Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) concluíram na tarde desta quinta-feira o julgamento sobre o alcance do foro privilegiado e vão restringir a prerrogativa a crimes cometidos no exercício do mandato e por fatos relacionados à função que desempenham apenas para os 513 deputados federais e 81 senadores.
A decisão histórica --ocorrida após um julgamento que teve início um ano atrás, foi interrompido por dois pedidos de vista e durou cinco sessões-- abre brechas para manobras processuais protelatórias que podem gerar o efeito contrário ao pretendido, de garantir rapidez e efetividade na apreciação dos casos.
Também não se sabe, por ora, qual o efeito prático da mudança para implicados na operação Lava Jato, a maior investigação sobre corrupção do país e com dezenas de parlamentares envolvidos.
A posição vencedora, que contou com o voto de sete dos 11 ministros, partiu da posição do relator do caso, Luís Roberto Barroso. Todos os ministros se manifestaram para restringir a prerrogativa, mas com variações no alcance.
A partir de agora, o STF só vai apreciar casos de crimes comuns cometidos pelos 594 parlamentares federais no exercício do mandato e por fatos diretamente relacionados ao cargo. Todos os demais casos vão ser analisados pela Justiça de primeira instância.
Em entrevista após o encerramento do julgamento, Barroso afirmou que, a partir da decisão, "tudo vai ter que ser repensado" e, minimizando as dúvidas, admitiu que a aplicação do novo entendimento vai ser construída na avaliação dos casos.
"O regime de privilégio não é bom e que, portanto, o foro deve ser repensado de alto a baixo, eu acho que ela vai se espraiar pela sociedade e esta matéria vai voltar para cá. E aí, eu acho que nós já fixamos um princípio geral. Talvez tenha que fazer um recorte aqui ou ali, dependendo de cada situação: tem juiz, tem promotor, tem secretário de Estado, mas o princípio eu acho que é a ideia de republicanismo e de igualdade", afirmou.
No voto majoritário de Barroso, consta ainda uma espécie de corte para evitar que deputados ou senadores renunciem ao mandato e deixem de ser julgados pelo Supremo. Se o processo já estiver com sua instrução concluída e em fase de alegações finais, o julgamento será realizado pelo STF.
Votaram nesse sentido, além de Barroso, os ministros Edson Fachin, Luiz Fux. Rosa Weber, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e a presidente da corte, Cármen Lúcia.
REAJUSTE
No início da sessão desta quinta, o ministro Dias Toffoli apresentou um reajuste no seu voto apresentado na véspera. Ele se manifestou para ampliar a restrição do foro não só para parlamentares a partir da diplomação, mas também para todas autoridades que detém a prerrogativa pela Constituição depois de serem nomeados para os cargos. Nos dois casos, para quaisquer tipo de crime.
Na prática, essa mudança garantiria foro para crimes cometidos no exercício do cargo também para o presidente, o vice-presidente, ministros de Estado e ministros de tribunais superiores, por exemplo.
No reajuste do voto, o ministro também votou para pôr fim ao foro privilegiado para todas as demais autoridades que detém essa prerrogativa com base em constituições estaduais ou na Lei Orgânica do Distrito Federal. O argumento dele é que não se pode dar, por simetria, essa prerrogativa que não está expressamente na Constituição Federal.
Toffoli, com base em estudo do Senado Federal, afirmou que essa alteração poderia atingir 16 mil autoridades. Último a votar nesta quinta, Gilmar Mendes seguiu o voto do colega e continuou a fazer --como em todo o julgamento-- duras críticas à construção que se está fazendo para limitar a prerrogativa.
Numa clara demonstração de divisão do plenário do Supremo, a maioria dos demais ministros nem sequer teceram comentários para contestar os votos divergentes e as reclamações feitas sobre a decisão.
Houve ainda dois votos com um alcance mais restrito para o alcance do foro: o de Alexandre de Moraes, primeiro a abrir divergência ainda em novembro do ano passado, e o de Ricardo Lewandowski. Os dois votaram para restringir o foro apenas para os parlamentares para quaisquer crimes cometidos após a diplomação.