Por Tom Heneghan e John Irish
PARIS/BOBIGNY, França (Reuters) - O Charlie Hebdo vai publicar uma primeira página com a caricatura do profeta Maomé segurando uma placa dizendo "Je suis Charlie" na sua primeira edição depois do ataque de militantes islâmicos contra o jornal semanal.
Com a demanda aumentando pela edição a ser lançada nesta quarta-feira, o jornal planeja imprimir três milhões de cópias, bem acima das suas costumeiras 60.000, depois de vendedores relatarem várias encomendas.
Versões digitais serão publicadas em inglês, espanhol e árabe, enquanto edições impressas em italiano e turco também vão aparecer.
A França mobilizou milhares de policiais e soldados extras para garantir a segurança, depois da morte de 17 pessoas em três dias de violência, que começou com o ataque a tiros de dois extremistas na redação do Charlie Hebdo, uma vingança pelo jornal ter publicado imagens satíricas do profeta Maomé no passado.
Numa sessão parlamentar em homenagem às vítimas, o primeiro-ministro Manuel Valls disse que França estava "em guerra contra o terrorismo, o jihadismo e o islamismo radical", mas não contra a fé muçulmana, a segunda maior do país, que "tem o seu lugar na França".
Depois do seu discurso, parlamentares começaram a cantar de forma espontânea a Marselhesa, o hino nacional francês.
A primeira página da edição do Charlie Hebdo de 14 de janeiro mostra um Maomé choroso com a placa "Je suis Charlie" e a manchete "Tout est pardonné" (Tudo está perdoado).
"Eu escrevi 'tudo é perdoado' e chorei", disse Renald Luzier, autor do desenho, à imprensa na sede temporária do jornal, localizada no diário de esquerda Libération.
"Esta é a nossa primeira página. Não é aquela que os terroristas queriam que desenhássemos", disse. "Não estou nem um pouco preocupado. Eu confio na inteligência das pessoas, a inteligência do humor."
DIREITO DE BLASFEMAR
A nova edição do Charlie Hebdo, conhecido pelos ataques satíricos ao Islã e outras religiões, terá outros cartuns com Maomé e também fará graça com políticos e outras religiões, disse o advogado do jornal.
"Não vamos recuar, caso contrário nada disso terá significado", declarou Richard Malka a uma rádio francesa. "Se você carrega o cartaz 'Eu sou Charlie', isso significa que você tem o direito de blasfemar, de criticar a minha religião."
Não houve reação oficial do governo sobre a nova edição.
O grande mufti do Egito alertou o jornal contra a publicação de uma nova caricatura de Maomé, dizendo que era um ato racista que iria estimular o ódio e desapontar muçulmanos ao redor do mundo.
Líderes muçulmanos franceses pediram que suas comunidades permanecessem calmas e respeitassem o direito de liberdade de expressão.
"O que é desconfortável para nós é a representação do profeta", afirmou à Reuters Abdelbaki Attaf, em Bobigny, norte de Paris, no funeral de Ahmed Merabet, o policial morto quando tentava defender os cartunistas do Hebdo.
"Qualquer muçulmano responsável achará difícil aceitar isso. Mas não devemos banir isso", disse Attaf, administrador de uma mesquita em Gennevilliers, que era visitada ocasionalmente por Cherif Kouachi, um dos que atacou o Charlie Hebdo.
(Reportagem adicional de Mark John, Leigh Thomas, Dominique Vidalon e Emile Picy)