O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) projeta deficit primário de R$ 5,6 bilhões para as estatais federais brasileiras neste ano. Os dados estão disponíveis no Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 4º Bimestre de 2023 (íntegra – PDF – 3 MB).
A estimativa é superior ao rombo de R$ 3 bilhões previsto na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2023. As companhias estatais sob o governo não registram prejuízo desde 2020, 1º ano da pandemia de covid-19.
Houve deficit de R$ 614 milhões naquele ano. Segundo a projeção do governo, a Emgepron (Empresa Gerencial de Projetos Navais) deve ter deficit de R$ 3,17 bilhões.
O prejuízo seria o maior entre as principais empresas estatais. Na sequência, vem a Eletronuclear, com rombo de R$ 2,11 bilhões.
Subsidiária da ENBPar (Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional), a companhia do setor de energia administra as usinas Angra 1 e Angra 2, no Estado do Rio de Janeiro.
Os números não incluem empresas do grupo Petrobras (BVMF:PETR4) e bancos estatais, que estão fora da meta de resultado.
Eis as estimativas envolvendo as principais estatais federais:
ELETROBRAS
Em junho de 2022, o governo de Jair Bolsonaro (PL) concluiu o processo de privatização da Eletrobras (BVMF:ELET3). Com isso, a ENBPar foi criada para assumir as atividades da Eletrobras que não podiam ser privatizadas, como as empresas Itaipu Binacional e os ativos nucleares da Eletronuclear.Na 3ª feira (14.nov), a ministra Esther Dweck (Gestão e Inovação) disse que os investimentos do setor de energia não eram incluídos desde 2009 na meta de resultado das estatais federais. Ela afirmou que o governo pedirá para que a ENBPar seja “excepcionalizada” na LDO de 2024.
GOVERNO
Em nota publicada na 4ª feira (15.nov), o Ministério da Gestão e Inovação negou que o Tesouro Nacional fará um aporte para cobrir o rombo das estatais federais. O ministério disse que está “consolidando a última proposta de reprogramação do orçamento”.O comunicado também justifica que os investimentos das estatais de energia eram excluídas oficialmente da meta fiscal por serem “estratégicos”.
Em outra nota publicada na 5ª feira (16.nov), o Ministério da Gestão e Inovação negou haver rombo e ratificou que o Tesouro não terá de cobrir prejuízos das estatais.
“Não existe ‘rombo’, o que existe são investimentos com recursos que as empresas já têm em caixa. O deficit é uma medida calculada com receitas e despesas de cada ano, então não considera os recursos que existem em caixa de anos anteriores”, diz um trecho do comunicado.
APORTES
Durante os governos dos ex-presidentes Michel Temer (MDB), Dilma Rousseff (PT) e Bolsonaro, o governo fez aportes para as estatais. De 2011 até 2022, os valores somaram R$ 44,9 bilhões, conforme dados do Tesouro Nacional.Eis os recursos aplicados:
- 2011-2015 (Dilma Rousseff) – R$ 10,9 bilhões;
- 2016 (Dilma/Michel Temer) – R$ 6,5 bilhões;
- 2017-2018 (Temer) – R$ 8,1 bilhões;
- 2019-2022 (Jair Bolsonaro) – R$ 19,3 bilhões.
MEDIDAS SANEADORAS
Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da Ryo Asset, afirma que os governos de Temer e Bolsonaro promoveram ações para o saneamento financeiro das estatais. Ao Poder360, ele mencionou a “redução no quadro de pessoal em aproximadamente 13% de 2018 até setembro de 2022, adicionada à influência das capitalizações feitas em algumas estatais”.O economista também critica o fim da divulgação do boletim trimestral das estatais. “O último disponível é do 3º trimestre de 2022, demasiado ultrapassado. É fundamental retomar as divulgações, dando publicidade para os avanços e retrocessos na cobertura das estatais federais”, acrescentou.
OUTRO LADO
O Poder360 procurou Correios, Serpro, Dataprev, ENBPar, Eletronuclear, Hemobrás, Emgepron e Nav Brasil para obter um posicionamento sobre os resultados projetados pelo governo para as estatais em 2023. Até a publicação desta reportagem, Eletronuclear, Dataprev e Correios encaminharam nota a este jornal digital.O espaço segue aberto para as outras empresas mencionadas.
