Por Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - Os presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, do Congresso e Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aproveitaram sessão solene em comemoração aos 35 de promulgação da Constituição Federal para defender a harmonia e o respeito entre os Poderes, na esteira de mal-estar protagonizado por parlamentares insatisfeitos com decisões da corte.
Primeiro a se manifestar, Pacheco, que tem se posicionado de forma favorável a propostas que alteram o funcionamento do STF -- prevendo, por exemplo, a delimitação de mandatos para ministros do tribunal --, exaltou o papel dos Três Poderes na manuntenção da democracia.
"Quero lembrar que a solidez da Constituição de 1988 e do nosso ambiente democrático não seria viável sem a firme e incansável atuação dos Três Poderes da República de modo independente e harmônico", discursou o senador.
"A maior função do Supremo Tribunal Federal é a defesa da Constituição Federal, da qual é legítimo guardião. No contexto da separação dos Poderes, o STF é peça fundamental na defesa e preservação da nossa jovem e já tão testada democracia", acrescentou.
Lira, por sua vez, destacou o modo de funcionamento do Legislativo -- responsável pela elaboração da Carta federal por meio da Assembleia Nacional Constituinte -- com diálogo e busca de consenso, fazendo questão de citar que o plenário "sempre decide de maneira soberana".
"Neste momento histórico em que celebramos a democracia, dos 35 anos da nossa Constituição Cidadã, destaco a centralidade do sistema de freios e contrapesos. Trata-se de verdadeira pedra de toque da nossa democracia", disse o presidente da Câmara.
"Todos os Poderes são independentes, hamônicos entre si, e juntos, de forma respeitosa, devem assegurar o exercício dos direitos sociais, individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista, e sem preconceitos", concluiu o deputado.
Último a discursar na solenidade que contou com outras autoridades, como o vice-presidente Geraldo Alckmin -- o presidente Luís Inácio Lula da Silva recupera-se de uma cirurgia no quadril e por recomendação médica permanece trabalhando à distância no Palácio da Alvorada --, Barroso disse que ele e os dois representantes do Legislativo compartilham da mesma posição em relação à atuação institucional.
"A Constituição de 1988 fez o Executivo voltar ao seu tamanho normal, fez o Legislativo ocupar o espaço que verdadeiramente lhe pertence, e produziu uma ascensão institucional importante, eu assim penso, do Poder Judiciário", disse Barroso.
"Como eu, presidente Lira e presidente Pacheco estamos de pleno acordo, não existem Poderes hegemônicos. Nós todos vivemos em parceria institucional pelo bem do Brasil", pontuou.
"Nós também aqui (no Judiciário) percorremos um longo caminho na interpretação da Constituição de 1988 procurando empurrar a história na direção certa, que é a direção do reconhecimento dos direitos fundamentais de todas as pessoas e da igualdade das pessoas de uma maneira geral."
Apesar das declarações amenas, Barroso já disse não concordar com propostas ventiladas no Congresso tendo o STF na mira. Uma delas prevê casos em que o Congresso poderá reverter decisões do Supremo e é vista pelo presidente do STF com "muita ressalva".
Também disse não ter "simpatia" pela adoção de mandatos para os integrantes da corte, embora respeite o desejo de discussão do tema.
Pacheco, por outro lado, já declarou publicamente que a movimentação parlamentar não tem caráter de "revanche".
A declaração ocorreu no dia em que o Senado aprovou projeto de lei firmando o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, contradizendo decisão tomada na semana anterior pelo Supremo.
Na quarta-feira desta semana, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita a ação de tribunais superiores, restringindo pedidos de vista, decisões monocráticas e cautelares dos ministros de cortes superiores.
Também na direção oposta de decisão já tomada pelo STF, deputados resolveram desenterrar projeto que proíbe a equiparação de casamentos homoafetivos a casamentos heterossexuais. Prometem, ainda, resgatar projeto que restringe ainda mais as hipóteses em que o aborto é permitido pela legislação.
Ainda assim, o mal-estar institucional não chega à proporção do vivenciado durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, que após atritos com o Congresso -- tendo como alvo preferencial o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia --, passou a atacar seguidamente de forma pessoal integrantes do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Pelo menos até o momento, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem evitado entrar na guerra fria entre Legislativo e Judiciário.