Por Rodrigo Viga Gaier
RIO DE JANEIRO (Reuters) - O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta sexta feira que uma eventual mudança da jurisprudência sobre a prisão após decisão judicial em segundo grau afetaria a operação Lava Jato e representaria uma passo para a volta da impunidade no Brasil.
Em entrevista a correspondentes estrangeiros no Rio de Janeiro, Barroso denunciou ainda a existência de uma “operação abafa" no país articulada por pessoas ricas e poderosas que tentam escapar de punições por irregularidade cometidas em casos de corrupção
Sem citar nomes, o ministro do STF declarou que essa operação abafa em curso no Brasil reúne pessoas “do alto escalão, poderosos, na própria imprensa e no próprio Judiciário.
“O abafa tem a ver com a Lava Jato e com a corrupção em geral… a corrupção no Brasil foi sistêmica e institucionalizada, mas ela está sendo revelada e deixamos de varrer para debaixo graças à imprensa livre e à sociedade atenta”, disse ele a jornalistas na sede da Associação de Correspondentes Estrangeiros.
“O enfrentamento é a parte boa, esse movimento que incluiu a Lava Jato, alcançou pessoas que sempre se imaginaram imunes e impunes ao sistema penal. Você tem um lote de pessoas pior que não querem ficar honestas daqui para frente e querem manter o modelo como está, com as mesmas práticas de extorsão... se mobilizam na operação abafa”, disse.
Barroso lembrou na entrevista de quase uma hora e meia que o Supremo deu recentemente uma contribuição importante no combate à corrupção no país com a permissão das execuções penais na Justiça de segundo grau.
“Pela primeira vez em 500 anos os ricos delinquentes do Brasil temeram ser presos e isso estava na essência da Lava Jato, porque o temor da prisão levou a muitas colaborações premiadas… e isso está claramente ameaçado por essa reação de pessoas que não eram a clientela habitual do sistema penal”, disse.
Barroso criticou veladamente colegas que podem mudar o “direito penal em função do réu” e declarou que se a jurisprudência sobre o caso mudar, o Estado Democrático de Direito passa a ser um Estado de “compadrio”.
“Juiz não pode se mover pela lógica amigo ou inimigo; a lógica é certo ou errado, justo ou injusto, legítimo ou ilegítimo", defendeu.
O tema sobre a prisão de um condenado em segunda instância pode ser levado a uma nova discussão no STF depois de algumas declarações dadas pelo ministro Gilmar Mendes, que sinalizou a possibilidade de alterar seu voto.
Sem criticar o colega de toga diretamente, Barroso, afirmou que desde o ano passado, quando o tema foi a plenário três vezes, nada mudou.
“O STF decidiu no ano passado três vezes e manteve prisão em segundo grau, e não aconteceu nenhum fato novo a não ser prisão de novos réus”, avaliou Barroso.
REFORMA POLÍTICA
Na entrevista, o ministro defendeu ainda a adoção do semipresidencialismo no Brasil, em um modelo parecido com o que existe em Portugal, e classificou o atual sistema eleitoral brasileiro de "desastre".
Barroso também defendeu a adoção do voto distrital misto no país. De acordo com ele, esse modelo reduziria os custos de campanha, aumentaria a representatividade dos eleitos e facilitaria a governabilidade.
Ele considera que, por conta do pouco tempo para mudar a legislação, o voto distrital misto só seja viável para a eleição de 2022.
“Acho que haveria dificuldade de se demarcar distritos e haver consenso (em tempo hábil)... talvez tenha que se pagar o preço de se ter o distritão (em 2018) para ter o ideal em 2022… mas o distritão é péssimo tal como o sistema atual”, disse Barroso.