Por Mark John e Libby George
LONDRES (Reuters) - Enquanto o nervosismo das eleições norte-americanas pairava sobre a reunião de chefes de finanças globais em Washington, um sorridente Vladimir Putin estava na cidade russa de Kazan dando as boas-vindas aos líderes de países que, juntos, representam quase metade da população mundial.
O grupo Brics de países emergentes pode estar longe de rivalizar com o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou desafiar o domínio do dólar norte-americano. Mas a primeira reunião de cúpula com seus novos membros mostrou sinais claros de seu peso crescente.
O comunicado final foi longo em palavras e curto em detalhes sobre a criação de novos mecanismos de pagamentos e comércio que poderiam contornar as estruturas dominadas pelo Ocidente -- incluindo, notadamente no caso da Rússia, as sanções impostas após a invasão da Ucrânia.
Mas a cúpula obteve uma série de vitórias diplomáticas: as presenças do secretário-geral da ONU, António Guterres, e de Tayyip Erdogan, presidente da Turquia, um países-membro da Otan que manifestou interesse em se juntar ao Brics. A Índia e a China escolheram a cúpula para traçar o perfil de novos esforços para cultivar laços.
Para Putin, o simples fato de tantos líderes terem viajado para a Rússia para as conversas foi útil para combater a narrativa de que seu país está isolado da economia global.
"As potências ocidentais não estão entendendo a importância disso", disse Alicia Garcia-Herrero, pesquisadora sênior do think tank econômico Bruegel. "Tudo isso está sinalizando que o Ocidente está perdendo poder."
Kazan pode não vir a ocupar o mesmo lugar na história que Bretton Woods, a cidade no Estado norte-americano de New Hampshire onde, há 80 anos, os vencedores da Segunda Guerra Mundial criaram uma ordem monetária que dominaria a economia global e consolidaria a supremacia do dólar.
No entanto, as conversas desta semana enfatizaram a insatisfação com um sistema que é visto como um serviço insuficiente para a maior parte do mundo, com um colapso nas transferências de capital para as economias em desenvolvimento na última década e com os países emergentes sub-representados nas tomadas de decisões do FMI.
"Veja quantas pessoas estão se esforçando para se candidatar ao Brics", disse Mo Ibrahim, empresário sudanês-britânico que dirige uma fundação que acompanha a governança na África. Putin disse que mais de 30 países se candidataram.
"As pessoas veem instituições que não são realmente representativas ou democráticas -- infraestrutura criada em 1945, mais ou menos, após a guerra mundial, e nada muda", acrescentou Ibrahim.
O histórico do clube tem sido misto desde que Brasil, Rússia, Índia e China o lançaram em 2006. Por um lado, sua criação ainda não alterou a trajetória anterior de crescimento per capita das quatro nações fundadoras, calculou Mario Holzner, do Instituto de Estudos Econômicos Internacionais de Viena.
Além disso, os 5 bilhões de dólares em empréstimos que o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) do Brics espera fazer este ano não são nada perto dos 72,8 bilhões de dólares distribuídos pelo Banco Mundial em créditos, empréstimos e doações. Outros projetos permanecem em sua fase inicial.
"Talvez eles consigam estabelecer algum tipo de sistema de transferência de dinheiro que, pelo menos em um nível baixo, funcione, mas isso provavelmente não será um divisor de águas", disse Holzner.
AUMENTANDO AS APOSTAS
Muitos comentaristas também observam que, à medida que o grupo cresce, os desequilíbrios de tamanho e influência entre os países membros e, às vezes, as agendas nacionais conflitantes dificultarão a formação de consenso em iniciativas conjuntas.
No entanto, aqueles que estão na fila para entrar no grupo o veem como um fórum comercial de fato, já responsável por um quinto do comércio global.
"Há uma enorme vantagem em conectar esses corredores", disse o ministro das Finanças do Paquistão, Muhammad Aurangzeb, nos bastidores da reunião do FMI em Washington. "Então, de fato, estamos ansiosos para nos tornarmos membros do Brics."
(Reportagem adicional de Karin Strohecker, em Washington, e Laura Chen, em Pequim)