Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - A hidrelétrica de Belo Monte, que está em construção no Pará, precisa apresentar ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) um contrato de venda dos 20 por cento da energia da usina que ainda não foram negociados para conseguir a liberação de 2 bilhões de reais do financiamento ao empreendimento.
O problema é que a Norte Energia, responsável pela usina, não tem encontrado comprador para essa energia pelo preço acertado junto ao banco, em função das atuais condições de fraqueza na demanda do mercado, afirmou à Reuters um dos integrantes do Conselho de Administração da companhia, José Aílton de Lima.
A liberação dos recursos do BNDES é importante para evitar a necessidade de novos desembolsos de até 5,5 bilhões de reais pelos acionistas da companhia, que incluem Eletrobras (SA:ELET3), Cemig (SA:CMIG4), Light (SA:LIGT3), Neoenergia e a mineradora Vale.
Para evitar essa situação, a companhia pretende aproveitar uma mudança de regra estabelecida pelo governo no final do ano passado, que permite que usinas em construção ou que tenham entrado em operação recentemente possam vender uma fatia extra de energia em leilões regulados, que têm as distribuidoras como compradoras.
"Se conseguirmos vender bem (a energia) no leilão, ótimo, conseguimos esses recursos do BNDES. Se não conseguirmos, aí é uma dificuldade que os sócios (da Norte Energia) terão que encarar", disse Lima.
Belo Monte, no rio Xingu (PA), com 11.233 MW de capacidade instalada, que será a terceira maior hidrelétrica do Brasil, teve ao todo 22,5 bilhões de reais em financiamentos aprovados pelo BNDES.
A Norte Energia tem como principal acionista a Eletrobras, com as subsidiárias Chesf e Eletronorte, além de Cemig, Light, Neoenergia e Vale. Também participam os fundos de pensão Petros e Funcef, além do grupo do setor de aço Sinobras e da J. Malucelli Energia.
Lima explicou à Reuters que os 20 por cento da energia da hidrelétrica, que originalmente seriam comercializados no mercado livre de eletricidade, precisam ter um preço de 130 reais em base de abril de 2010, o que representaria cerca de 185 reais atualmente, em um contrato de 30 anos.
O preço para contratos no mercado livre com início de fornecimento a partir de 2017 varia hoje de 115 a 120 reais por megawatt-hora, segundo estimou o presidente da comercializadora de energia América, Andrew Frank.
"Esse preço não remunera o investimento (na construção de uma usina) nos dias de hoje, e é uma situação conjuntural também para os próximos anos", afirmou.
Segundo Frank, os preços caíram fortemente desde o ano passado devido à redução do consumo e a uma boa perspectiva de chuvas.
Procurado, o BNDES não comentou a informação imediatamente.
HIDRELÉTRICA PRÓXIMA DE OPERAR
Segundo Lima, a Norte Energia ainda precisará investir 5,5 bilhões de reais para concluir a mega hidrelétrica do rio Xingu, que tem previsão de iniciar a geração de energia no próximo mês.
A hidrelétrica está orçada em 25,8 bilhões de reais, em valores de 2010.
"Esses 2 bilhões de reais (do BNDES) são o que a gente precisaria até junho", afirmou o conselheiro, que disse que o montante é a única parcela que a Norte Energia ainda tem a receber do financiamento do banco.
Segundo ele, como esse dinheiro ainda não foi liberado, os acionistas da companhia serão chamados a fazer um aporte de 590 milhões de reais no empreendimento agora em janeiro e mais 510 milhões de reais em fevereiro.
"Temos que ir equacionando o caixa mês a mês, essa é a realidade do projeto hoje."
O conselheiro disse que a situação é resultado da grande dificuldade de vender a energia da usina no mercado livre.
"Nenhum consumidor livre vai comprar energia por 30 anos como o BNDES exige."
Após o leilão que viabilizou Belo Monte, em 2010, o diretor financeiro da Eletrobras, Armando Casado, chegou a dizer que a Eletrobras garantiria a compra da parcela de energia da usina destinada ao mercado livre.
Segundo Lima, no entanto, a estatal possui apenas um direito de preferência na compra dessa energia, que está explicitado no acordo de acionistas da Norte Energia. "Não existe no acordo uma obrigação da Eletrobras de comprar."
Mesmo com a venda no leilão, a companhia ainda precisará correr atrás de compradores de sua eletricidade, uma vez que o certame A-5 tem início de fornecimento em 2021.
"Se vendermos no leilão está resolvida uma parte, mas ainda tenho que equacionar esses cinco anos."
A expectativa da Norte Energia é de que após a operação da primeira máquina, em fevereiro, novas turbinas sejam ligadas a cada dois meses.
Seguido esse programa e com os 2 bilhões de reais que tenta liberar junto ao BNDES, a empresa garantiria recursos para concluir a usina apenas com as receitas de venda da energia produzida, sem que os acionistas precisem aportar mais recursos.