Soledad Álvarez e Anett Ríos.
Havana, 2 dez (EFE).- Cuba se mantém socialista 20 anos após a queda da União Soviética (URSS), mas com Fidel Castro afastado do poder e imersa nas reformas de seu irmão Raúl para "atualizar" um modelo econômico em crise desde a década de 90.
A queda do bloco soviético revelou o tamanho da dependência que Cuba manteve com Moscou durante 30 anos e provocou uma traumática crise que marcou várias gerações de cubanos, apesar de a revolução castrista ter sobrevivido.
"Foi como se o sol deixasse de aparecer": assim descreveu Fidel Castro em 2000 sobre o impacto que o país sofreu.
Passadas duas décadas desde o "golpe demolidor" e com Raúl Castro como presidente após a doença que afastou seu irmão mais velho do poder em 2006, Cuba iniciou uma "atualização" de seu modelo para tentar superar a grave crise econômica, mas sem deixar o socialismo.
As reformas do general Castro representam uma pequena e controlada abertura à iniciativa privada e incluíram algumas medidas muito esperadas pela população, como a compra e venda de carros e casas entre particulares.
Apesar de não terem acontecido ajustes substanciais no plano político, Raúl Castro anunciou o limite de mandatos e a revisão dos métodos de trabalho no Partido Comunista e convocou o combate à burocracia e conservadorismo da organização.
Alguns consideram que o trauma causado pela queda soviética está começando a ser superado, que deixou consequências "muito profundas e dramáticas para todos: de altos funcionários do Governo ao povo".
Um dos partidários dessa opinião é o escritor cubano Leonardo Padura, cujo último romance, "O homem que amava os cães" sobre Leon Trotski, é uma feroz crítica ao stalinismo, que fez sucesso na última Feira do Livro de Havana.
Padura disse à Agência Efe que os 30 anos com a URSS não deixou nada em Cuba do ponto de vista cultural, "mas na economia e na política provocou muitos empecilhos que só agora começam a ser sacudidos".
Da antiga relação, o escritor acredita que ainda permanecem consequências, como um sistema "muito vertical" em que a participação "do povo" é formal e as decisões "sempre vêm de cima".
Cuba e a URSS estabeleceram relações diplomáticas em 1960 e um ano depois Fidel Castro proclamou a revolução socialista.
A partir de então, com altos e baixos, incluindo o tenso episódio da "crise dos mísseis" com os Estados Unidos em 1962, Havana e Moscou estabeleceram uma estreita aliança.
"As complexas circunstâncias que nosso país enfrentou (...) obrigaram a estreitar mais do que o previsto os vínculos econômicos com os soviéticos, diante do severo bloqueio dos EUA e da hostilidade do mundo capitalista", escreve o ex-ministro da Economia cubano José Luis Rodríguez em seu livro "Notas sobre economia cubana", publicado neste ano.
O colapso soviético provocou uma queda de 35% do PIB da ilha, que exportava para a URSS 63% de seu açúcar, 73% de níquel e 95% das frutas cítricas.
Cuba recebia da União Soviética 98% dos combustíveis e 63% dos alimentos, além de matérias-primas e outros bens.
Diante da perda de seu principal parceiro, Cuba criou o chamado "período especial", uma economia de guerra em tempos de paz que obrigou Fidel Castro a tomar medidas antes impensáveis, como a abertura ao turismo, o investimento estrangeiro e o dólar.
A década de 90 trouxe como consequências sociais a crise migratória dos "balseiros", um aprofundamento da corrupção cotidiana, a volta do fenômeno da prostituição e a chamada "perda de valores", entre outros.
No século XXI, Cuba encontrou outro importante aliado político e econômico na figura do presidente venezuelano, Hugo Chávez, fortaleceu suas relações com a China e viu ressurgir seus vínculos "estratégicos" com Moscou, agora em um cenário completamente diferente.
No entanto, restam na vida cotidiana de Cuba alguns vestígios da "herança" soviética: há quem ainda fale o idioma russo aprendido nesses anos, muitos dirigem carros Lada, usam eletrodomésticos da era soviética e lembram dos "bonequinhos russos", um desenho animado da época. EFE