Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - Depois de resistir a entrar em uma disputa religiosa, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) divulgou nesta quarta-feira uma "Carta Compromisso aos Evangélicos" em que se compromete em manter a liberdade religiosa garantida em seus governos anteriores e ampliar o trabalho com as igrejas no atendimento aos mais pobres.
"Não há por que acreditar que agora seria diferente. Posso lhes assegurar, portanto, que meu governo não adotará quaisquer atitudes que firam a liberdade de culto e de pregação ou criem obstáculos ao livre funcionamento dos Templos", diz o texto lido pelo ex-ministro Gilberto Carvalho em um evento com cerca de 300 religiosos evangélicos.
No documento, Lula lembra que aprovou a lei da liberdade religiosa no país e sempre atuou para garantir essa liberdade, mas que sentiu necessidade de fazer a carta em meio a uma série de notícias falsas que tem sido cultivadas contra ele.
"Em meio a este triste escândalo do uso da fé para fins eleitorais, assumo com vocês este compromisso: meu governo jamais vai usar símbolos de sua fé para fins político-partidários, respeitando as leis e as tradições que separam o Estado da Igreja, para que não haja interferência política na prática da fé", diz a carta.
O documento aborda também outros temas no qual Lula tem sido alvo de seguidos ataques pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados, de que iria liberar as drogas no país e que não defende os valores familiares.
"Outro compromisso que assumo: fortalecer as famílias para que os nossos jovens sejam mantidos longe das drogas", diz a carta.
"O respeito à família sempre foi um valor central na minha vida, que se reflete no profundo amor que dedico à minha esposa, aos meus filhos e netos. Por isso compreendo o lugar central que a família ocupa na fé cristã", acrescenta o texto assinado pelo ex-presidente.
Em discurso depois da leitura da carta, Lula se disse pessoalmente ofendido quando questionam seu comprometimento e o do partido com a família.
"A família para mim é uma coisa sagrada. Quando eu vejo as pessoas colocarem em dúvida a nossa relação e nosso respeito com a família eu fico ofendido", disse.
A carta foi preparada com a ajuda de pastores ligados ao PT e políticos evangélicos como as ex-ministras Marina Silva (Rede) e Benedita da Silva (PT) e a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), mas passou pelo crivo direto do ex-presidente, que inicialmente resistia a fazê-la. Lula afirmava que não queria entrar em uma disputa religiosa.
No texto, Lula se compromete também em fazer mais parcerias com as igrejas, caso seja eleito.
"Envio-lhes esta mensagem, portanto, em respeito à verdade e ao apreço que tenho a esse povo crente no verdadeiro Deus da misericórdia e a seus dedicados pastores e pastoras. Se Deus e o povo brasileiro permitirem que eu seja eleito, além de manter esses direitos, vou estimular sempre mais a parceria com as Igrejas no cuidado com a vida das pessoas e famílias brasileiras", afirmou.
A carta repete a posição pessoal do ex-presidente, contrária ao aborto, um dos temas que tem sido usado constantemente pela extrema-direita para atacar Lula e reafirma sua intenção de não usar a religião como parte de disputa política.
Recentemente, premido pelos ataques que vem de pastores ligados a Jair Bolsonaro, Lula tem feito eventos com religiosos --na segunda-feira teve um encontro com padres e freiras católicos--, mas evita participar de cultos, missas e outros eventos em templos e igrejas.
Em sua fala, Lula voltou a reclamar da quantidade de mentiras criadas contra ele e o PT --citou como exemplo uma notícia falsa citada por Bolsonaro de que estaria advogando por "banheiros unissex"-- e disse não acreditar que algumas coisas pudessem ser tratadas como verdade, mas que isso acontece.
"Eu quero dizer para vocês que eu não considero pastor que mente, um pastor. A pessoa pode querer escolher o Bolsonaro como presidente, não tem problema, mas não pode mentir", disse Lula. "Se pastor quiser fazer política ele vá para a rua fazer política, ele não pode ir para a igreja fazer política. Se o padre quiser fazer política, ele que faça, mas não tire proveito do altar para fazer política."
O ex-presidente pediu aos pastores que o apoiem na tentativa de esclarecer notícias falsas e garantir às pessoas o direito de votar.
"As dúvidas que se colocam sobre a gente é uma das armas que se usam para tentar evitar que a gente ganhe as eleições", disse.