela equipe econômica para 2024 se transformou em uma disputa interna no governo. Haddad continua defendendo os parâmetros mais rígidos que foram enviados na LDO, junto com ministros como Alexandre Padilha, da Secretaria de Relações Institucionais. Um outro grupo, encabeçado pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, quer a mudança já na LDO para um déficit que não prejudique os investimentos do governo.
A discussão ganhou as ruas quando o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou a jornalistas, em um encontro no Planalto, que dificilmente manteria o déficit zero para não ter que cortar investimentos em 2024.
Desde então, segundo uma fonte palaciana, o presidente foi convencido por Haddad a esperar o resultado de medidas de melhoria de arrecadação e alterar a meta apenas se for necessário.
Renan Filho mostrou preocupação com um debate que considera desnecessário. Ele lembrou que o governo tem um limite de gastos claro, estabelecido pelo arcabouço fiscal, independentemente da meta de déficit zero, e credita ao arcabouço em si a estabilidade fiscal.
"Repito. A meta é um objetivo, o arcabouço é o limite. Essa conversa precisa ser organizada porque no final do dia o cidadão que não entende bem isso parece que o governo está errando na economia. Parece que o Haddad está errado. Parece que o Haddad está sozinho ou que o governo quer gastar demais. Tem que organizar esse discurso. Essa narrativa errática na economia acaba dando poder ao bolsonarismo. Sem lógica, mas eles reagem", apontou o ministro.
A regra geral do arcabouço fiscal estabelece que as despesas federais não poderão crescer mais do que 70% da alta das receitas, além de definir que os gastos crescerão anualmente entre 0,6% e 2,5% acima da inflação.
A norma prevê que, em caso de descumprimento da meta fiscal, que terá uma margem de tolerância, o crescimento dos gastos passará a ser limitado a 50% da alta da receita.
Renan Filho admitiu a existência de uma disputa entre a Fazenda e a Casa Civil, defende que disputas internas são normais, mas precisam de limites impostos pelo presidente.
"Algumas disputas são horríveis para o governo. Um outro ministro pode ganhar todas, mas ele jamais será o Haddad pra o Lula. Porque o sucesso do Lula é o do Haddad, é o da Economia. Por isso eu defendo o Haddad, o presidente defende o Haddad. Ele tem feito um trabalho muito representativo, de recuperação da credibilidade. É um cara muito direito, muito inteligente", afirma.
(Reportagem de Lisandra Paraguassu)