ELETRONUCLEAR
“A Eletronuclear, sob controle indireto da União por meio da Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (ENBPar), esclarece informações recentemente veiculadas sobre a saúde financeira das estatais brasileiras, especificamente em relação à Eletronuclear.“Vale ressaltar que a Eletronuclear foi criada em 1997 com a finalidade de operar e construir usinas termonucleares no Brasil. Subsidiária da ENBPar, é uma empresa de economia mista e responde pela geração de aproximadamente 3% da energia elétrica consumida no Brasil. Pelo sistema elétrico interligado, essa energia chega aos principais centros consumidores do país e corresponde a mais de 30% da eletricidade consumida no Estado do Rio de Janeiro, proporção que se ampliará consideravelmente quando Angra 3, terceira usina da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto – CNAAA estiver concluída.
“De 2009 até 2022, a empresa, como parte do Grupo Eletrobras, estava isenta de incluir as estatísticas fiscais nas metas de resultado primário, conforme definido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Contudo, com a privatização da Eletrobras e a promulgação da LDO 2023, essa condição mudou. A Eletronuclear passou a ser incluída nas estatísticas fiscais de 2023, alterando a percepção sobre nossa saúde financeira.
“Atualmente, há uma proposta em tramitação no Congresso Nacional que busca restabelecer a excepcionalidade da Eletronuclear, alinhando novamente às condições previamente concedidas.
“É crucial entender que o resultado primário de uma empresa estatal não dependente, como a Eletronuclear, não reflete adequadamente nossa situação financeira. Em 2022, a empresa recebeu um aporte significativo de R$3,5 bilhões do acionista controlador, destinado a impulsionar futuros investimentos. Esses recursos estão sendo utilizados em projetos estratégicos, incluindo a conclusão de Angra 3 e a extensão da vida útil de Angra 1.
“Esses investimentos de grande escala têm um impacto temporário nos nossos resultados fiscais. A metodologia atual de cálculo do resultado primário não considera nosso saldo de caixa, o que pode levar a uma percepção equivocada de deficit. No entanto, é importante destacar que, até setembro de 2023, reportamos um lucro líquido de aproximadamente R$ 886,7 milhões, principalmente devido ao desempenho das usinas Angra 1 e 2.
“A Eletronuclear reafirma seu compromisso com a transparência, gestão responsável e desenvolvimento sustentável, contribuindo continuamente para o avanço do setor de energia nuclear no Brasil.”
Correios
“Com relação às notícias sobre a previsão de resultados das estatais, os Correios esclarecem que a atual gestão da empresa vem reduzindo o deficit desde o início do ano. O deficit apontado nas matérias, que era referente ao quarto bimestre e foi causado, em grande parte, pela gestão anterior, já foi reduzido em mais de R$ 200 milhões.“Os Correios nunca trouxeram despesa para a União ou o contribuinte brasileiro. Ao contrário: de 2001 até 2017, o resultado líquido positivo acumulado foi de R$ 11,7 bilhões e a estatal repassou R$ 9 bilhões para a União. Com isso, a empresa possui caixa saudável, de mais de R$ 3 bilhões.
“É preciso destacar que, na gestão passada, o aumento de receitas trazido pelo crescimento do comércio eletrônico na pandemia não foi convertido em investimento, demonstrando a clara intenção de privatização. Os Correios deixaram de realizar publicidade e cortaram a destinação de recursos para tecnologia, inovação e modernização.
“O desafio da atual diretoria é diversificar a oferta de produtos e serviços, em especial os voltados ao e-commerce, de forma a tornar a empresa mais competitiva nos setores em que atua e, ao mesmo tempo, implantar mudanças estruturais para consolidar a força e ampliar a respeitabilidade da marca Correios, por meio da comprovação de sua eficiência.
“A empresa segue cumprindo a relevante função de integradora nacional, presente em todas as cidades do Brasil, atuando como agente do governo federal na entrega de cidadania ao realizar operações essenciais para o País, como a entrega de livros didáticos usados pelas escolas públicas, das provas do Enem, de medicamentos, leite em pó, fraldas e outros itens necessários para a população brasileira.”
Dataprev
“A Dataprev esclarece que, a partir de dados atualizados sobre seus resultados financeiros, a expectativa para 2023 é de um lucro próximo a R$ 500 milhões, e um resultado primário positivo de R$ 26 milhões.“A perspectiva da empresa para 2024 é de crescimento, com investimentos em modernização e expansão da capacidade de infraestrutura física e tecnológica para melhoria dos serviços públicos.
“Cabe destacar que a Dataprev é uma estatal não dependente e nunca recebeu repasses de verba do Governo Federal.”