Juros altos são sinônimo de dinheiro escasso. Entre outros motivos, compensa para os investidores colocar sua poupança em aplicações seguras, como papéis do governo, o que tira os recursos da economia. Para o Pátria, que tem R$ 140 bilhões sob gestão e é o maior fundo de investimento de sua área na América Latina, esse movimento global trouxe duas realidades. De um lado, os grandes investidores passaram a repensar os investimentos mais arriscados, como os que oferece. "A gente sente a reflexão (dos grandes investidores) sobre a decisão de como alocam o portfólio, o que é natural quando há uma mudança estrutural de taxa de juros, mas nada que ameace o longo prazo", afirma Daniel Sorrentino, sócio e presidente executivo do Pátria Investimentos para a América Latina, que participou do programa de entrevistas em vídeo "Olhar de Líder", do Estadão/Broadcast.
De outro lado, empresas e projetos ficaram bem mais baratos. "A verdade é que o CDI (títulos emitidos por bancos como forma de captação), nos patamares atuais, drena muito capital da economia", diz. "Essa falta de capital na economia gera demanda por recursos muito grande e é quando, para nós, aparecem ótimas oportunidades."
A entrevista está disponível no Broadcast TV. Abaixo, os principais trechos:
O Pátria tem histórico de gerar bons retornos aos acionistas, e alguns projetos têm impacto social, como o processamento de açaí da Frooty ou o projeto de dessalinização que retirará de circulação caminhões-pipa no Chile. Qual é o impacto da geração de riqueza do Pátria?
Não há essa conta, mas para cada real investido pelo Pátria há um efeito multiplicador grande. Trazemos para os investimentos um capital de longo prazo, formador de ativos, que tem como objetivo geração de empregos, receita e outros impactos na economia. Estimaria que o multiplicador desse capital é superior a duas a três vezes, a cada real que investimos.
Como é competir, pelo dinheiro do investidor, com juros a quase 14% ao ano?
Nosso olhar, como investidor, é sempre para um horizonte de 5 a 15 anos, tempo que o capital empregado em ativos e empresas leva para trazer resultado. A taxa de juros, hoje, é uma taxa de desequilíbrio, de certa forma. Quando comparamos nossos resultados históricos, percebe-se que os investidores experimentam nesse tipo de produto - o ativo alternativo, também conhecido como ativo privado - retorno muito superior ao CDI, que é a taxa básica de juros do Brasil. Mas enxergamos o momento particular como de oportunidade. Claro, é muito difícil convencer o investidor, de maneira geral, de que é um bom momento para entrar num ativo de risco e de longo prazo, quando se tem a competição com o CDI. A verdade, porém, é que o CDI, no patamar que está, drena muito capital da economia. Essa falta de capital gera demanda por recursos muito grande, e é quando, para nós, aparecem ótimas oportunidades. Em todos os negócios e as classes de ativos nos quais estamos investindo, encontramos excelentes oportunidades. Temos essa discussão diariamente com os clientes
que fazem contas, né?
Exatamente. Eles veem diferentes produtos ligados ao desempenho do CDI, alguns isentos de Imposto de Renda, o que faz com que sejam altamente atrativos. Mas nossa abordagem é de longo prazo, e a gente propõe que qualquer pessoa tenha uma alocação de 10% a 30% de seu portfólio nesse tipo de ativo. Não é um 'ou' outro. É um 'e' outro.
Alguns fundos de pensão americanos têm anunciado redução nos investimentos em private equity (compra de participações em empresas), menos atraentes com a alta dos juros nos EUA. O Pátria já sentiu esse impacto?
É importante trazer um pouco do contexto à situação atual. Os fundos de pensão americanos vêm, ao longo dos últimos 20 anos, aumentando significativamente a alocação em private equities. Essa onda de crescimento gerou resultados muito expressivos e superiores aos que experimentaram em outras alocações. Imagine ter 10% do portfólio que teve um desempenho muito bacana e, um dia, ele virou 20% porque cresceu muito... Um segundo elemento é a alocação das classes de ativos em relação aos juros, que mudou. É natural que uma mudança de taxa de juros implique uma mudança de alocação. Como reflexo, os fundos passaram a ter menos apetite a crescimento do que no passado, mas o mercado continua extremamente saudável e pujante. É mais um ruído pontual do que uma questão estrutural.
Mas vocês sentiram?
A gente sente a reflexão (dos fundos de previdência) de que estão tomando uma decisão de como alocam o portfólio, o que é natural. Quando há uma mudança estrutural de taxa de juros globalmente, como agora, é natural que investidores parem para revisar e repensar o portfólio. Nos preocupa no médio e no longo prazos? De forma nenhuma. A tendência é clara e positiva. Temos convicção de que é uma classe de ativos que mais e mais faz parte da alocação de qualquer tipo de investidor: dos mais sofisticados do mundo, como os fundos soberanos e de pensão, até o poupador individual brasileiro, que deveria ter uma alocação nesse tipo de produto.
De que maneira um governo menos afeito às privatizações e às concessões posterga investimentos?
O tema mais relevante ligado à infraestrutura tem a ver com a capacidade da federação e dos Estados de, com seus próprios balanços, cumprir com as necessidades de infraestrutura do País. Sabemos que existe uma dificuldade enorme e falta de capital. A participação de investidores e da iniciativa privada, de maneira geral, é necessária em qualquer país. Todo governo sabe ser necessário trazer a iniciativa privada a seu lado e construir um arcabouço regulatório para que os investimentos sejam feitos. As mudanças são naturais e saudáveis, com a troca de governo, do modelo como o Brasil faz concessões e atrai o capital privado de longo prazo. Em vários momentos, e este não é diferente, somos chamados como parte da mesa para debater abertamente as mudanças e o que é necessário para que se viabilizem os investimentos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.