Livro desvenda segredos do Partido Comunista Chinês

Publicado 10.08.2010, 10:03
Atualizado 10.08.2010, 11:00

Marga Zambrana.

Pequim, 10 ago (EFE).- "The Party" ("O Partido", em tradução livre) é o livro mais lido do momento por intelectuais, sinólogos e politólogos da Ásia, com exceção da China, onde a publicação está proibida, por fazer revelações daqueles que estão no poder do país desde 1949.

"Na China, o Partido Comunista é como Deus: está em todas partes, mas você não pode vê-lo", diz um professor universitário ao autor do livro, o jornalista australiano Richard Mcgregor, quem revela detalhes inéditos de um dos partidos mais secretos do mundo, o Partido Comunista Chinês (PCCh).

O site onde é vendida a obra, subtitulada "The Secret World of China's Communist Rulers" ("O Mundo Secreto dos Dirigentes Comunistas da China", em tradução livre), já teve a honra de ser censurada no país, onde o autor foi tachado de "perversamente adulador".

Ex-diretor do diário "Financial Times" na China, Mcgregor expôs em um encontro com correspondentes de imprensa em Pequim que o objetivo do livro era explicar por que o PCCh sobreviveu à maioria dos partidos comunistas do mundo, à queda da União Soviética e às atrocidades cometidas pelo maoísmo, como a Revolução Cultural e o Grande Salto Adiante, que deixou 40 milhões de mortos.

"Após cada catástrofe, o Partido se levantou, reconstruiu sua armadura e reforçou seus flancos. De alguma forma, sobreviveu, burlado, melhorado ou simplesmente proibido a seus críticos, desconcertando os analistas que profetizaram seu desaparecimento em inúmeras conjunturas", assinala Mcgregor.

O Partido se imiscui em todos os aspectos da vida na China - apesar de carecer de existência legal e de atuar fora da lei -, se autodenomina comunista e mantém a estrutura e o secretismo da hierarquia leninista, mas liderou uma transição histórica da economia planificada ao capitalismo.

"Se o Partido se submetesse à legalidade, automaticamente seria mais transparente", explica o autor durante o encontro.

Por meio de fontes incomuns, Mcgregor revela diversos detalhes, como a existência da "máquina vermelha", uma linha telefônica privada e oculta - versão chinesa da antiga "vertushka" do Kremlin - que estabelece as comunicações entre os 300 políticos, ministros e empresários mais poderosos da China.

Outro detalhe é que o escritório do Departamento Central de Organização, gerente dos "recursos humanos" do PCCh e outras entidades, não possui número de telefone nem letreiro no gigantesco edifício que ocupa na Praça da Paz Celestial, em Pequim, mantendo o sigilo aos olhares do povo.

Trata-se do departamento que administra os arquivos pessoais dos líderes do PCCh, a burocracia, os negócios, os meios de comunicação, o Poder Judiciário e os acadêmicos, mas todas suas deliberações são secretas, explicou Mcgregor.

O autor assinala que seus anos de trabalho para preparar o livro conseguiram mostrar apenas "a ponta do iceberg" da atual gestão do Partido, para o qual ele prevê vida longa.

"Enquanto a economia chinesa crescer, o Partido continuará sendo legitimado para permanecer no poder", assinalou Mcgregor ao apresentar seu livro, um dos poucos que fala sobre o maior partido político do mundo, com 78 milhões de filiados, e o que mais tempo permaneceu no poder, 60 anos até agora.

"Ninguém mais sabe como fazer o trabalho de governar na China. Só eles têm o conhecimento burocrático", acrescentou o jornalista, referindo-se a um partido que em três décadas e partindo da pobreza está a ponto de transformar a China na segunda potência econômica mundial.

Quanto aos "chamados 'partidos democráticos', acho que aqui todos sabemos que estão subvencionados e controlados pelo PCCh. Não os vejo como uma futura alternativa", acrescentou Mcgregor.

"The Party" é, junto com "China's New Rulers" ("Os Novos Dirigentes da China", em tradução livre) - livro de 2004, de Andrew J. Nathan e Bruce Gilley -, uma das poucas obras que aborda a atual geração de líderes chineses e o sistema com que se governa 1,32 bilhão de pessoas, um quinto da população mundial.

Cada vez menos recorrente ao autoritarismo com o qual aniquilou centenas de estudantes na Praça da Paz Celestial em 1989, a estratégia do PCCh agora prefere métodos persuasivos de sedução sob a legitimidade que o povo lhe confere por meio do desenvolvimento econômico do país.

Por esse motivo, a ideologia comunista foi relegada a uma pura retórica e os líderes assumiram um materialismo sem concessões, explicam as fontes de Mcgregor em seu livro.

A China é hoje um dos países com mais desigualdade na distribuição de renda, a corrupção é endêmica, o Poder Judiciário não é independente e o Exército não serve ao povo, mas ao Partido.

No entanto, o sistema demonstrou ser "o suficientemente flexível", sobretudo em matéria econômica, indica o autor, que reside em Londres desde 2005 após ter trabalhado 20 anos na Ásia. EFE

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