Por Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - Os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski votaram, no plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF), pela autorização para que os atuais presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sejam autorizados a tentar mais uma vez a reeleição para o comando das Casas.
Relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pelo PTB, Gilmar Mendes considerou que só poderá haver uma reeleição para o comando das duas Casas, mas a regra deve começar a contar a partir da próxima legislatura.
De acordo com o ministro, os membros do Congresso Nacional têm a prerrogativa de deliberar sobre o processo, desde que se observe o limite de uma única reeleição sucessiva ao mesmo cargo mas, ressalva, a regra deve orientar a formação das Mesas da Câmara e do Senado "a partir da próxima legislatura, resguardando-se, para aquela que se encontra em curso, a possibilidade de reeleição ou recondução, inclusive para o mesmo cargo."
Toffoli, Moraes e Lewandowski seguiram o voto do relator, enquanto o ministro Nunes Marques acompanhou parcialmente Gilmar Mendes. O ministro, mais novo a integrar a Corte, demonstrou concordância com a regra de apenas uma reeleição, mas defendeu que a regra deveria ser aplicada desde já, o que impediria a reeleição de Maia e Alcolumbre.
Em seu voto, de 64 páginas, Gilmar Mendes fez questão de pontuar que o STF foi instado a decidir pela ação impetrada pelo PTB, mas que não isso não significa uma influência da Corte na eleição no Congresso.
"Decidiremos, entretanto, acerca da constitucionalidade de dispositivos regimentais que tratam sobre a composição da Mesa das Casas do Congresso Nacional. Não decidiremos acerca de quem vai compor a próxima Mesa: para tanto é preciso de votos no Parlamento, e não no Plenário deste Supremo Tribunal Federal.", diz voto do ministro.
De acordo com fontes ouvidas pela Reuters, apesar de ainda serem necessários os votos dos demais ministros da Corte, a tendência da Corte é permitir a eventual recondução dos dois parlamentares.
IMPACTOS
A ação foi movida pelo PTB, aliado ao presidente Jair Bolsonaro, com a intenção de barrar uma eventual reeleição de Maia e Alcolumbre na eleição marcada para o início de fevereiro de 2021. A legenda argumenta que a Constituição é taxativa ao proibir, em seu artigo 57, "a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente".
Esse processo --que definirá o responsável por ditar o ritmo da pauta das duas Casas Legislativas-- poderá ter repercussão na correlação de forças que o governo terá com o Congresso Nacional nos dois últimos anos da gestão Bolsonaro, com impactos inclusive numa eventual tentativa de reeleição dele.
Mesmo após o fim das eleições municipais, a agenda de votações do governo e do Congresso têm sido contaminada pelo xadrez da sucessão da presidência das Casas.
A despeito do texto constitucional ser claro em relação à vedação de recondução, uma das fontes do STF disse que a maioria dos ministros vai votar no sentido de que o assunto é de responsabilidade do próprio Congresso resolver.
Outra fonte, também do Supremo, afirmou que a tendência da Corte é decidir que o assunto da escolha dos integrantes das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado é "interna corporis" e, por tabela, permitir a possibilidade de Maia e Alcolumbre concorrerem à reeleição dos cargos.
Haveria ainda a possibilidade de uma solução intermediária, de acordo com a segunda fonte: permitir somente a possibilidade de Alcolumbre se candidatar. O argumento seria o de o mandato de um senador ser de oito anos (duas Legislaturas).
ASSUNTO INTERNO
O advogado Wesley Bento, sócio da Bento Muniz Advocacia, disse à Reuters que, apesar de o debate sobre a reeleição dos membros das Mesas Diretoras abranger normas constitucionais, ele também envolve interpretação dos regimentos internos dessas Casas Legislativas.
"O STF tem entendimento de que não cabe ao Judiciário dizer como o Legislativo deve agir para não invadir as competências daquele Poder", disse.
"O cabimento ou não da reeleição deve acabar dependendo de um juízo dos próprios membros do Legislativo", completou.
A ação tem como relator o ministro Gilmar Mendes. No julgamento virtual, os magistrados votam por meio de um sistema remoto e não há transmissão ao vivo da sessão. Eles têm uma semana para dar seus votos.
O julgamento poderá ser interrompido se qualquer um dos ministros pedir para levar o caso para julgamento no plenário --o que levaria a um recomeço, em sessão a ser futuramente marcada pelo presidente do Supremo.
A primeira fonte disse que não é possível saber se haverá um pedido de destaque para levar o caso para julgamento do plenário. Segundo essa fonte, no plenário virtual se resolve a questão com maior rapidez, mas pode ser que se queira jogar luz para o caso e aí se encaminhe o caso para o plenário do STF.
Às vésperas do início do julgamento, o debate sobre a sucessão --tanto jurídico quanto político-- ganhou corpo.
Juridicamente, partidos do chamado centrão como o PP --do líder Arthur Lira (AL), que conta com a simpatia de Bolsonaro para a sucessão da Câmara-- pediram ao Supremo que retirasse o caso do plenário virtual e querem fazer sustentação oral em defesa da proibição da reeleição para os cargos.
Na seara política, partidos do centrão e da oposição divulgaram esta semana uma carta aberta endereçada ao STF contra a possibilidade de reeleição de Maia e Alcolumbre.
O atual presidente da Câmara tem dito publicamente que não vai concorrer novamente ao cargo. Ele está no segundo mandato consecutivo --no primeiro foi eleito para um mandato-tampão com a queda do então presidente da Casa Eduardo Cunha (MDB-RJ) e depois se reelegeu em fevereiro do ano passado.
Mas há quem aposte que Maia poderá sim entrar na disputa ou, ao menos, ter um candidato para se contrapor a Arthur Lira, que estaria trabalhando para ser o candidato com o aval do Planalto.
Nesta sexta, o STF também vai começar a analisar, em outro julgamento virtual, uma ação referente à Covid-19: se o governo tem de ser obrigado a comprar 46 milhões de doses da vacina desenvolvida pela chinesa Sinovac, a CoronaVac, que está sendo produzida no Brasil pelo Instituto Butantan.