Por Fernando Cardoso e Luana Maria Benedito e Marcela Ayres
BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) - O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta quinta-feira que o governo enviará ao Congresso uma medida provisória estabelecendo a reoneração gradual da folha de pagamento dos 17 setores hoje isentos desse pagamento, mantendo uma desoneração parcial sobre valores equivalentes a um salário mínimo.
Haddad também anunciou que será fixada uma limitação anual das compensações tributárias para decisões judiciais determinando créditos acima de 10 milhões de reais, argumentando que o sistema atual reduz o poder de planejamento da Receita Federal.
As medidas, que visam assegurar um Orçamento mais equilibrado, compensando benefícios tributários que não estavam inicialmente previstos para 2024, incluíram ainda o fim gradual do Perse, programa de benefícios tributários criado durante a pandemia da Covid-19 para proteger setores como o de eventos, hotéis e restaurantes.
Haddad afirmou que todas as iniciativas anunciadas não melhoram o resultado primário projetado para 2024, mas só repõem perdas de arrecadação.
A iniciativa para a folha de salários vem depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter vetado a prorrogação da desoneração, medida que em seguida foi derrubada pelo Congresso, acarretando um impacto potencial de 27 bilhões de reais sobre as contas no próximo ano, segundo cálculos citados por Haddad. O ministro já havia prometido anunciar alternativas à desoneração, que diz ser inconstitucional.
"Estamos encaminhando para o Congresso Nacional uma reoneração gradual, que está sendo analisada setor a setor", disse Haddad em entrevista coletiva de imprensa em Brasília. "Não necessariamente volta para os 20% de cota patronal, pode ficar abaixo disso, e ficará abaixo disso em alguns casos".
Haddad disse que a desoneração do primeiro salário mínimo recebido pelos trabalhadores será um "piloto" de uma política que pode eventualmente ser estendida. Parte dos setores pagará uma alíquota de 10% sobre o primeiro salário mínimo e outros pagarão 15% --a alíquota cheia, válida para os valores acima desse limite, é de 20%.
"Entendemos que esse pode ser um caminho interessante para a formalização da força de trabalho e para a empregabilidade, sobretudo da população de mais baixa renda do país", defendeu Haddad, acrescentando que a proposta do governo também será benéfica para as empresas.
O ministro disse que suas propostas não são uma "afronta" ao Congresso após a derrubada do veto de Lula, mas sim uma tentativa de negociar uma solução que não passe por uma judicialização.
"Nós nunca nos indispusemos a negociar os termos de uma solução", afirmou.
Sobre a limitação da compensação tributária, Haddad afirmou que as empresas continuarão podendo receber as compensações, mas limitadas a um determinado percentual -- segundo ele, para que a Receita tenha condições de planejar o resultado primário.
O secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, disse que 30% é um parâmetro médio que pode ser adotado na limitação das compensações, que ainda será objeto de regulamentação à frente, e explicou que haverá prazos escalonados para utilização dos créditos, proporcionais a seu valor.
"A ideia é fazer um escalonamento, quanto maior o valor, maior o prazo de utilização, mas limitado ao prazo máximo de cinco anos. Ninguém vai ficar mais do que cinco anos para utilizar esse crédito".
Segundo Haddad, somente este ano houve uma perda de arrecadação de 60 bilhões de reais devido ao regime atual de compensações judiciais.
Na coletiva, Haddad também anunciou o fim gradual das isenções de tributos no âmbito do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos, o Perse, que concedeu isenções a vários segmentos a partir da pandemia da Covid-19. Haddad disse que o programa, prorrogado mesmo após o fim da pandemia, já deveria ter acabado.
Segundo o ministro, um pacote acordado anteriormente com o Congresso de 20 bilhões de reais em renúncia fiscal no âmbito do Perse serão compensados em dois anos, e não em cinco anos, como previsto originalmente.
IMPACTOS
Como aprovada, a proposta de desoneração da folha previa um impacto negativo de 15 bilhões de reais na arrecadação apenas como resultado da redução da alíquota de contribuição de municípios menores de 20% para 8%.
Com a nova medida provisória a ser enviada ao Congresso, o governo proporá a substituição do projeto de lei, retirando a parte referente aos municípios, que, segundo Haddad, será objeto de novas negociações no próximo ano.
O impacto restante da proposta original de desoneração, de 12 bilhões de reais, cairia com a proposta de reoneração gradual da folha para 6 bilhões de reais --montante que por sua vez seria compensado pelo enxugamento do Perse e pela limitação das compensações tributárias.
(Com reportagem de Fernando Cardoso e Luana Maria Benedito, em São Paulo, e Marcela Ayres, em Brasília)