Por Flavia Bohone
SÃO PAULO (Reuters) - A recente alta do dólar sobre o real vai continuar pressionando a inflação brasileira especialmente em 2015, quando a moeda norte-americana ainda deve reagir a possíveis mudanças no programa de intervenção no câmbio no Brasil e à alta de juros nos Estados Unidos, dificultando a vida do Banco Central na condução da inflação de volta para o centro da meta.
Segundo cálculos de especialistas consultados pela Reuters, o impacto de uma alta de 10 por cento do dólar sobre os preços em geral é de 0,3 a 0,6 ponto percentual ao longo de 12 meses. E considerando que o IPCA, índice oficial de inflação, não dá sinais de arrefecimento, esse movimento do câmbio pode custar o cumprimento da meta do governo --de 4,5 por cento com margem de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
"O Banco Central tem muitos motivos para manter o aperto monetário", disse o estrategista para América Latina do Barclays, Bruno Rovai, que vê impacto de 0,40 ponto no IPCA em 12 meses a cada 10 por cento de alta do dólar frente o real.
O BC já reconheceu que a forte alta do dólar é um dos problemas a ser enfrentado diante dos ajustes de preços relativos --leia-se câmbio e preços administrados. Não por menos, a autoridade monetária acelerou o passo do atual ciclo de aperto dos juros.
Em novembro, o IPCA subiu 0,51 por cento, acumulando alta de 6,56 por cento em 12 meses. Segundo pesquisa Focus do BC com economistas de instituições financeiras, o índice deve acumular neste ano uma alta de 6,38 por cento. A variação do IPCA iria a 6,50 por cento em 2015, desacelerando a 5,50 por cento tanto em 2016 como em 2017.
Apenas entre setembro e novembro, a moeda norte-americana teve valorização de quase 15 por cento sobre o real.
As perspectivas para o rumo do dólar são de ainda mais pressão, com a possibilidade de mudanças no programa de intervenção diária no câmbio feito pelo BC e o início do aumento das taxas de juros nos Estados Unidos, que tem potencial para levar investidores a transferirem recursos hoje aplicados em mercados mais arriscados, como o Brasil, para a maior economia do mundo.
A estimativa de economistas é que a moeda norte-americana termine 2015 a 2,70 reais, segundo a última pesquisa semanal Focus.
Com as expectativas de inflação ainda pressionadas, o aperto monetário do Copom deve continuar, levando a Selic --hoje em 11,75 por cento ao ano-- a 12,50 por cento ao final de 2015, segundo o relatório Focus.
PRESSÃO DO FED
A expectativa do mercado é que o Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, comece a subir a taxa básica de juros em meados do próximo ano.
Recentes dados da economia norte-americana mostraram recuperação mais forte e aumentaram as especulações de que elevação poderia vir antes do previsto, pressionando ainda mais o dólar e, por conseguinte, a inflação.
"O Brasil é um dos países que tem forte coeficiente de repasse da alta cambial para a inflação", disse o economista-chefe para Brasil do Bank of America Merrill Lynch, David Beker, que vê repasse de 0,30 a 0,60 ponto percentual na inflação para cada 10 por cento de aumento do dólar.
"O maior impacto é nos três primeiros meses, mas o que importa é onde estabiliza (a cotação do dólar) e o mercado ainda não sabe onde o dólar vai estabilizar", acrescentou.
Além do câmbio, a inflação do próximo ano deve seguir pressionada pelos preços administrados, sendo que a esperada desaceleração nos custos de serviços deve servir apenas como um pequeno alívio.
"Se fosse dado todo o reajuste necessário de eletricidade, a inflação de 2015 passaria para 7,5 por cento", disse Rovai, do Barclays, que projeta o IPCA com alta de 6,5 por cento no próximo ano, considerando que os reajustes tarifários serão controlados para não pressionarem ainda mais o indicador oficial de inflação.