Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - Operadores de hidrelétricas que negociam a produção no mercado livre de eletricidade pretendem manter a disputa judicial que travam com o governo desde o ano passado para evitar perdas financeiras decorrentes da falta de chuvas em 2015, mesmo após esforço recente do Ministério de Minas e Energia por um acordo que acabasse com a judicialização no setor de energia.
No mês passado, o Superior Tribunal de Justiça suspendeu uma liminar que protegia algumas empresas da obrigação de pagar pela compra de energia no mercado de curto prazo para compensar a menor geração de suas usinas, o que foi visto pelo governo como um primeiro passo para encerrar o conflito, mas a decisão teve pouco efeito até o momento.
Na terça-feira, a liquidação financeira de operações realizadas em junho no mercado de curto prazo registrou arrecadação de apenas 22,5 por cento dos 2,53 bilhões cobrados junto aos agentes que participam da operação, que promove pagamentos e recebimentos entre as companhias.
Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), responsável pelas liquidações financeiras, cerca de 1,14 bilhão de reais ficaram em aberto devido à disputa judicial. Enquanto isso, algumas empresas que têm créditos a receber nesse mercado, como a Petrobras (SA:PETR4), têm amargado pesados calotes.
Isso porque a liminar suspensa pelo STJ protegia apenas empresas de menor porte, donas de pequenas usinas hídricas, representadas pela Associação Brasileira dos Geradores de Energia Limpa (Abragel). Outro grupo de investidores, mais representativo, ainda está protegido por decisão judicial da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine).
"Tínhamos uma expectativa, e continuamos tendo, de que o governo... consiga promover um grande entendimento para que, diante de condições viáveis, as empresas possam retirar voluntariamente suas liminares", afirmou à Reuters o presidente da Apine, Guilherme Velho.
As elétricas argumentam que o déficit de geração das usinas, naturalmente causado pela seca, foi agravado por decisões do governo, como a postergação de reajustes de tarifas de energia que poderiam ter reduzido o consumo e poupado água nos reservatórios das hidrelétricas.
No ano passado, após o excesso de liminares travar as liquidações financeiras na CCEE, o governo negociou um acordo com as elétricas, mas só chegou a um entendimento com os geradores que haviam vendido a produção no mercado regulado, para distribuidoras.
Em troca de uma compensação parcial das perdas financeiras, essas empresas desistiram de suas ações judiciais, mas a disputa jurídica seguiu no mercado livre.
O acordo chegou a envolver o parcelamento dos débitos causados pela seca, o que as elétricas que ainda mantêm suas liminares também defendem. Isso porque, uma vez que percam as decisões que as protegem, elas precisariam pagar todas dívidas acumuladas no período em que estiveram isentas dos débitos.
"O valor é muito elevado. Existem situações de inviabilidade de caixa para pagar esse acerto à vista", afirmou Velho, que defende a possibilidade de parcelamento. "Até para ter um tratamento isonômico."
Algumas empresas associadas à Abragel estão negociando esse parcelamento, agora que perderam sua liminar, disse o presidente da entidade, Márcio Severi. "Isso deve ser julgado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) na próxima semana", afirmou.
Procurado, o Ministério de Minas e Energia comentou, em nota, que tem se esforçado para "retomar a normalidade do mercado de energia no país, buscando o diálogo com os diversos segmentos para enfrentar questões que ainda causam incertezas". A CCEE disse que mantém um diálogo com as empresas em busca de uma solução definitiva.