Por Estelle Shirbon
LONDRES (Reuters) - A Suprema Corte da Grã-Bretanha decidiu nesta quinta-feira que 27 cartas "francas" escritas pelo príncipe Charles para ministros em 2004-2005 podem ser divulgado para a mídia, um passo que pode lançar dúvidas sobre a neutralidade política do futuro rei.
O jornal The Guardian procurava há uma década obter as cartas enviadas aos ministros na gestão do primeiro-ministro Tony Blair, mas os sucessivos governos agiram para impedir a publicação, com medo de prejudicar a posição do herdeiro do trono.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, disse que a decisão do Supremo Tribunal é "decepcionante" e que o governo vai agora analisar como divulgar a correspondência.
"Trata-se do princípio de que altos membros da família real são capazes de expressar seus pontos de vista ao governo de forma confidencial. Eu acho que a maioria das pessoas concordaria que isso é bastante justo", disse Cameron.
Uma porta-voz de Charles na Clarence House, sua residência oficial em Londres, disse que essa é uma questão para o governo. "A Clarence House está decepcionada pelo fato de que o princípio da privacidade não foi acolhido", disse.
Pela Constituição não escrita da Grã-Bretanha, a família real tem de permanecer politicamente neutra. A rainha Elizabeth manteve firmemente suas opiniões para si mesma durante o seu reinado, iniciado há 63 anos.
Charles, em contrapartida, expressa pontos de vista sobre assuntos pelos quais tem mais interesse, tais como a conservação da natureza, a arquitetura e plantas geneticamente modificadas.
Suas cartas aos ministros, apelidadas de "memos aranha negra" por causa de sua caligrafia cheia de rabiscos, são potencialmente controversas por criarem a percepção de que ele discorda do governo e tenta influenciar a política do país.
A controvérsia certamente não passa longe de Charles. Seu casamento turbulento com Diana, Princesa de Gales, que morreu em um acidente de carro em Paris em 1997, rendeu longos anos de manchetes para a mídia internacional. Seu casamento mais tarde com Camilla Parker Bowles também levantou questões sobre o status dela quando ele subir ao trono.
Depois de uma vitória judicial anterior do Guardian em sua campanha para se apossar das 27 cartas, o então procurador-geral Dominic Grieve usou seu direito de veto para bloquear a divulgação, em 2012, mas o veto foi declarado ilegal pelo Tribunal de Apelações, no ano passado.
Grieve argumentara que a divulgação "seria gravemente prejudicial para o seu papel como futuro monarca, porque, se ele perder a sua posição de neutralidade política, como herdeiro do trono, não poderá facilmente recuperá-la quando for rei".
Em uma última tentativa de impedir a divulgação das cartas, que descreveu como "particularmente francas", Grieve recorreu ao Supremo Tribunal do país, que rejeitou seu recurso.
(Reportagem de Stephen Addison e Ralph Boulton)