BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta quinta-feira que pessoas que exercem o poder não têm o direito de "esticar a corda" a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia, ao mesmo tempo que disse que nunca teve a intenção de agredir quaisquer dos Poderes.
Bolsonaro acrescentou que boa parte das divergências que têm causado conflitos decorrem de entendimentos a respeito de decisões adotadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito do inquérito das fake news.
"Mas na vida pública as pessoas que exercem o poder, não têm o direito de 'esticar a corda', a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia", disse Bolsonaro, em Declaração à Nação publicada nesta tarde pelo Palácio do Planalto.
"Por isso quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum", acrescentou.
Principal alvo das manifestações do 7 de Setembro, convocadas por Bolsonaro, Moraes é o ministro do STF responsável por conduzir investigações sensíveis contra o próprio presidente e aliados, tendo determinado prisões, buscas e apreensões e bloqueios de bens de simpatizantes do governo e entidades que supostamente pretendiam realizar atos antidemocráticos no feriado.
Durante discurso em São Paulo, dia 7, Bolsonaro fez ataques duríssimos contra Moraes e disse que não acataria mais decisões do magistrado.
"Não vamos mais admitir que pessoas como Alexandre de Moraes continuem a açoitar a nossa democracia e desrespeitar a nossa Constituição... ou esse ministro do Supremo se enquadra ou ele pede para sair"", afirmou o presidente a apoiadores em São Paulo.
"Dizer a vocês que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou, ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais", acrescentou o presidente.
Essas declarações levaram a uma forte reação de autoridades dos demais Poderes. O presidente do STF, Luiz Fux, alertou Bolsonaro que o não cumprimento de decisões judiciais configura crime de responsabilidade --esse tipo de delito é punido com a perda do cargo.
A nota desta quinta-feira foi publicada após Bolsonaro ter se reunido com o ex-presidente Michel Temer em Brasília. Moraes foi ministro do governo Temer, em cuja gestão ele foi indicado para o Supremo.
Na declaração, Bolsonaro afirmou que existem "naturais divergências" em algumas decisões de Moraes, mesmo reconhecendo as qualidades do magistrado como jurista.
O presidente disse que essas questões devem ser resolvidas por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição.
RESPEITO PELAS INSTITUIÇÕES
Bolsonaro reiterou ainda o "respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país".
"Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição", destacou.
O presidente afirmou que sempre esteve disposto a "manter o diálogo permanente com os demais Poderes pela manutenção da harmonia e independência entre eles".
No final, o presidente agradeceu "o extraordinário apoio do povo brasileiro, com quem alinho meus princípios e valores, e conduzo os destinos do nosso Brasil".
REAÇÕES
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que vem insistindo na necessidade de diálogo entre os Poderes, elogiou as declarações de Bolsonaro.
"Respeito entre os Poderes, obediência à Constituição e compromisso de trabalho árduo em favor do desenvolvimento do país. É disso que o Brasil precisa e que vamos continuar defendendo", disse Pacheco no Twitter.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) avaliou, por sua vez, que, com a nota oficial desta quinta, Bolsonaro pode perder apoio entre seu núcleo mais fiel de apoiadores.
"Ele consegue temporariamente alguma coisa no meio político, mas ainda assim ele perde, ou talvez perca aquilo que era a única coisa que ele tinha. Grande parte do público dele é um público do radicalismo, são os 10% que não estão entendendo e não vão entender essa carta. Vão se sentir abandonados", disse a senadora.
O consultor político Creomar de Souza, CEO da Dharma Politics, acredita que o episódio desta semana --primeiro o ataque e depois algum movimento de apaziguamento-- segue o padrão de sempre do presidente.
"Agride, dá um passo mais além e na volta o pedido de desculpas o coloca em uma posição mais avançada", disse Creomar.
"Bolsonaro aposta no cansaço e no desgaste dos outros atores políticos. Enquanto todos estão ansiosos e até imploram por diálogo, para ele, o confronto é o que mais interessa."
(Reportagem adicional de Eduardo Simões; Edição de Alexandre Caverni)