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“Temos que ter mais boa vontade com o governo”, diz presidente do BC

Publicado 14.02.2023, 16:04
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O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse hoje (14), em São Paulo, que o mercado financeiro precisa ter “um pouco mais de boa vontade” com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para ele, com uma priorização de gastos, é possível fazer uma política de combate aos problemas sociais aliada a uma política fiscal responsável.

“Dá pra fazer [uma política] fiscal responsável com uma parte social. O Brasil já tinha problemas sociais, a pandemia agravou muito, gerou muita desigualdade. Acho que dá pra casar as duas coisas. Tem que ter uma priorização de gastos, conversei com a ministra Simone [Tebet, do Planejamento] e ela falou muito sobre isso, sobre melhorar a qualidade de gastos com uma avaliação de programas existentes”, disse durante evento com investidores promovido pelo banco BTG Pactual (BVMF:BPAC11), em São Paulo.

Programas sociais

Ainda durante o governo de transição, o mercado financeiro mostrou “nervosismo” diante da intenção do governo Lula de aumentar os gastos com programas sociais, o que poderia prejudicar ainda mais a estabilidade fiscal do país, já prejudicada com os gastos do governo com a pandemia de covid-19.

Campos Neto avaliou positivamente o pacote de medidas já apresentadas pelo governo e tem boas expectativas em relação ao novo arcabouço fiscal que será apresentado pelo Ministério da Fazenda, em substituição ao teto de gastos, que limita as despesas do governo à inflação do ano anterior.

“O investidor é muito apressado, muito afoito. A gente tem que ter um pouco mais de boa vontade com o governo, 45 dias é pouco tempo. Acho que tem tido uma boa vontade enorme do ministro Haddad de falar: ‘temos aqui um princípio de seguir um plano fiscal com disciplina, tem um arcabouço que está sendo trabalhado, já foram elaborados alguns objetivos”, declarou Campos Neto.

Em abril, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deve enviar ao Legislativo proposta de lei complementar que estabelece um novo marco fiscal para o país. O governo acredita que isso ajudará a criar um ambiente de atração de investimentos, da mesma forma que o debate da reforma tributária e outros esforços do governo em equilibrar as contas públicas.

O presidente do BC avalia que a recuperação da economia no pós-pandemia deve ser inclusiva e sustentável e que a eleição de Lula para a Presidência da República tirou dois impeditivos para investimentos globais no país, que era a agenda ambiental, deteriorada no exterior no governo de Jair Bolsonaro, e o questionamento institucional das eleições.

“Levantei muito essa bandeira em 2019 [sobre a questão ambiental], que era um tema que definiria se o dinheiro vai voltar ou não. Depois o ângulo institucional teve uma percepção e incerteza em relação a isso. Mas tem a boa vontade, o Brasil fez várias reformas que, no efeito cumulativo, vão trazer capital e acho que precisamos entender que o papel do mercado é muito importante”, disse.

Juros altos e autonomia
Na semana passada, o presidente Lula voltou a criticar o nível da taxa Selic, juros básicos da economia, definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. Na sua última reunião, o Copom manteve a taxa em 13,75% ao ano, o maior nível desde janeiro de 2017, quando também estava nesse patamar.

Para Campos Neto, é justo e legítimo o questionamento sobre juros altos e “é importante ter alguém que faça esse papel no governo sempre, faz parte do jogo do equilíbrio natural”. Ele entende que é trabalho do Banco Central esclarecer e melhorar a comunicação sobre a política monetária e que isso poderia ser feito com mais frequência e de forma mais didática.

Pensar em uma política monetária e uma política fiscal de longo prazo é importante para ter um crescimento econômico sustentável, explicou o presidente do BC.

“Acho que o governo está na direção certa, tem tido um debate bom, a gente precisa ter boa vontade, falar de juros e ter a crítica [isso] é natural. Quanto mais fortes são as instituições, mais esse debate pode ser intenso sem afetar preços de mercado e expectativas porque as pessoas entendem que esse é um debate natural”, argumentou, defendendo a autonomia do Banco Central.

Segundo ele, o BC quer ser colaborativo, entendendo que é uma instituição de estado, mas que serve como auxiliar em vários tipos de políticas, inclusive prestando opiniões técnicas.

Meta de inflação

A taxa básica de juros, a Selic, é o principal instrumento utilizado pelo BC para alcançar a meta de inflação. Na ata da última reunião, o Copom apresentou projeções de inflação de 5,6% para 2023 e 3,4% para 2024 e indicou piora das expectativas.

A previsão para 2023 está acima do teto da meta que deve ser perseguida pelo BC. Definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), a meta é de 3,25% para este ano, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Ou seja, o limite inferior é de 1,75% e o superior de 4,75%. Já a projeção para a inflação de 2024 está acima do centro da meta prevista - 3% -, mas ainda dentro dos intervalos de tolerância de 1,5 ponto percentual.

Uma das saídas que estão sendo discutidas para colocar a inflação nos rumos é a elevação da meta pelo CMN. O colegiado é composto pelo ministro da Fazenda, pela ministra do Planejamento e pelo presidente do Banco Central. A próxima reunião do grupo é nesta quinta-feira (16).

Para Campos Neto, o sistema de metas brasileiro funciona bem, mas como o BC tem apenas um voto em três, na prática quem determina a meta é o governo. Ele reforça, entretanto, que “qualquer coisa que vá no sentido de mudar a regra do jogo não é bom”.

“Se você não está batendo a meta e simplesmente aumenta, o que vai acontecer naturalmente é que os agentes [de mercado] vão precificar a inflação futura na nova meta, mas vão colocar um prêmio de risco maior. Não só não ganha folga, como perde”, argumentou. “Aperfeiçoamentos no sistema de metas são bem-vindos e vão gerar melhorias operacionais e melhorias de eficiência. O BC pode até propor, mas quem tem que decidir é o governo”, disse.

O presidente do BC acrescentou que a meta de inflação não é instrumento de política monetária, mas sim os juros. “É importante respeitar as instituições e jogar as regras do jogo. A regra do jogo é clara, quem determina a meta não é o BC, o BC segue a meta e tem um conjunto de instrumentos disponíveis e tem autonomia operacional dentro desses instrumentos para seguir a meta”, finalizou.

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