Javier Otazu
Porto Príncipe, 15 jan (EFE).- Os feridos no terremoto de
terça-feira passada no Haiti continuam morrendo nos hospitais por
falta de auxílio, de remédios e até de comida, embora não parem de
chegar voos com ajuda humanitária.
Segundo os responsáveis de vários hospitais, os centros médicos
onde se amontoam os feridos necessitam de coisas básicas como água
potável, eletricidade, remédios, soro, anestesia ou alimentos.
"Os que não morrem por ferimentos acabam morrendo de fome",
afirmou em declarações à Agência Efe o diretor do Hospital Geral,
Guy Laroche. "Aqui faz três dias que não chega nem um grama de ajuda
externa", acrescenta.
No entanto, os voos com ajuda humanitária estão chegando desde
ontem à noite com uma frequência de 15 minutos, conforme disse à
Agência Efe o diretor de Aviação Civil haitiano, Pierre Jean
Lemerque.
O funcionário acrescentou que muitos aviões têm que fazer até uma
hora de fila no céu antes de aterrissar devido ao congestionamento.
A falta de coordenação é evidente em Porto Príncipe, pois toda
essa ajuda humanitária não está chegando às ruas, onde os cidadãos
se amontoam com baldes diante de caminhões de bombeiros que lhes
servem água, enquanto ainda há corpos abandonados nas calçadas,
deixando o ar com um cheiro insuportável.
Com um Governo virtualmente suspenso e com vários de seus membros
desaparecidos, muitos funcionários de organizações humanitárias se
perguntam por que a ONU não assume o papel de coordenar todos os
esforços para trazer ajuda, comida e higiene à população.
Na Avenida Delmas, semeada por pessoas sem esperança após perder
tudo, a Agência Efe testemunhou como um guarda privado de segurança
começava a dar tiros de revólver para o ar para dispersar um grupo
de saqueadores mascarados que tentavam roubar alimentos de um
mercado.
No entanto, o ambiente é ainda de relativa tranquilidade nesta
cidade habitualmente caótica cujas ruínas, escombros e corpos
transformaram-na em uma ante-sala do inferno.
Os doentes se amontoam nos hospitais, deitados no quarto e
tapados com lençóis imundos, esperando remédios que se esgotaram
desde terça-feira e desejando um prato de comida que quase nunca
chega.
"Vi morrer vários feridos que tinham de ser amputados, entre
gritos estarrecedores, sem poder fazer nada por não haver sequer
material de amputação nem sangue para transfusões", conta Geneviève
Reynold Savain, proprietária da clínica privada CDTI no bairro de
Sacré Coeur.
Mas o caso mais trágico é o do Hospital Geral público, o maior da
capital, com 2 mil corpos em suas instalações e um número de feridos
"que já não posso nem mais contar", diz Laroche.
Apenas ontem à noite os caminhões municipais começaram a
transportar alguns corpos para depositá-los em valas comuns nos
vários cemitérios da cidade.
O Hospital Geral não tem água, energia elétrica, gasolina para as
ambulâncias, remédios específicos, sangue para transfusões nem
alimentos para os pacientes. "Os que têm famílias, comem; os demais,
agonizam de fome, além de dor", pois também não há anestesia, afirma
Laroche.
No Hospital da Paz, do bairro Delmas, um grupo médico cubano
assumiu as instalações diante da ausência de qualquer pessoa
responsável. A pediatra Gillian Jiménez leva três dias atendendo
crianças e adultos "sem soro, vacinas, antibióticos nem gesso e
bisturis para as fraturas".
"Olha, o Governo acabou. Se não chegar em breve a ajuda
humanitária, nos próximos dias as epidemias vão se multiplicar",
lembra Gillian.
A ONG Médicos Sem Fronteiras-França, como tantas outras, está
distribuindo ajuda como pode, diante da evidente falta de uma
autoridade que coordene. O chefe da organização, Michelle Chouinard,
resume a situação: "Fazemos o que podemos, trabalhamos sem parar e
nossa prioridade é ajudar aos feridos. Do resto não sei nada".
O terremoto de 7 graus na escala Richter aconteceu às 19h53 de
Brasília da terça-feira e teve epicentro a 15 quilômetros de Porto
Príncipe, a capital do país. A Cruz Vermelha do Haiti estima que o
número de mortos ficará entre 45 mil e 50 mil.
Na quarta-feira, o primeiro-ministro do país, Jean Max Bellerive,
havia falado de "centenas de milhares" de mortos.
O Exército brasileiro confirmou que pelo menos 14 militares do
país que participam da Minustah morreram em consequência do
terremoto.
A brasileira Zilda Arns, fundadora e coordenadora da Pastoral da
Criança, ligada à Igreja Católica, também morreu no tremor.
Diferente dos dados do Exército, o ministro da Defesa, Nelson
Jobim, aumentou hoje o número de mortos para 17 - considerando as
mortes de Luiz Carlos da Costa, funcionário da ONU, e de outro
brasileiro não-identificado -, segundo informações da "Agência
Brasil". EFE