Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) -O presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou sua fala inicial na primeira reunião ministerial para prometer que é possível crescimento econômico com responsabilidade e para mandar um recado conciliador ao Legislativo em forma de cobrança a seus ministros: o governo depende do Congresso e deputados e senadores precisam ser bem tratados.
"É preciso que a gente saiba que o Congresso nos ajuda. Nós não mandamos no Congresso, nós dependemos do Congresso", disse Lula no discurso em que abriu a reunião. "Por isso cada ministro tem que ter a grandeza de atender bem cada deputado, cada deputada, cada senador, cada senadora."
Com os líderes do governo no Congresso presentes na reunião, Lula, que é reconhecido por ser um bom negociador, ressaltou que falará com todas as forças presentes no Legislativo e quantas vezes forem necessárias.
“Quero dizer aos líderes (do governo) que vocês vão ter um presidente disposto a fazer tantas quantas conversas forem necessárias com as lideranças, com os partidos, com o presidente (do Senado) Rodrigo Pacheco (PSD-MG), com o presidente Arthur Lira (PP-AL). Não tem veto ideológico, não tem assunto proibido em se tratando do bem do país”, garantiu.
Mesmo tendo atraído o MDB, o União Brasil e o PSD para sua base, cada um com três ministérios, Lula não tem maioria hoje para, por exemplo, aprovar uma proposta de emenda constitucional na Câmara.
Ao todo, as siglas aliadas entregariam 282 votos de deputados, mas dificilmente o governo teria, de fato, tudo isso. Especialmente PSD e União Brasil ainda tem parlamentares mais ligados ao bolsonarismo, o que irá levar o governo --e, especialmente, Lula-- a ter que usar seu poder de convencimento nas votações mais importantes. Além disso, o presidente tirou políticos experientes, especialmente no Senado, para compor seu ministério.
“Cada um de vocês ministros têm a obrigação de manter a relação mais harmônica com o Congresso Nacional”, insistiu. "Quando a gente vai conversar, a gente não está propondo um casamento, a gente está propondo aprovar uma matéria ou fazer uma aliança momentânea em torno de algo importante para o povo brasileiro."
O presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), elogiou as declarações de Lula. "O presidente Lula demonstra, com essa fala, experiência e capacidade de aglutinação. De fato, o Congresso merece respeito porque tem compromisso com as soluções para o país", disse Pacheco no Twitter.
"O presidente e seus ministros poderão contar com isso. Vamos trabalhar muito para que a independência entre os Poderes seja a mais harmônica possível", acrescentou.
CRESCIMENTO COM RESPONSABILIDADE
Após várias declarações contra o teto de gastos, que colocam em dúvida a preocupação fiscal do novo governo, Lula fez questão de dizer que é possível a economia crescer com responsabilidade, mas sem abrir mão da distribuição da riqueza do país.
"É possível a gente fazer a economia voltar a crescer, é possível a gente voltar a crescer com muita responsabilidade, é possível a gente voltar a crescer com distribuição de renda e de riqueza e é possível a gente gerar emprego", destacou.
A fala, sem maiores detalhamentos, vem após uma estreia do governo na qual tanto o principal índice da bolsa brasileira como o real reagiram negativamente a episódios de contradições no primeiro escalão nos primeiros dias da semana. Os dois últimos dias foram de recuperação, assim como esta sexta, bastante beneficiada pelo cenário externo. [nL1N33R1D2]
Lula desautorizou seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na questão da desoneração dos combustíveis, e assistiu a Carlos Lupi, da Previdência, anunciar um inexistente plano de rever a reforma do sistema de aposentadorias, o que foi descartado logo depois.
Por conta disso, a reunião, segundo ouviu a Reuters de uma fonte do gabinete, tinha como um dos objetivos Lula dizer ao novo grupo de 37 nomes do gabinete que anúncios tem de ser avalizado por ele antes de virem a público.
"Não somos um governo de pensamento único, de filosofia única, somos um governo e pessoas diferentes", disse também Lula, num sinal de que reconhece que novos ruídos poderão surgir nas próximas semanas e em afago aos integrantes mais ao centro da coalizão, como o vice e ministro Geraldo Alckmin (Indústria e Comércio) e Simone Tebet (Planejamento).
Após a reunião, em entrevista coletiva, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse que um técnico novo quer uniformizar a equipe "com aquilo que está pensando de estratégia, de ritmo".
"É isso que Lula fez, colocar seus convocados juntos", disse. "Ele quer um ritmo muito acelerado de entregas."
CONSEQUÊNCIA PARA IRREGULARIDADES
O presidente, que tomou posse no domingo prometendo transformar o combate das desigualdades numa marca do governo, ressaltou mais uma vez o papel do Estado, inclusive para reduzir a violência entre os mais pobres.
“Parte da violência que existe nesse país não existe por falta de polícia, Flávio Dino, ela existe pela ausência do Estado no cumprimento das suas obrigações”, disse se dirigindo ao ministro da Justiça e Segurança Pública.
“Em vez de culpar o povo pobre da periferia, a gente tem que culpar a ausência do Estado e vamos fazer um esforço para estar presente onde o povo precisa de nós. Esse é um compromisso de que eu não arredarei o pé”, prometeu.
Lula fez ainda um alerta a seus auxiliares. Com as gestões petistas anteriores marcadas pelos escândalos do mensalão e do petrolão, Lula, que passou 580 dias na cadeia por uma condenação de corrupção depois anulada pela Justiça, disse que aqueles que cometerem irregularidades terão que deixar o governo.
"Quem fizer errado sabe que tem só um jeito: a pessoa será simplesmente, da forma mais educada possível, convidada a deixar o governo. E se cometer algo grave a pessoa terá que se colocar diante das investigações e da própria Justiça."
(Reportagem de Lisandra ParaguassuEdição de Alexandre Caverni e Flávia Marreiro)