Pequim/Taipé, 29 jun (EFE).- China e Taiwan viraram hoje a página
de 60 anos de enfrentamentos, batalhas diplomáticas e hostilidade
mútuas com a assinatura de um acordo de livre-comércio que será um
divisor de águas na relação entre o regime comunista e a "ilha
rebelde".
O acordo, que para não ferir suscetibilidades no setor
independentista taiuanês foi denominado Acordo Marco de Cooperação
Econômica (AMCE), foi hoje rubricado na localidade central chinesa
de Chongqing.
Cidade de grande importância histórica para comunistas e
nacionalistas do Kuomintang, que se reuniram ali para negociar em
1945, quando eram liderados por Mao Tsé-tung e Chiang Kai-shek,
embora nessa ocasião o fracasso do diálogo tenha levado ao início da
guerra civil (1945-49) que acabou com a cisão de Taiwan.
A assinatura de hoje e os dois anos de negociações prévias não
foram realizadas pelos Governos dos dois países - que não aceitam
relações de Estado a Estado - mas por duas ONG s que representam um
diante do outro: a chinesa associação para as relações através do
estreito (ARATS) e a taiuanesa Fundação para os Intercâmbios do
Estreito (SEF).
O acordo, considerado por ambas as partes o mais importante que
China e Taiwan assinam em seis décadas, reduzirá tarifas de 539
artigos taiuaneses no mercado chinês (uma economia de US$ 13,8
bilhões ao Taiwan) e a 239 importadas da China à ilha (um lucro de
US$ 2,860 bilhões para os chineses).
A indústria petroquímica, a de máquinas, têxtil, os serviços não
financeiros (auditorias, hospitais, manutenção de aviões) são alguns
dos setores que segundo os analistas serão beneficiados pelo acordo,
que segundo a China é só o princípio de uma maior abertura econômica
entre ambas as partes.
Também inclui um documento para a defesa mútua da propriedade
intelectual, que beneficiará a rica indústria do entretenimento
taiuanesa.
A assinatura marca o fim de dois anos de negociações entre ARATS
e SEF, coincidindo com o retorno ao poder em Taiwan do Partido
Nacionalista Kuomintang (KMT).
Essas negociações estiveram paralisadas entre 1997 e 2008,
especialmente durante o Governo na ilha do independentista Chen
Shui-bian (atualmente na prisão por corrupção).
Ambas as partes destacaram o histórico do acordo, que segundo
afirmou hoje o presidente taiuanês, Ma Ying-jeou, em Taipé,
"fomentará a internacionalização da ilha e evitará sua
marginalização comercial".
Os independentistas taiuaneses, agora na oposição, receiam o
tratado, ao que consideram um "cavalo de Tróia" do regime comunista
para anexar de novamente a ilha.
O acordo "coloca em perigo a democracia e o estilo de vida
atual", assegurou hoje a presidente do independentista Partido
Democrata Progressista (PDP), Tsai Ing-wen, quem não descartou
anular o tratado se seu partido retorna ao poder em 2012.
Mas o Governo nacionalista de Taiwan defende o acordo como única
saída viável diante do risco de isolamento regional que corre a
economia ilhoa, mais afetada pela crise global que o gigante
asiático.
Os empresários taiuaneses, que defendem em sua maioria o acordo,
estavam temerosos sobre os efeitos negativos do Tratado de
Livre-Comércio entre China e a Associação de Nações do Sudeste
Asiático (Asean), em vigor desde o início de 2010.
Há outros setores da economia taiuanesa que também veem com
apreensão a aliança, entre estes as indústrias tradicionais menos
competitivas e os agricultores (apesar do acordo por enquanto, por
deferência a estes, não inclui redução de taxas aos produtos
agrícolas).
A partir de um ponto de vista internacional, conforme os
analistas, a assinatura do AMCE consolida a paz no Estreito de
Formosa, abre para Taiwan a possibilidade de assinar acordos
similares com outros países, e provavelmente consolidará a muito
competitiva indústria tecnológica chinês-taiuanesa que fará tremer
grandes concorrentes nos EUA, Japão e na UE.
A cidade onde foi assinado o acordo, Chongqing (próxima à Presa
das Três Gargantas) foi durante a invasão japonesa a capital
provisória da República da China que então governava o agora
taiuanês KMT, por isso que a escolha desse lugar é interpretada como
uma concessão simbólica dos comunistas chineses. EFE