Por Ricardo Brito e Maria Carolina Marcello e Rodrigo Viga Gaier
BRASÍLIA (Reuters) - A oposição diz que o governo não tem os votos necessários para aprovar a PEC dos Precatórios no Senado e articula estratégias para que ela seja barrada na Casa, enquanto a base trabalha para garantir o apoio de pelo menos 49 dos 81 senadores, o mínimo necessário para a aprovação da proposta.
Mesmo antes de a Proposta de Emenda à Constituição passar pela Câmara, nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro já havia admitido dificuldades para a matéria avançar no Senado. A PEC é tida como fundamental pelo governo porque, ao modificar a regra de pagamento dos precatórios e o prazo de correção do teto de gastos pelo IPCA, abre espaço fiscal de forma a custear o Auxílio Brasil nos moldes que deseja o presidente.
Contudo, senadores de PSDB, PT, Rede e até PSD --partido do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco-- discordam da proposta do governo como a única capaz de viabilizar o programa assistencial e já discutem alternativas para viabilizá-lo.
Com apoio de vários parlamentares, o senador tucano José Aníbal (SP) apresentou outra PEC que prevê 50 bilhões de reais para o benefício e outros 26 bilhões para que o governo possa honrar eventuais rombos orçamentários. Ele já trabalha nos bastidores para que sua proposta --ou alguma semelhante-- prevaleça em relação à que passou na Câmara.
"(Essa PEC) é imprestável, rompe o teto, dá calote nos precatórios e cria espaço no Orçamento para farra fiscal de deputados e senadores", criticou.
"Vamos trabalhar intensamente contra... Se ela passar, será um descrédito ainda maior para o Brasil", reforçou o tucano, para quem o governo não terá facilidade alguma no Senado.
Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), de oposição, a base governista não tem votos, no momento, para aprovar a PEC no Senado. Ele estima que são 35 os parlamentares contrários à proposta na Casa, o que impediria o governo de alcançar o mínimo 49 votos --por se tratar de uma PEC, a proposta precisa dos votos de pelo menos três quintos dos senadores em dois turnos de votação.
"Não pensem que farão um passeio no Senado como na Câmara", disse ele. “Acho que, no mínimo, a PEC terá modificações e hoje não tem voto pra passar", avaliou.
O senador Angelo Coronel (PSD-BA), que atua de forma independente, admite que não há consenso no Senado com a PEC que passou na Câmara. Segundo ele, haveria consenso para permitir às prefeituras parcelarem dívidas com INSS em 240 meses e recursos para custear o novo Bolsa Família. Contudo, há problemas em relação ao teto dos gastos e dos precatórios.
"Há itens que são amplamente favoráveis e outros em que há rejeição. Vamos aguardar o projeto passar pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e iniciarmos as discussões no plenário", disse Coronel.
Corrida
Para evitar a derrota, a base governista já tenta demover resistências ao texto. Designado relator da PEC na CCJ, o líder do governo no Senado, Fenando Bezerra (MDB-PE), vai se reunir na terça-feira com Aníbal e outros senadores para discutir a proposta e evitar mudanças. Se elas forem efetivadas no Senado, a PEC teria de voltar para análise da Câmara.
O governo corre para aprovar a proposta e viabilizar o pagamento o quanto antes do Auxílio Brasil. A previsão é que a PEC seja votada na CCJ no dia 24 e em seguida siga para o plenário do Senado.
Apesar do cenário ainda incerto neste momento, uma fonte do governo disse à Reuters estar confiante na aprovação da PEC. O raciocínio dessa fonte, que falou sob a condição de anonimato, é pura matemática. A fonte avalia que a chave para a aprovação da proposta no Senado é a bancada do MDB, a maior da Casa, e que o governo fez "besteira" em não fechar um acordo com esse grupo.
A fonte estima que o Executivo precisa garantir "quatro ou cinco" votos além dos que já tem e defendeu a liberação de emendas parlamentares para os senadores para viabilizar a votação.
"Hoje o Senado é um travador, o Senado está boicotando o governo", disse a fonte.
A tramitação da PEC no Senado, no entanto, ocorre em meio ao impasse do governo e Legislativo com o Judiciário, após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter suspendido o pagamento das emendas de relator, instrumento de distribuição de recursos que tem sido chamado de "orçamento secreto", diante da dificuldade de rastrear os beneficiários dos repasses.
Lideranças de oposição acusaram o governo de se valer do empenho --compromisso de pagar-- dessas emendas de relator para garantir votos, inclusive entre os próprios oposicionistas, para aprovar a PEC na Câmara dos Deputados.