Marga Zambrana.
Pequim, 10 ago (EFE).- "The Party" ("O Partido", em tradução
livre) é o livro mais lido do momento por intelectuais, sinólogos e
politólogos da Ásia, com exceção da China, onde a publicação está
proibida, por fazer revelações daqueles que estão no poder do país
desde 1949.
"Na China, o Partido Comunista é como Deus: está em todas partes,
mas você não pode vê-lo", diz um professor universitário ao autor do
livro, o jornalista australiano Richard Mcgregor, quem revela
detalhes inéditos de um dos partidos mais secretos do mundo, o
Partido Comunista Chinês (PCCh).
O site onde é vendida a obra, subtitulada "The Secret World of
China's Communist Rulers" ("O Mundo Secreto dos Dirigentes
Comunistas da China", em tradução livre), já teve a honra de ser
censurada no país, onde o autor foi tachado de "perversamente
adulador".
Ex-diretor do diário "Financial Times" na China, Mcgregor expôs
em um encontro com correspondentes de imprensa em Pequim que o
objetivo do livro era explicar por que o PCCh sobreviveu à maioria
dos partidos comunistas do mundo, à queda da União Soviética e às
atrocidades cometidas pelo maoísmo, como a Revolução Cultural e o
Grande Salto Adiante, que deixou 40 milhões de mortos.
"Após cada catástrofe, o Partido se levantou, reconstruiu sua
armadura e reforçou seus flancos. De alguma forma, sobreviveu,
burlado, melhorado ou simplesmente proibido a seus críticos,
desconcertando os analistas que profetizaram seu desaparecimento em
inúmeras conjunturas", assinala Mcgregor.
O Partido se imiscui em todos os aspectos da vida na China -
apesar de carecer de existência legal e de atuar fora da lei -, se
autodenomina comunista e mantém a estrutura e o secretismo da
hierarquia leninista, mas liderou uma transição histórica da
economia planificada ao capitalismo.
"Se o Partido se submetesse à legalidade, automaticamente seria
mais transparente", explica o autor durante o encontro.
Por meio de fontes incomuns, Mcgregor revela diversos detalhes,
como a existência da "máquina vermelha", uma linha telefônica
privada e oculta - versão chinesa da antiga "vertushka" do Kremlin -
que estabelece as comunicações entre os 300 políticos, ministros e
empresários mais poderosos da China.
Outro detalhe é que o escritório do Departamento Central de
Organização, gerente dos "recursos humanos" do PCCh e outras
entidades, não possui número de telefone nem letreiro no gigantesco
edifício que ocupa na Praça da Paz Celestial, em Pequim, mantendo o
sigilo aos olhares do povo.
Trata-se do departamento que administra os arquivos pessoais dos
líderes do PCCh, a burocracia, os negócios, os meios de comunicação,
o Poder Judiciário e os acadêmicos, mas todas suas deliberações são
secretas, explicou Mcgregor.
O autor assinala que seus anos de trabalho para preparar o livro
conseguiram mostrar apenas "a ponta do iceberg" da atual gestão do
Partido, para o qual ele prevê vida longa.
"Enquanto a economia chinesa crescer, o Partido continuará sendo
legitimado para permanecer no poder", assinalou Mcgregor ao
apresentar seu livro, um dos poucos que fala sobre o maior partido
político do mundo, com 78 milhões de filiados, e o que mais tempo
permaneceu no poder, 60 anos até agora.
"Ninguém mais sabe como fazer o trabalho de governar na China. Só
eles têm o conhecimento burocrático", acrescentou o jornalista,
referindo-se a um partido que em três décadas e partindo da pobreza
está a ponto de transformar a China na segunda potência econômica
mundial.
Quanto aos "chamados 'partidos democráticos', acho que aqui todos
sabemos que estão subvencionados e controlados pelo PCCh. Não os
vejo como uma futura alternativa", acrescentou Mcgregor.
"The Party" é, junto com "China's New Rulers" ("Os Novos
Dirigentes da China", em tradução livre) - livro de 2004, de Andrew
J. Nathan e Bruce Gilley -, uma das poucas obras que aborda a atual
geração de líderes chineses e o sistema com que se governa 1,32
bilhão de pessoas, um quinto da população mundial.
Cada vez menos recorrente ao autoritarismo com o qual aniquilou
centenas de estudantes na Praça da Paz Celestial em 1989, a
estratégia do PCCh agora prefere métodos persuasivos de sedução sob
a legitimidade que o povo lhe confere por meio do desenvolvimento
econômico do país.
Por esse motivo, a ideologia comunista foi relegada a uma pura
retórica e os líderes assumiram um materialismo sem concessões,
explicam as fontes de Mcgregor em seu livro.
A China é hoje um dos países com mais desigualdade na
distribuição de renda, a corrupção é endêmica, o Poder Judiciário
não é independente e o Exército não serve ao povo, mas ao Partido.
No entanto, o sistema demonstrou ser "o suficientemente
flexível", sobretudo em matéria econômica, indica o autor, que
reside em Londres desde 2005 após ter trabalhado 20 anos na Ásia.
EFE