Por José de Castro
SÃO PAULO (Reuters) - O dólar deu um salto nesta terça-feira e fechou na maior alta diária em quatro semanas, com o real liderando as perdas entre pares globais, conforme o mau humor externo ditou uma realização de lucros no mercado local de câmbio após o dólar flertar mais cedo com o piso psicológico de 5 reais.
A sessão foi particularmente influenciada pela tradicional "briga" entre comprados e vendidos em torno da taxa Ptax de fim de mês, que será definida na quarta-feira, movimento que costuma adicionar volatilidade aos negócios.
O dólar à vista subiu 1,57%, a 5,112 reais, maior valorização percentual diária desde 2 de agosto (1,93%). Voltou, assim, a operar acima de sua média móvel de 100 dias, abaixo da qual havia fechado na véspera pela primeira vez desde junho.
Na mínima do dia, a cotação marcou 5,008 reais --queda de 0,50% no dia e menor patamar desde meados de junho--, antes de recobrar forças e bater um pico de 5,122 reais, alta de 1,77%.
O real liderou o bonde das moedas em depreciação nesta terça-feira, numa lista encabeçada sobretudo por divisas correlacionadas às commodities e que nos últimos dias haviam tido performance superior ao mercado geral na esteira do rali das matérias-primas.
Mas nesta sessão o petróleo, por exemplo, desabou mais de 5% nos mercados internacionais, e o minério de ferro --um dos principais produtos da pauta de exportação brasileira-- caiu abaixo de 100 dólares a tonelada nas bolsas de Dalian e Cingapura, em meio a temores relacionados à Covid-19.
"Hoje é uma reavaliação do movimento exuberante que a gente (o real) teve nos últimos pregões. Faz sentido, acho que é salutar", disse Fábio Guarda, sócio-gestor da Galapagos Capital, segundo o qual a defesa por investidores de uma série de estruturas no mercado de opções relacionadas à Ptax de fim de mês impediu que o dólar rompesse o piso psicológico dos 5 reais.
O real é tido como uma moeda de "beta" alto --ou seja, tende a variar mais em comparação a uma referência--, o que em parte explica os movimentos mais dilatados da taxa de câmbio doméstica.
Mais recentemente, contudo, houve um descolamento da moeda brasileira em relação a seus rivais, o que fez surgir uma "boca de jacaré" quando em comparação ao índice MSCI para moedas emergentes, por exemplo.
Entre 17 de agosto e a véspera, enquanto o índice caiu 1,22%, a taxa de câmbio brasileira dólar/real valorizou 2,69%.
Para Guarda, apesar do movimento negativo desta terça, a conjuntura é favorável ao real. Ele cita perspectiva de mais demanda por produtos agrícolas exportados pelo Brasil, elevado diferencial de juros e sinais de inflação cadente no país.
"Em nem todo concurso de feiura o Brasil se destaca", disse o gestor, pontuando ainda que, a despeito de preocupações com mais despesas públicas a partir de 2023, o mercado entende que não haverá ruptura da política macrofiscal e que algum sinal de controle de gastos poderá ser emitido por qualquer um dos dois principais postulantes ao Palácio do Planalto que se sair vitorioso nas eleições.
A queda recente do dólar no Brasil levou estrategistas do Morgan Stanley (NYSE:MS) a considerar que a moeda norte-americana entrou em "bear market" (mercado em baixa) também numa abordagem estratégica semanal --um "bear market" diário já era considerado. Mas em termos mensais os profissionais seguem vendo "bull market" (mercado em alta) para o dólar.
Guarda, da Galapagos Capital, se diz comprador de real nos patamares atuais.
"O preço mais juro, dado o 'carry' (retorno)... seria perto de 4,5 reais. É muito factível a gente operar nesses patamares", disse, não descartando, inclusive, um "overshooting" do real --ou seja, uma valorização mais forte da moeda-- para a fronteira de 4 reais por dólar, 3,90 por dólar.