Ignacio Ortega.
Moscou, 16 jun (EFE).- As quatro grandes economias emergentes que
integram o Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) pediram hoje um
sistema de divisas mais diversificado, estável e previsível, mas não
descartaram de vez o dólar.
No comunicado final após a primeira cúpula formal na cidade russa
de Ecaterimburgo, nos Urais, o Bric defendeu um mecanismo mais
democrático e transparente de tomada de decisões nas organizações
financeiras multilaterais.
Participaram da cúpula o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os
governantes de Rússia, Dmitri Medvedev; e China, Hu Jintao; e o
primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh, cujos países concentram
40% da população mundial.
O grupo, que até agora só tinha realizado reuniões informais,
pede mais voz e voto para as economias emergentes e em
desenvolvimento nessas organizações, cujos dirigentes devem ser
escolhidos através de um sistema de eleição aberta e transparente
baseado nos méritos dos candidatos.
O documento ressalta que a reforma da arquitetura
econômico-financeira mundial deve se basear no fortalecimento da
gestão de riscos e nas práticas de supervisão financeira para evitar
abalos nas bolsas de valores.
Além disso, lembrou da necessidade de uma sólida base jurídica e
destacou a compatibilidade das atividades dos órgãos nacionais de
regulação com os trabalhos de organismos internacionais, como o
Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM).
Ao contrário do que se esperava, o comunicado final não faz
referência direta ao dólar, apesar de Lula ter reiteradamente
sugerido nos últimos meses desvincular a moeda americana nas trocas
comerciais bilaterais.
Medvedev apoiou hoje essa postura, ao afirmar, horas antes de se
reunir em particular com Lula, que o mundo precisava de novas
divisas de reserva para estabilizar o sistema financeiro global e
evitar novas crises.
"As atuais divisas de reserva, acima de tudo a principal delas, o
dólar, não cumpriram suas funções", disse.
O presidente russo admitiu que a aparição de novas divisas de
reserva "é um processo longo", rejeitou as mudanças superficiais e
defendeu "vias alternativas" para resolver a crise.
No entanto, a China, que tem a maior parte de suas reservas de
divisas em dólares, expressou pouca inclinação a aceitar a proposta
do Brasil e a de países como Cazaquistão, que sugeriu a criação de
moedas supranacionais para trocas regionais.
Por sua vez, o Bric pede no comunicado às economias desenvolvidas
para "cumprir suas obrigações de alocar 0,7% de sua receita em
conceito de ajuda aos países em desenvolvimento", conforme disseram
as agências russas.
Nesse sentido, pediu aos países mais ricos para "flexibilizar os
prazos de pagamento das dívidas, o acesso ao mercado e à tecnologia
por parte dos países em desenvolvimento".
Na esfera energética, pedem a "diversificação dos recursos
energéticos e de suas vias de transporte, a garantia da segurança
das rotas de passagem, a criação de nossas infraestruturas e a
canalização de novos investimentos ao setor".
O Bric também lançou outra declaração conjunta sobre segurança
produtiva na qual defenderam um sistema internacional de comércio de
produtos agrícolas "mais justo e racional" e "contra qualquer forma
de protecionismo".
Os países pediram aos organismos de promoção do desenvolvimento
que aloquem mais recursos ao campo a fim de estimular os habitantes
dos países pobres a se dedicarem às tarefas agrícolas.
Entre as propostas para equilibrar a balança no setor, o grupo
propôs promover a produção e o uso de biocombustíveis para tirar de
seu atraso secular as nações mais pobres.
O presidente russo assegurou na entrevista coletiva na qual
colocou fim à cúpula que os quatros líderes do Bric tinham chegado a
um acordo para "coordenar" no futuro as medidas contra a crise,
incluindo as estabelecidas nas cúpulas do Grupo dos Vinte (G20, que
reúne os países mais ricos e principais emergentes).
Ele ressaltou que os governantes tinham encarregado os ministros
de Finanças e presidentes dos bancos centrais de seus respectivos
países que "propusessem os parâmetros que terá a nova arquitetura
financeira mundial".
Medvedev qualificou de "histórica" a cúpula, na qual todos os
participantes pediram uma "ordem mundial mais justa" não só em
matéria econômica, mas também política.
Em Ecaterimburgo também foi decidido que a próxima cúpula do
grupo acontecerá em 2010 no Brasil.
Os países do Bric concentram em torno de 14,6% do Produto Interno
Bruto (PIB) do mundo, 12,8% do comércio e 25% da superfície
terrestre do planeta. EFE