Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - A Polícia Federal e o Ministério da Justiça trabalham para inaugurar até o fim do ano, em Manaus, o Centro de Cooperação da Polícia Internacional para combater crimes ambientais e o narcotráfico na Amazônia, uma unidade financiada pelo Brasil que vai reunir polícias dos oito países que compõem a região amazônica e também poderá receber agentes dos Estados Unidos e da Europa.
A criação do centro, inspirado em experiência que a corporação lançou em eventos esportivos realizados no país como a Copa do Mundo e a Olimpíada, foi um compromisso firmado por autoridades dos países que participaram da Cúpula da Amazônia, em Belém, tendo sido anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia 8 de agosto.
Em entrevista à Reuters, o diretor de Cooperação Internacional da PF, delegado Valdecy Urquiza, anunciou que a intenção é inaugurar o centro até dezembro. Ele detalhou que o governo brasileiro vai custear 100% da estrutura do centro, assim como a vinda de policiais estrangeiros ao país.
A instalação do local custará 9 milhões de reais, e o orçamento anual para custeio será de 7 milhões, segundo o delegado. Os valores serão financiados pela PF e pelo Ministério da Justiça, com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), gestor do Fundo da Amazônia, segundo o dirigente da PF e outra fonte a par das tratativas.
O diretor da Amazônia e Meio Ambiente da PF, delegado Humberto Freire, disse à Reuters que na terça-feira foi lançado o edital de chamamento público para se alugar um prédio na capital de Amazonas para abrigar a unidade especializada.
Para o delegado Urquiza, o centro garantirá uma atuação coordenada de policias dos países amazônicas de forma coordenada e com "resultados muito mais eficientes" para combater uma série de crimes, como desmatamento e contrabando de ouro, minérios, madeira e animais silvestres, além da presença do tráfico de drogas na região.
"A gente visualiza um impacto muito forte nas organizações criminosas que praticam esse tipo de delito na região. Espera-se uma redução significativa dos delitos ambientais naquela região e também uma atuação que envolvam toda a região amazônica e não só isoladamente alguns países".
Freire afirmou ainda que um dos focos de atuação da unidade será ajudar no combate aos fenômenos recentes do "narco-desmatamento": criminosos envolvidos com o narcotráfico que estão se dedicando ao garimpo ilegal e à retirada de madeira, entre outros delitos na região.
"Há uma preocupação, sim, de a gente identificar todas as formas de criminalidade na região, seus responsáveis e suas interações", destacou.
Além do Brasil, vão fazer parte do centro representantes das polícias de Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. O diretor da Amazônia da PF disse que será feito um convite para também participar do centro a Guiana Francesa, região ultramarina da França na costa nordeste da América do Sul que também compõe o bioma amazônico. Durante a cúpula em Belém, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou que o país quer aderir à Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
Organismos policiais como a Interpol, Europol e Ameripol também vão ser convidados a integrar o centro, segundo Freire.
Por ora, a expectativa é que pelo menos 30 policiais brasileiros e de países da região fiquem destacados exclusivamente para atuar no centro, com um coordenador vinculado diretamente às diretorias de Cooperação Internacional e da Amazônia e Meio Ambiente da PF. Essas duas diretorias são vinculadas diretamente à cúpula da corporação em Brasília.
Atualmente a cooperação entre os países da região para proteger a Amazônia é feita por meio de adidos policias e contatos diretos entre investigadores.
Freire detalhou que o centro terá três eixos principais de atuação: intercâmbio de expertise, com compartilhamento de técnicas investigativas; troca de informações de inteligência; e também cooperação jurídica para agilizar o compartilhamento formal de provas de crimes entre os participantes do centro.
"Não queremos deixar o crime migrar, então a gente não quer só fortalecer a atividade policial na Amazônia legal brasileira empurrando essa problemática para países vizinhos", disse.
"Por isso, estamos buscando trazer todos para que a gente tenha um trabalho uniforme, um fluxo de informação permanente para sufocar o crime em todas as regiões da Amazônia internacional no mesmo patamar", destacou.
Policiais dos EUA e da Europa
A criação da unidade de segurança na Amazônia é mais uma iniciativa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tentar ampliar a repressão e punição para quem pratica crimes contra o meio ambiente na região.
A agenda ambiental é prioridade do governo Lula após quatro anos de críticas internas e externas à gestão do antecessor Jair Bolsonaro por omissão e até estímulo a delitos por garimpeiros e fazendeiros no bioma.
Logo no início do ano a PF criou a Diretoria da Amazônia e do Meio Ambiente, além de o governo ter adotado uma série de iniciativas para voltar a empoderar e aparelhar outros órgãos de fiscalização ambiental, como Ibama e ICMBio.
Segundo o delegado Urquiza, a unidade poderá até servir como ponto de apoio para que países europeus e da América do Norte -- os principais destinos das mercadorias e produtos ilegais da Amazônia -- possam vir ajudar em atividades de repressão e identificação da cadeia de produção desses itens.
"Uma questão que o centro pretende é aos poucos agregar também policiais dos países destinos das mercadorias extraídas ilegalmente da Amazônia. Por quê? Enquanto houver um mercado consumidor para esse material ilegal, haverá pressão para esse tipo de delito aqui na região", disse o delegado.
Para o delegado Freire, o momento é oportuno para criação do centro e obviamente a liderança do Brasil é importante por deter quase 65% da Amazônia.
"É indubitável que essa liderança do processo pelo Brasil traz um estímulo e uma adesão mais forte dos países da região e também de outros países que estão vendo que a questão climática, a possibilidade de um ponto de não-retorno", afirmou.
"É essencial que a gente adote novas matrizes econômicas para que a gente possa reverter a tendência que infelizmente a gente viveu nos últimos quatro anos de aumento do desmatamento em números péssimos".