Por Catarina Demony
LISBOA (Reuters) - O Parlamento de Portugal rejeitou nesta quarta-feira uma proposta da extrema-direita para acusar o presidente do país de traição por causa de seu apoio a reparações pela escravidão transatlântica e pelo colonialismo.
No mês passado, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa disse que era necessário abordar os erros do passado, provocando um debate nacional e fortes críticas dos partidos de direita, particularmente do Chega, de extrema-direita.
Rebelo de Sousa sugeriu o cancelamento da dívida de ex-colônias e a concessão de financiamento.
Após os comentários, o governo, que tem poderes executivos, disse que não iniciaria nenhum processo de reparação e o Chega - terceiro maior partido de Portugal - sugeriu um processo criminal contra o presidente por traição.
"Os partidos são livres para propor o que quiserem", disse Rebelo de Sousa, acrescentando que isso "faz parte da democracia".
Durante mais de quatro séculos, pelo menos 12,5 milhões de africanos foram sequestrados, transportados à força e vendidos como escravos.
Portugal traficou quase 6 milhões de africanos, mais do que qualquer outra nação europeia, mas pouco fez para enfrentar seu passado.
Em vez disso, a era colonial, durante a qual países como Angola, Moçambique e Brasil foram submetidos ao domínio português, é frequentemente vista como uma fonte de orgulho.
"As declarações do presidente representam uma profunda traição à nossa história", disse o líder do Chega, André Ventura, ao Parlamento em um debate convocado para discutir a questão.
Todos os partidos, inclusive o governista Social Democrata (PSD), disseram que não apoiariam a proposta do Chega. Sem esse apoio, a ação não pode avançar.
A parlamentar do Bloco de Esquerda Joana Mortágua afirmou que os negros ainda sofrem os legados da escravidão transatlântica e do colonialismo, incluindo o racismo. "Não estamos falando apenas do passado", disse ela.
A parlamentar do PSD Regina Bastos argumentou que o passado deve ser deixado para trás e que a prioridade deve ser dada ao que pode ser feito agora. Bastos e outros parlamentares acusaram Ventura de oportunismo político.
O ministro das Relações Exteriores, Paulo Rangel, reiterou a posição do governo, mas disse que haveria "desculpas" quando apropriado.
A ideia de fazer reparações pela escravidão transatlântica e pelo colonialismo tem uma longa história e permanece profundamente contestada, mas vem ganhando força em todo o mundo.