Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - A Câmara dos Deputados concluiu nesta sexta-feira a votação da reforma tributária, que segue agora ao Senado, dando um importante passo num raro momento de consenso sobre a necessidade de efetivá-la.
A proposta ainda precisa percorrer um caminho considerável no Senado, onde governadores e setores econômicos tendem a ter mais poder de influência, e pode ser modificada. Até mesmo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), reconhece a alta probabilidade de isso ocorrer.
Ainda assim, a conclusão da análise em dois turnos na Câmara sela o cumprimento da promessa de ter a proposta aprovada pelos deputados antes do recesso de julho e fecha uma importante etapa na tramitação da matéria.
Pouco antes de concluir a votação em segundo turno, a Câmara aprovou uma emenda que retira do texto principal da reforma dispositivo que previa a prorrogação de benefícios fiscais do IPI para plantas automobilísticas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste até dezembro de 2032.
O trecho foi destacado do texto principal e recebeu 307 votos favoráveis -- apenas 1 a menos do mínimo necessário para que fosse mantido no texto. Esta foi a única emenda aprovada em plenário, os demais destaques foram rejeitados.
FAVORECIDOS
A reforma aprovada pelos deputados traz mudanças desde a versão preliminar do parecer apresentada pelo relator Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) na semana passada. Ele manteve a simplificação tributária -- cinco tributos foram substituídos por um IVA dual não cumulativo --, a previsão de imposto seletivo para produtos prejudiciais à saúde e um grupo de bens e produtos favorecidos, o agronegócio entre eles. Também prevê alíquota zero para produtos da cesta básica nacional e estímulos ao setor de turismo.
No caso dos favorecidos, fica estabelecida uma redução da alíquota do imposto único a ser cobrado de bens e produtos de setores como agronegócio, saúde, educação e transporte. A alíquota para os regimes favorecidos corresponderá a 40% do valor cobrado dos produtos em geral.
Na tentativa de conquistar o apoio de boa parte dos governadores -- o que de fato acabou ocorrendo --, o relator concentrou-se em dar mais governança e transparência ao Conselho Federativo, entidade que ficará responsável pela administração dos recursos do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e vinha provocando resistências entre os chefes dos Executivos estaduais. Alguns governadores temiam distorções na representatividade e proporcionalidade no processo de tomada de decisões do conselho.
O acerto prevê que as decisões do conselho serão aprovadas se obtiverem, conjuntamente, os votos da maioria absoluta dos representantes de municípios e Distrito Federal e os votos do conjunto de Estados e do Distrito Federal -- neste segundo caso, será preciso obter a maioria absoluta de seus representantes e obter a aprovação de representantes que correspondam a mais de 60% da população do país.
CAPITAL POLÍTICO
A aprovação da PEC na Câmara mostrou-se como resultado dos esforços do governo, que na reta final acelerou a liberação de emendas, nomeações de cargos e até mesmo a troca do comando do Ministério do Turismo.
Mais do que isso, a movimentação da proposta dentro do calendário e em sessão relativamente rápida, em termos de PEC, evidencia a força política de Lira, que entrou pessoalmente na articulação da reforma.
Também deixou exposto o cisma na oposição, tendo como protagonistas o ex-presidente Jair Bolsonaro e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Bolsonaro posicionou-se abertamente contra a reforma e preferia que seu partido, o PL, fechasse questão contra a proposta. Seu ex-ministro Tarcísio, em lado oposto, defendeu a aprovação da matéria e seu apoio foi crucial para que outros governadores entrassem no barco. Também teve influência sobre a bancada de São Paulo.
Dos 70 deputados paulistas-- a maior unidade da Federação em termos de representação na Câmara --, os parlamentares deram 53 votos a favor, 16 contra, com uma abstenção