Atualizada às 11h04, com JPMorgan negando a informação de que se juntou aos credores nacionais para negociar com a Americanas.
Em um documento judicial, a Americanas acusou o BTG Pactual (BVMF:BPAC11) de "participação, conivência e culpa" no rombo contábil de R$ 20 bilhões que levou à crise na empresa. Na peça, obtida pelo Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, a companhia incluiu "cartas de circularização" do banco à auditoria PricewaterhouseCoopers (PwC) - esses documentos são usados por empresas de inspeção e credores para checar dados de balanços.
"O BTG também teve participação nos atos que culminaram no cenário periclitante atual. Aliás, não apenas participação, mas conivência e culpa", escreveram os advogados da varejista no recurso da Americanas ao processo movido pelo BTG contra a companhia no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo os defensores da Americanas, em 2021, a PwC pediu ao BTG informações sobre os ativos da empresa e "todo e qualquer passivo, incluindo-se eventuais empréstimos bancários e garantias".
"No entanto, em sua resposta à carta de circularização da PwC, o BTG não informou qualquer passivo", afirmou a defesa da rede de lojas. Para os advogados da empresa, o banco tomou essa atitude "possivelmente por considerar tal operação de 'risco sacado' como sendo meramente comercial, e não uma dívida financeira."
O risco sacado é uma linha de crédito que envolve uma triangulação entre a empresa, seus fornecedores e bancos - na operação, instituições financeiras quitam o débito da empresa com fornecedores e transformam o valor em dívida. "O BTG, na verdade, indicou somente ativos do Grupo Americanas, contribuindo para as inconsistências contábeis", segundo o documento judicial dos advogados da varejista.
Caixa
O embate entre Americanas e os bancos credores começou com o bloqueio de R$ 1,2 bilhão que a companhia tinha depositado no BTG. O banco alegou no processo ter feito a operação porque a companhia teria efetuado saques que somaram R$ 800 milhões.
Também nos autos, a varejista indicou que o avanço de bancos sobre seu caixa, iniciado pelo BTG, levou a rede a uma situação insustentável, com R$ 250 milhões para tocar toda a sua operação. A iniciativa dos bancos adiantou, disse a empresa, o pedido de recuperação judicial. A Americanas está agora no chamado "prazo de blindagem", período de 180 dias em que todas as suas dívidas ficam suspensas. A empresa informou à Justiça ter uma dívida de R$ 43 bilhões.
Recurso
A varejista questionou a legalidade do bloqueio do BTG, pois, de acordo com a Americanas, a operação foi feita sem respeitar o prazo de três dias para a resposta da empresa à notificação extrajudicial do banco. Se o prazo tivesse sido cumprido, a empresa já estaria protegida pela medida cautelar do Tribunal de Justiça do Rio que impedia vencimentos antecipados de dívidas. O trio de acionistas bilionários da Americanas - Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles - já atribuiu publicamente parcela da culpa pela crise aos bancos credores.
Resposta
Em nota, o BTG afirmou ser "inconcebível" alegar que a instituição teve influência no desfalque. "É completamente inconcebível alegar que o BTG Pactual iria compactuar com prática que poderia comprometer a sua exposição junto à companhia. A leviana criação de narrativas no intuito de atribuir aos bancos qualquer tipo de responsabilidade neste lamentável episódio tem por objetivo desviar a atenção do problema central", afirmou.
Bancos estrangeiros se aliam a nacionais contra trio de sócios da empresa
Bancos estrangeiros se juntaram formalmente ao grupo de bancos credores nacionais da Americanas para tentar avançar na negociação com a empresa. Segundo pessoas que acompanharam as ações, representantes de JPMorgan (NYSE:JPM), Bank of America (NYSE:BAC) e Goldman Sachs (NYSE:GS) participaram das conversas. O JPMorgan diz que a informação não procede.
Um dos objetivos dos bancos é buscar a tese de "desconsideração da personalidade jurídica", para cobrar os acionistas bilionários da Americanas: Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles. Quando uma empresa quebra, os credores têm direito a tentar retomar os bens e ativos só da companhia - a responsabilidade dos sócios é limitada. A exceção é quando há fraude, situação que envolve também os controladores.
De acordo com o executivo de um banco credor, que preferiu não se identificar, todos os bancos estão indo pelo mesmo caminho. Segundo ele, a única questão é analisar juridicamente qual deve ser o foro de cada ação, o Brasil ou o exterior.
Até aqui, Bradesco (BVMF:BBDC4) e Itaú (BVMF:ITUB4) conseguiram na Justiça de São Paulo sinal verde para produzir antecipadamente provas que possam comprovar quem foram os responsáveis pelo que suas defesas qualificam como fraude. No caso do Bradesco, a autorização é para a apreensão de e-mails de executivos e conselheiros da companhia, inclusive os que já deixaram os cargos, nos últimos dez anos. A Americanas alegou que o banco não poderia fazer essa coleta, mas até aqui, não obteve sucesso.
O que os bancos buscam é comprovar que houve fraude e que os principais acionistas conheciam a situação. Entre banqueiros, é comum a afirmação de que Carlos Alberto Sicupira, um dos membros do "trio", tinha voz decisória no dia a dia da Americanas, e que, portanto, não se pode supor que estaria distante de debates sobre as contas e o endividamento da empresa.
Os bancos têm rechaçado a tese dos advogados da Americanas - e dos seus maiores acionistas - de que eles possuem parte da culpa no rombo de R$ 20 bilhões, por terem assinado cartas de circularização.
Justiça de SP decreta sigilos em e-mails de executivos da empresa
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) atendeu a pedido da Americanas e colocou sob sigilo e-mails de executivos da companhia que podem ser apreendidos em ação de produção antecipada de provas movida pelo Bradesco. Além disso, a Justiça paulista permitiu o compartilhamento das mensagens com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que investiga o rombo contábil de R$ 20 bilhões da companhia.
A Americanas pediu ao TJ que os documentos fiquem sob sigilo até que haja uma triagem pelos peritos nomeados pelo tribunal. "O teor dos documentos a serem apresentados pelo Grupo Americanas tem caráter sigiloso, contendo não só informações sobre negócios, mas também sobre a vida privada das pessoas atingidas", afirmou a defesa da varejista.
O sigilo valerá apenas para os e-mails, documentos e demais dados que forem apreendidos até que o perito nomeado faça uma triagem. Este é outro ponto em que há divergência. A perita Patrícia Punder renunciou à função por "divergência sobre honorários". O nome substituto não foi definido. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.