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Funai renova proteção a índios isolados por apenas 6 meses em terra alvo de grileiros e desmatadores

Publicado 01.02.2022, 19:21
Atualizado 01.02.2022, 19:25

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - Sob pressão, a Fundação Nacional do Índio (Funai) editou nesta terça-feira um decreto renovando a interdição do território Ituna-Itatá, no Pará, onde vivem indígenas isolados, por seis meses, em um decisão que apenas joga para o futuro a proteção de comunidades que estão à beira de serem dizimadas pelo avanço da grilagem e da invasão de terras.

O decreto veio apenas depois de uma decisão da Justiça Federal do Pará, a pedido do Ministério Público Federal no Estado. Ainda assim, com quatro dias de atraso e por um período curto demais para garantir uma proteção efetiva --a decisão da Justiça, acatando o pedido do MPF-PA, era de que o decreto deveria garantir mais três anos de proteção, pelo menos.

Até a última quarta-feira, a Funai se recusava a prorrogar o decreto, assim como deixou de fazer em outras áreas de índios isolados, como um território entre Lábrea e Canutama, municípios do Amazonas. Sob pressão de grileiros, a fundação alegava que os indícios da presença de índios isolados não eram conclusivos, apesar de uma nova expedição, feita em setembro de 2021 por técnicos da própria Funai, terem, mais uma vez, confirmado a presença.

Encravada no médio Xingu, próxima a usina de Belo Monte, a terra Ituna-Itatá tem indícios comprovados da presença de índios isolados desde a década de 1970, inclusive com avistamento de indígenas. Mas hoje é, também, uma das áreas mais desmatadas e invadidas nos últimos três anos.

Cercada por grileiros e agentes públicos que miram o parcelamento e a venda da terra, --incluindo parlamentares, segundo o MPF-- , o território interditado de 137.765 hectares, criado por portaria em 2011, já perdeu 22 mil hectares para o desmatamento, segundo dados do Prodes. Desse total, 84,5%, ou 18,6 mil hectares, foram desmatados a partir de 2019, durante o governo de Bolsonaro.

Os milhares de km² de mata virgem despertaram a cobiça de madeireiros e fazendeiros ilegais, especialmente depois da construção de Belo Monte. A decisão de interditar a área, antes mesmo da homologação como terra indígena, fez parte do acordo de preservação para construção da usina.

De acordo com o MPF-PA, a estimativa de que a construção resultaria em um fluxo migratório recorde para a região --de fato, 100 mil pessoas foram atraídas pela construção de Belo Monte-- fez com que o MP exigisse do poder público a proteção da área.

Desde então, a pressão sobre a terra começou, e se intensificou nos últimos três anos.

Pastor evangélico com base eleitoral na região, o senador Zequinha Marinho (PSC-PA) é um dos mais ativos na tentativa de acabar com a proteção do território, e alvo do MPF. O fim da Ituna-Itatá é um dos pontos centrais de seus discursos, seja no Congresso, seja em vídeos nas redes sociais.

Na semana passada, o colunista do UOL Rubens Valente revelou que Marinho teve uma reunião com o presidente da Funai, Marcelo Xavier, e outros servidores, para discutir o relatório de setembro sobre a presença de índios isolados no território. O encontro foi confirmado pela Reuters.

Supostamente reservado, o relatório teria sido visto pelo senador, que quis discutir pontos que comprovariam que o documento teria "impropriedades, irregularidades e cunho ideológico". Foi depois disso que a Funai anunciou que não renovaria o decreto de interdição --o que foi mudado, parcialmente, com a decisão judicial.

A decisão de estender por apenas seis meses, no entanto, não responde a determinação judicial, mas ganha tempo para que a Funai tente recorrer à instâncias superiores. Além disso, joga o final da vigência do decreto para o início de agosto, em meio à uma campanha eleitoral em que os olhos mais atentos podem não estar com toda a atenção devida sobre o tema.

Procurada para comentar a decisão pela renovação por apenas seis meses e também a influência de Zequinha Marinho nas decisões da instituição, a Funai não respondeu de imediato.

Já o senador, em nota enviada à Reuters, alegou que a sua atuação em relação ao que chama de "pretensa terra indígena" é para resolver supostos conflitos agrários na região em função da proteção do território.

"O decreto retirou 150 famílias de trabalhadores rurais das suas antigas terras, localizadas à margem direita do rio Bacajaí, e as remanejou para área que hoje é palco de conflito agrário, no município de Senador José Porfírio. O senador luta pela regularização fundiária em todo o Estado e defende os assentados rurais remanejados pelo governo para aquelas terras", diz a nota.

No texto, contrariando os indícios encontrados pela Funai e indigenistas independentes, Marinho afirma saber que não há índios isolados no território.

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