Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - Polêmicas geradas pela proposta de privatização da Eletrobras (SA:ELET3), maior elétrica da América Latina, atrasaram planos do governo do presidente Michel Temer de reformar a regulamentação do setor elétrico, um projeto cujo destino dependerá agora do próximo governante, a ser eleito em outubro.
O diagnóstico é compartilhado tanto por investidores do setor quanto por alguns membros da cúpula do Ministério de Minas e Energia, disseram à Reuters um técnico de alto escalão do governo e o dirigente de uma associação que representa companhias de energia.
"Foi uma cartada muito forte. Os outros temas ficaram represados e podiam ter ido. Foi uma aposta, gastou-se muita energia, mas não teve resultado", lamentou a fonte do governo, que falou sob a condição de anonimato.
A reforma, que conta com grande apoio de elétricas, tem como objetivo modernizar a legislação do setor e começou a ser discutida em julho do ano passado, um mês antes de vir à tona a proposta de desestatização da Eletrobras.
O presidente do Fórum das Associações do Setor Elétrico (FASE), Mario Menel, que faz a interlocução das elétricas junto ao governo, disse que o ideal era que a reforma tivesse sido aprovada no Congresso em 2017 para passar por regulamentação ao longo deste ano, um calendário atrapalhado pelo tom político do debate após o governo falar na privatização.
"Tirou o foco, a prioridade passou do marco regulatório para a privatização. Quando isso foi concebido, imaginávamos uma aprovação em novembro de 2017. A privatização da Eletrobras atravessou o projeto e contaminou os prazos e os debates, ainda mais em ano eleitoral", afirmou.
Antes de a reforma deixar a lista de prioridades do governo, grandes empresas do setor de energia elogiaram a medida. Grupos como a francesa Engie, a portuguesa EDP (SA:ENBR3) e a CPFL (SA:CPFE3), da chinesa State Grid, chegaram a montar equipes e contratar consultorias para analisar a proposta e sugerir melhorias.
VOLTA À PAUTA?
O deputado federal Fábio Garcia (DEM-MT), relator do projeto sobre a reforma na Câmara, disse à Reuters que pretende retomar as discussões sobre a matéria após as eleições, para encaminhar o texto ao Plenário da Casa ou ao Senado ainda em 2018, se possível.
"Sem dúvida alguma, a questão da privatização colocou sob olhos mais atentos todos projetos que tramitavam com relação ao setor elétrico, mas esse projeto não tem nada a ver com a privatização... torço muito para que dê para a gente votar as questões importantes, passado o período eleitoral", afirmou.
Ele adicionou que o projeto encontra-se "pronto para ser votado".
O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr., disse à Reuters que agora a reforma dependerá do próximo presidente e que o governo atual acabou sendo obrigado a priorizar alguns temas, como a venda de distribuidoras da estatal, também alvo de um projeto de lei já aprovado na Câmara e que tramita no Senado.
"Essas propostas têm que ser viabilizadas politicamente. Se o que tem lá (no projeto) for alinhado ao interesse do novo presidente, ele já encontra uma coisa pronta que ele pode colocar pra funcionar rapidamente. Se for do lado contrário, tem um debate e pode abandonar aquele negócio", afirmou.
Ele defendeu, no entanto, que a proposta de privatização da elétrica não deve ser considerada a vilã no atraso da mudança da regulamentação setorial.
"Creio que não houve impacto, foi feito um exercício de prioridades... a quantidade de projetos que (o Congresso) tem para votar é muito grande."
O projeto de lei sobre a privatização da Eletrobras foi enviado ao Congresso Nacional em janeiro. Após sessões intensas de debate e forte oposição de diversos parlamentares, inclusive de membros da base do presidente Temer, a matéria foi colocada em "stand by" no início de junho.
Nesse meio tempo, as ações preferenciais da Eletrobras chegarem a valer 29 reais em fevereiro, auge das esperanças de avanço da proposta. Os papéis são negociados atualmente a 18 reais, praticamente mesmo nível de preço visto antes de o governo anunciar as intenções de desestatização.
Já a reforma na regulamentação elétrica começou a andar na Câmara em abril, mas esbarrou na falta de quórum, na chegada do recesso parlamentar em julho e nas eleições.
A proposta envolvia, entre outros pontos, a ampliação do chamado mercado livre de eletricidade, hoje limitado a grandes consumidores, como indústrias, que podem negociar contratos de energia diretamente com geradores e comercializadoras.
(Por Luciano Costa)