Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu o que queria em seu primeiro teste no Congresso ao ver reeleitos Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara e Rodrigo Pacheco (PSD-MG) como presidente do Senado, ainda que a oposição bolsonarista tenha demonstrado relativa força política entre os senadores.
Os dois parlamentares, que contaram com o apoio do governo nas disputas pelo comando das Casas, reafirmaram seu compromisso com a reforma tributária e com pautas econômicas propostas pelo governo para a recuperação econômica, sem deixar de mencionar a questão fiscal que terá um novo arcabouço.
As vitórias, que eram esperadas, marcam o primeiro triunfo do governo Lula no Legislativo após a posse do presidente no começo do ano. Antes, a então equipe de transição negociou com o Congresso anterior para a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que abriu espaço para o pagamento do Bolsa Família no valor de 600 reais, entre outras medidas para o início do governo.
O Planalto tem muito interesse em um bom relacionamento com os comandos das duas Casas para fazer avançar sua agenda, e Lula telefonou de imediato a ambos os presidentes reeleitos para parabenizá-los, já que tem pela frente votações como a medida provisória do Bolsa Família e o conjunto de medidas anunciadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para reduzir o déficit fiscal.
Depois de contar com forte apoio do governo para derrotar o bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN), Pacheco garantiu em discurso que será "colaborativo" com o governo, reiterando o compromisso de submeter a votação reformas e proposições "necessárias e imprescindíveis para o desenvolvimento do país".
"Temos um desafio agora pela frente: a reforma tributária, um novo arcabouço fiscal, porque não podemos admitir que se continue a arrecadação confusa do sistema tributário brasileiro, tampouco podemos permitir que se acabe com a responsabilidade fiscal no nosso país, que é uma conquista da modernidade", disse o presidente do Senado após a confirmação de seu nome.
Lira também mencionou a importância da reforma tributária, dizendo que o "momento pede reformas importantes para o Brasil continuar se desenvolvendo".
"Sabemos que o cobertor é curto e as necessidades sociais gigantes. Mas é justamente para isso que o Brasil conta com a gente. Somos 513 cabeças que, com maturidade, diferentes ângulos de visão e trajetórias de vida, vamos ajudar a construir soluções que evitem o populismo fiscal e melhorem a vida dos brasileiros", afirmou.
Recados
Uma das principais lideranças do centrão, Lira obteve votação recorde em eleições na Câmara --464 votos, bem acima dos 257 necessários-- e consolida seu poder político com uma aliança que uniu de bolsonaristas a petistas.
Aliado do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, Lira conquistou a vitória a partir de sua capacidade de articulação, mas também não dever ser desprezado o peso de movimento estratégico do governo, que não apresentou oponente e manifestou-se abertamente favorável a seu nome.
Já no Senado, a disputa foi menos confortável para Pacheco. O senador venceu com 49 votos entre os 81 senadores, abaixo do estimado por seus aliados. Seu adversário, o ex-ministro do governo Bolsonaro Rogério Marinho (PL-RN), obteve 32 votos -- o suficiente para apresentar um pedido de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), por exemplo.
Ainda assim, ainda que de forma imprecisa, o placar demonstra que o governo teria votos para a aprovação de uma PEC na Casa.
Na esteira dos atos de 8 de janeiro, em que os prédios do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) foram depredados por bolsonaristas que não aceitam o resultado das eleições de 2022, ambos os presidentes reconduzidos nesta quarta foram enfáticos na defesa da democracia.
Advogaram pela harmonia entre os Poderes da República e condenaram os atos de 8 de janeiro. Mas também aproveitaram para mandar recados.
Lira, por exemplo, flertou com discurso utilizado com frequência por Bolsonaro e seus apoiadores, o da "liberdade de expressão", já confundido por parlamentares bolsonaristas com chancela para mensagens de ódio e agressões a instituições democráticas.
"Seguiremos devotos da democracia e, para tanto, serei uma voz firme a favor das prerrogativas e liberdade de expressão de cada parlamentar, porque precisamos exercer nosso mandato de maneira plena", afirmou.
Na esteira de uma série de embates entre as instituições nos últimos anos, o deputado aproveitou para alertar os demais Poderes sobre o que considera uma usurpação de prerrogativas, ao defender que Legislativo, Executivo e Judiciário respeitem seus limites e fiquem "cada um no seu quadrado constitucional".
"Não dá mais para que as decisões tomadas nessa casa sejam constantemente judicializadas e aceitas sem sustentação legal", discursou.
Pacheco, que no governo passado posicionou-se como defensor da democracia, da confiabilidade das urnas eletrônicas e do sistema eleitoral brasileiro, repetiu que o Brasil precisa de pacificação e de harmonia entre os Poderes. Sinalizou, no entanto, com a possibilidade de limitar o poder de decisões de ministros de tribunais superiores.
"Essa é uma discussão possível, essa é uma discussão sadia, essa é uma discussão que não caracteriza revanchismo ou retaliação", declarou.
"Se há um problema em relação às decisões monocráticas do Supremo Tribunal Federal, legislemos quanto a isso. Se há um problema nos pedidos de vista em relação ao Supremo Tribunal Federal e aos tribunais superiores, legislemos em relação a isso. Se há um problema de competência do Supremo Tribunal Federal, legislemos quanto a isso", defendeu.
(Reportagem adicional de Ricardo Brito)