Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -A declaração do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso "derrotamos o bolsonarismo" foi duramente criticada nesta quinta-feira por integrantes do Congresso Nacional, inclusive com uma cobrança de retratação pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e pedidos de impeachment por parlamentares aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Diante da repercussão negativa, o STF e Barroso -- que será o próximo presidente do Supremo -- divulgaram duas notas de explicação sobre a declaração feita na noite de quarta-feira durante participação do ministro no Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), na noite de quarta-feira, em Brasília.
"Nós derrotamos a censura, nós derrotamos a tortura, nós derrotamos o bolsonarismo para permitir a democracia e a manifestação livre de todas as pessoas", afirmou Barroso em fala após ser alvo de críticas de um grupo ligado a profissionais da enfermagem.
O ministro do Supremo, que no ano passado suspendeu a adoção do piso nacional para a categoria -- recentemente liberado, sob determinadas condicionantes --, estava acompanhado no evento de quarta-feira do ministro da Justiça, Flávio Dino, e do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).
Parlamentares ligados a Bolsonaro e de oposição ao governo Lula reagiram à fala do magistrado e anunciaram, em postagens em redes sociais, que vão pedir o impedimento de Barroso ao Senado.
"Isso é normal? Escrachou de vez? Imagine um ministro do STF dizendo numa palestra que eles 'derrotaram o lulo-petismo'. A oposição entrará com processo de impeachment contra Barroso por cometer crime de 'exercer atividade político-partidária'", afirmou o líder da oposição na Câmara, Carlos Jordy (PL-RJ).
O Senado é a Casa responsável por processar e julgar ministros do STF quanto a crimes de responsabilidade.
Diante da reação negativa inicial, a assessoria de imprensa do Supremo disse que Barroso, Dino e Orlando participaram do evento para uma "breve intervenção sobre autoritarismo e discursos de ódio".
"Apesar do divulgado, os três foram muito aplaudidos. As vaias -- que fazem parte da democracia -- vieram de um pequeno grupo ligado ao Partido Comunista Brasileiro, que faz oposição à atual gestão da UNE", afirmou a assessoria.
"Como se extrai claramente do contexto da fala do ministro Barroso, a frase 'Nós derrotamos a ditadura e o bolsonarismo' referia-se ao voto popular e não à atuação de qualquer instituição", destacou o Supremo.
Mesmo depois dessa primeira explicação, o presidente do Senado resolveu se pronunciar para, segundo ele, refletir o sentimento da Casa sobre o declaração, afirmando que tinha sido "instado por diversos senadores que manifestaram insatisfação". Pacheco afirmou que foi "muito inadequada, inoportuna e infeliz" a fala do magstrado.
"Não só da ala política que foi referida no discurso do ministro, mas outros senadores também, que mesmo não integrando essa ala discordam do fato de haver uma manifestação dessa natureza", afirmou Pacheco em entrevista coletiva, questionando, inclusive, a própria participação de um ministro do STF em um evento de cunho político.
"Acho que cabe ao ministro de fato fazer explicação em relação a isso, eventualmente uma retratação. Todos nós temos o direito de errar, de ter uma fala infeliz em algum momento... mas não cabe a um membro do Poder Judiciário, seja um juiz de primeira instância ou um ministro da Suprema Corte, fazer manifestações de cunho político em relação a uma ala política ou qualquer situação de natureza política", disse o senador.
Após a fala de Pacheco, Barroso divulgou uma nota oficial, procurando explicar especificamente a que se referia quando falou "derrotamos o bolsonarismo".
"Na data de ontem, em Congresso da União Nacional dos Estudantes, utilizei a expressão ´Derrotamos o Bolsonarismo´, quando na verdade me referia ao extremismo golpista e violento que se manifestou no 8 de janeiro e que corresponde a uma minoria", disse o ministro na nota.
"Jamais pretendi ofender os 58 milhões de eleitores do ex-presidente nem criticar uma visão de mundo conservadora e democrática, que é perfeitamente legítima. Tenho o maior respeito por todos os eleitores e por todos os políticos democratas, sejam eles conservadores, liberais ou progressistas", acrescentou.
Advogado constitucionalista de carreira, Barroso foi indicado para o Supremo por Dilma Rousseff em 2013.
Antes das eleições gerais do ano passado, ele presidiu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e teve uma série de embates públicos com o então presidente Jair Bolsonaro por críticas infundadas feitas pelo chefe do Executivo à confiabilidade das urnas eletrônicas.
O magistrado, de 65 anos, deve assumir o comando do Supremo entre o final de setembro e início de outubro, a partir da aposentadoria compulsória da atual presidente do tribunal, Rosa Weber, que completará 75 anos.
(Reportagem adicional de Patrícia Vilas Boas, em São PauloEdição de Pedro Fonseca e Alexandre Caverni)