Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, avaliou nesta quarta-feira que a alta recente da inflação é temporária, minimizando a duração de todas as frentes de pressão identificadas para o avanço de preços na economia, mas frisou estar "obviamente" monitorando o movimento.
Em entrevista ao canal do YouTube Me Poupe, ele reiterou que a inflação está sendo influenciada pela elevação do dólar frente ao real, mas ponderou que essa contaminação é pouco expressiva quando retirada a influência exercida sobre combustíveis.
Como outras justificativas para a aceleração da inflação ele citou o gasto pelos brasileiros de parte da poupança circunstancial com alimentação a domicílio e o aumento no preço de produtos consumidos por pessoas que tiveram forte recomposição de renda com o auxílio emergencial.
"Quando a gente olha esses três itens, a gente olha que a parte de poupança circunstancial tende a diminuir porque as pessoas estão voltando à mobilidade ... então na parte de alimentação a domicílio muita gente está diminuindo", disse.
"A parte de transferência de renda, os 600 reais vão virar 300 e eventualmente esse efeito vai passar e a gente entende que a parte do câmbio, como o grosso é combustível, ao longo do tempo tende a voltar também", disse.
Campos Neto reconheceu que há ainda um tema ligado à alta das commodities alimentícias, com outros países do mundo também vivenciando a mesma experiência, decorrente de uma demanda maior por alimentos na Ásia.
"A gente acha que isso tende a normalizar, as nossas safras previstas para março são maiores, então o preço de alimentos deve voltar. Então nós entendemos que a inflação é temporária. Estamos obviamente monitorando, o que foi dito, mas entendemos que a inflação é temporária", afirmou.
Em relação à escalada dos temores fiscais, Campos Neto voltou a fazer alertas sobre o que poderia acontecer caso o país rumasse para elevação desenfreada das despesas públicas, sem cuidado com a sustentabilidade das contas públicas.
"É importante as pessoas entenderem que tem um ponto de inflexão que a gente não consegue mais gastar. Senão era fácil, era só gastar para frente, a gente ia crescer para sempre. Obviamente não é assim", disse.
"Hoje a gente tem uma situação de endividamento alto e o que a gente entende, olhando a reação do mercado, dos agentes financeiros, é que existe uma luz vermelha acesa dizendo: 'Olha, você passou desse ponto de inflexão, precisa voltar para a disciplina fiscal'".
PIX
Questionado se o Pix, sistema de pagamentos instantâneos do BC que entrará em funcionamento pleno no dia 16, representará o fim das maquininhas de pagamento, ele afirmou ser cedo para dizer o que é o fim e o que é o começo, argumentando que o mercado de pagamentos é muito amplo e que ainda há grande bancarização a ser feita no país.
Campos Neto disse acreditar que o Pix vai se expandir rapidamente pelo fato de ser barato e rápido, mas que outras formas de pagamento vão conviver. Na visão do presidente do BC, o cartão de débito deverá ser mais substituído pelo Pix, ao passo que o cartão de crédito seguirá com sua função em outros termos.
"O mercado vai se desenvolvendo. O Pix vai ter novas funções, outras coisas vão aparecer e vão ter novas funções. A gente tem, por exemplo, o Whatsapp começando agora com o P2P, que é uma coisa separada, que não está no Pix. A gente tem o Google (NASDAQ:GOOGL), que quer entrar no Brasil, e quer fazer pagamento no Brasil também", disse Campos Neto.
A declaração vem após encontros recentes de Campos Neto com executivos do WhatsApp. A gigante de tecnologia ainda aguarda aval formal do BC para prosseguir com a oferta no país da possibilidade de pagamento por meio do aplicativo.
Após o ministro da Economia, Paulo Guedes, ter feito associação em falas recentes entre o Pix e um eventual imposto sobre transações, nos moldes da extinta CPMF, o presidente do BC afirmou que o sistema de pagamentos instantâneos não tem nada a ver com o imposto.
"Não tem nenhuma relação, em absoluto. Mesmo porque o Pix não vai ser a única forma de pagamento. E a CPMF, se existir, vai ser um imposto sobre todas as transações financeiras. Ou seja, vai incidir sobre outras transações que não são Pix", disse. "Pix não facilita nem atrapalha a entrada de um imposto como esse."
(Com reportagem adicional de Gabriel Ponte)