O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega disse que o pacote fiscal que revisa gastos públicos é “uma boa proposta”. Segundo ele, a avaliação negativa das medidas por parte do mercado se deve a um “jogo” político.
“O mercado gosta de manter o governo sob controle para conseguir as coisas. É um jogo político. Esse jogo político existe em todos os lugares, então você precisa saber fazer esse jogo. Mas o balanço [do pacote fiscal] é positivo”, declarou em entrevista ao portal UOL publicada nesta 5ª feira (5.dez.2024).
O conjunto de medidas anunciadas na semana passada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem um impacto de R$ 71,9 bilhões nas contas públicas em 2 anos e de R$ 327 bilhões até 2030. O pacote inclui o aumento da isenção do IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física) para pessoas que recebem até R$ 5.000 por mês.
Para agentes do mercado financeiro, as propostas estão “aquém do esperado”.
Segundo Mantega, Haddad “está sendo um bom ministro” e conseguindo “navegar nesse mar revolto” com competência.
“Ele conversa com o Congresso, convence o presidente [Luiz Inácio Lula da Silva (PT)] dos ajustes, mesmo que outros ministros fiquem bravos com os cortes orçamentários. O problema é que não tem dinheiro para tudo. Administrar o Estado é administrar escassez de recursos. Mesmo nos Estados Unidos falta dinheiro”, afirmou.
“O governo está sendo extraordinário, porque ele está dando vantagem para todo mundo. Mas há um mal-estar do empresariado com o governo, o que eu acho uma contradição. É algo que fica difícil de entender”, declarou.
Mantega ressaltou que “a dívida está alta”, mas que a inflação “está relativamente comportada” e a economia “cresce acima de 3% há 3 anos”.
Ele disse: “Antigamente, dizia-se que se a economia está indo bem, com o país em pleno emprego, então o povo deveria estar feliz. O governo não está indo mal. O mercado diz que tem um desequilíbrio fiscal, um descontrole fiscal. Será que tem? Eu acho que não”.
Conforme o ex-ministro, o BC (Banco Central) “tem criado expectativas negativas”, causando “uma pressão indevida” na economia brasileira.
O atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, não tem, de acordo com Mantega, “o perfil de um banqueiro central independente, de um técnico”. O ex-ministro declarou: “Acho que ele tem um vínculo político com a oposição”.
Mantega disse “não ter dúvidas” que o BC tem responsabilidade pela alta do dólar. A moeda norte-americana ultrapassou os R$ 6 depois do anúncio do pacote fiscal do governo.
“Eles [integrantes do BC] deixaram o dólar valorizar e podiam ter feito operações de swap cambial [quando a autarquia usa reservas internacionais como uma espécie de seguro para evitar a desvalorização do real]. Todo mundo faz. Mas não fizeram a lição de casa em relação ao câmbio”, declarou.
“Tudo isso me leva a crer que o comportamento do Roberto não é adequado, é um comportamento político. Ele é o ‘cavalo de Troia’ do governo Bolsonaro dentro do governo Lula. Essa situação de alta dos juros vai acabar interrompendo o processo de dinamismo da economia brasileira que era salutar e que estava em curso”, disse.
Campos Neto está de saída do BC. Em janeiro, será substituído por Gabriel Galípolo, indicado por Lula.
“Galípolo é um bom técnico. É um rapaz muito inteligente, de pouca idade, mas espertíssimo. E eu acho que o tempo como secretário executivo da Fazenda foi importante também porque o presidente do Banco Central tem que ser um bom macroeconomista”, afirmou Mantega.