Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, admitiu nesta sexta-feira conversas com a presidente Dilma Rousseff sobre sua saída do governo, mas deu muitas respostas evasivas sobre o assunto e em nenhum momento foi direto sobre sua permanência no cargo, mesmo após intensos ruídos de que estaria deixando a pasta.
"A gente tem conversado... Eu acho que tem que falar o que já falei... O ano legislativo se encerrou e isso abre umas tantas alternativas. Evidentemente meu objetivo não é criar nenhum tipo de constrangimento ao governo", afirmou o ministro a jornalistas durante café da manhã, após ser questionado se já havia acertado sua saída com Dilma.
"É importante ter clareza de exatamente quais são as prioridades até em função de todas as diversas demandas sobre o governo, sobre a presidente, e eu acho que qualquer caminho vai ser muito em função disso", acrescentou.
As notícias sobre a saída do ministro ganharam força nos últimos dias, turbinadas pela decisão do governo de buscar uma meta de superávit primário para 2016 que previsse abatimentos que poderiam, na prática, anular o esforço fiscal.
Levy sempre foi contrário ao afrouxamento, avaliando que diminuiria a pressão para parlamentares aprovarem medidas de ajuste, aumentando a desconfiança de agentes econômicos com o real esforço para o reequilíbrio das contas públicas.
Na véspera, no entanto, o Congresso aprovou uma meta de superávit menor, de 0,5 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), sobre 0,7 por cento defendido por Levy, mas barrou a possibilidade de descontos, como inicialmente queria o Executivo.
Diante do constante vaivém do alvo da economia para pagamento dos juros da dívida pública, o Brasil perdeu o grau de investimento pelas agências de classificação de risco Fitch e Standard & Poor's.
Os mercados financeiros estão reagindo negativamente à saída de Levy, que deve ocorrer ainda nesta sexta-feira ou nos próximos dias, segundo fontes ouvidas pela Reuters. A Bovespa recuava mais de 2 por cento.
MAIS INCERTEZAS
Nesta manhã, Levy avaliou em diversos momentos que a economia irá reagir após a superação das incertezas políticas. Disse ainda que a perspectiva de impeachment da presidente Dilma Rousseff é pequena "porque as pessoas não querem mais incerteza".
Em tom de retrospectiva, Levy avaliou que a maior parte das prioridades que havia estabelecido para o ano foram pelo menos encaminhadas "de maneira muito concreta".
"Isso evidentemente nos dá uma certa tranquilidade, mas não necessariamente implica em nenhuma ação, vamos dizer assim, específica imediata. É mais uma observação de que a gente está no caminho certo", afirmou.
Após levantar inicialmente a bandeira d superávit primário de 1,2 por cento do PIB para o setor público consolidado em 2015, Levy terminará o ano com histórico rombo nas contas do governo, em meio à recessão econômica e à intensa crise política, que emperrou ou atenuou muitas das medidas de ajuste que propôs ao longo de sua gestão.
Questionado sobre o que teria dado errado, ele respondeu que não houve falha de ninguém, mas sim processos que interferiram.
"O desempenho das receitas por conta de incertezas de natureza política vinha de maneira completamente diferente de qualquer projeção econômica."
PREÇOS E PEDALADAS
Ao falar sobre o desafio de domar a inflação, que deve subir mais de 10 por cento em 2015 --muito acima da meta do governo de 4,5 por cento, com tolerância de 2 pontos para cima ou para baixo-- Levy afirmou que outras medidas seriam bem-vindas além do tradicional instrumento de aperto nos juros do Banco Central.
"Sem embargo da autonomia dele (BC), evidentemente, é muito importante que a gente tenha outras ações estruturais que permitam inclusive melhorar a transmissão da política monetária, de tal maneira que a gente possa, com o menor custo possível, segurar a variação de preços", disse, sem entrar em detalhes.
Sobre a regularização das chamadas pedaladas fiscais, os atrasos no repasse da União a bancos públicos pelo pagamento de subsídios e programas, Levy disse ter inclinação pelo desembolso mais rápido possível, notadamente para o BNDES. Em relação ao FGTS, disse acreditar que o parcelamento seria mais "conveniente".