Por Jake Spring
Ambientalistas, líderes mundiais e investidores sustentáveis comemoraram nesta segunda-feira a vitória do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, que prometeu proteger a Floresta Amazônica e retomar a liderança do Brasil no combate às mudanças climáticas.
Em seu discurso de vitória, Lula prometeu combater a extração madeireira e o garimpo ilegais e a grilagem, que impulsionaram o desmatamento na Amazônia ao longo dos últimos quatro anos sob o presidente Jair Bolsonaro, que perdeu a eleição de domingo.
A destruição da floresta tropical atingiu um pico dos últimos 15 anos no governo Bolsonaro, que retrocedeu em proteções ambientais e impulsionou a mineração e a agropecuária na região.
O palácio do Planalto e o Ministério do Meio Ambiente não responderam a pedidos por comentários.
Lula prometeu uma revisão ampla da política ambiental, em alinhamento com a proposta do Novo Acordo Verde dos Estados Unidos, embora existam dúvidas se ele conseguirá impor sua ambiciosa agenda em um Congresso repleto de aliados de Bolsonaro.
Ele pode ter um caminho mais tranquilo no restabelecimento do papel do Brasil nas iniciativas internacionais contra as mudanças climáticas.
A aliada de Lula e sua ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva disse à Reuters nesta segunda-feira que o presidente eleito sinalizaria a renovação da liderança global contra as mudanças climáticas enviando representantes à cúpula do clima da ONU, a COP27, na semana que vem.
Os representantes, que ainda não foram escolhidos, formariam parte de uma delegação informal, já que Lula só assume a Presidência no dia 1º de janeiro do ano que vem.
"Com certeza haverá uma representação, ainda não oficial, mas já falamos. Mais para fazer a sinalização necessária do novo tempo e do novo governo", disse a ex ministra.
Marina afirmou que o Brasil exigiria que países ricos providenciem financiamento a países pobres para responder às mudanças climáticas oferecendo compensação por "perdas e danos" permanentes causados pelas mudanças climáticas. Mas o financiamento internacional não será uma pré-condição para a preservação da Amazônia, como insinuava o governo de Bolsonaro.
"É fundamental que tenham uma sinalização forte de que o Brasil vai retomar o seu protagonismo. E esse protagonismo não será apenas em palavras, será liderando pelo exemplo de que vamos parar de ficar culpando os países ricos de não financiar as ações para reduzir o desmatamento", afirmou Marina.
o ministro do Clima e do Meio Ambiente da Noruega, Espen Barth Eide, em uma nota enviada por e-mail nesta segunda-feira disse que a Noruega está pronta para discutir a retomada de um fundo para a preservação da Amazônia com cerca de 3 bilhões de reais. O governo Bolsonaro havia paralisado o chamado Fundo Amazônia em 2019, citando irregularidades não especificadas.
"Nós saudamos o Brasil de volta como um parceiro global nas iniciativas para reduzir o desmatamento", afirmou Eide
Com Lula, o Brasil também deve discutir suas metas nacionais para o corte de emissões relacionadas ao clima, afirmou Marina, que foi ministra do Meio Ambiente entre 2003 e 2008.
Em seu terceiro mandato Lula provavelmente deve anunciar metas para o corte de emissões de metano -- gás causador do efeito estufa muito mais potente que o dióxido de carbono -- causadas pelos rebanhos de gado, usinas energéticas e outras fontes, disse a ex-ministra.
"Quando o presidente Lula sinaliza que vamos chegar ao desmatamento zero, isso não acontece da noite para o dia, mas é uma clara sinalização de aumento de compromisso, de aumento de ambição", disse Marina.
Lula também quer realizar uma cúpula de nações amazônicas e países desenvolvidos no início de 2023 com interesse em preservar a floresta, afirmou um assessor à Reuters no mês passado. Iniciativas semelhantes, incluindo o Pacto de Letícia, assinado em 2019 no governo Bolsonaro entre nações amazônicas, não conseguiram ganhar tração.
Investidores focados em meio ambiente, governança corporativa e global (ESGs) saudaram a vitória de Lula, por conta de suas promessas de maior proteção da Amazônia.
A Nordea Asset Management, parte do banco Nordea, anunciou que avalia suspender a proibição de compra de títulos do governo brasileiro instituída em 2019, quando imensos incêndios florestais na Amazônia provocaram um clamor global pela proteção da floresta.
O diretor de investimentos responsáveis Eric Christian Pedersen disse à Reuters estar "otimista" com a possibilidade de a quarentena sobre os títulos brasileiros ser suspensa em breve.
A firma, que tem cerca de 237 bilhões de euros em ativos administrados, detinha apenas cerca de 100 milhões de euros em títulos soberanos brasileiros quando a proibição entrou em vigor.
A Robeco, que administra 200 bilhões de euros em ativos, incluindo pelo menos 5 bilhões de euros investidos em equities e títulos de dívida brasileiros, também tem uma visão positiva do Brasil "por enquanto", de acordo com os comentários de Lula sobre sustentabilidade e outros assuntos, afirmou a gerente de portfólio Daniela da Costa-Bulthuis à Reuters.
Defensores do Meio Ambiente também celebraram as propostas de Lula para a Amazônia, mas alertaram que sua agenda enfrentaria uma resistência política enorme.
Marina Silva, que conquistou uma vaga no Congresso, disse que Lula quer criar uma nova autoridade climática para supervisionar todos os ministérios e agências para combater o aquecimento global.
"Do mesmo jeito que nós temos as autoridades monetárias que ficam preocupadas em como vai estabilizar a taxa de câmbio, como vai controlar a inflação, nós iremos ter algo semelhante de como cumprir com as metas, de como não ficar abaixo daquilo que é planejado para que o Brasil cumpra com seus compromissos assumidos internacionalmente", explicou a ex-ministra.
"É uma autoridade nacional para risco climático, envolve inclusive a contribuição de outros ministérios. Se eu posso dizer Meio Ambiente, Ecologia ou Relações Exteriores, enfim, envolve outros ministérios."
A autoridade enfrentará, no entanto, um Congresso onde os aliados de Bolsonaro formam uma quase em ambas as casas.
"O pesadelo está quase no fim", disse Marcio Astrini, diretor do Observatório do Clima, apontando, no entanto, que Bolsonaro ainda tem dois meses nos quais pode sancionar novas políticas.
"Vai ser uma longa jornada para reconstruir o que foi destruído".
(Reportagem de Jake Spring; Reportagem adicional de Gwladys Fouche em Oslo)