Por Anthony Boadle
BRASÍLIA (Reuters) - Líderes indígenas manifestaram desapontamento nesta segunda-feira depois que o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva pareceu voltar atrás na promessa de criar um ministério de assuntos indígenas para ajudar a restaurar direitos e proteções que foram prejudicados pelo atual governo.
Lula disse na sexta-feira que poderia decidir por uma secretaria especial vinculada à Presidência, em vez de um ministério de pleno direito, o que desapontou os líderes indígenas que foram pegos de surpresa por seus comentários.
“Foi uma proposta de campanha do Lula e ainda estamos trabalhando na construção de um Ministério dos Povos Originários”, disse Dinamam Tuxá, advogado do maior grupo indígena do país, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Sonia Guajajara, líder da Apib que em outubro se tornou apenas a terceira indígena eleita para o Congresso, disse que um grupo de trabalho da equipe de transição de Lula apresentará uma proposta para o ministério na próxima semana, mas ela não espera nenhum anúncio até a posse em 1º de janeiro.
O ministério é importante para o reconhecimento histórico dos 900 mil indígenas do Brasil e a reparação por seus maus-tratos e perda de direitos à terra, disse ela à Reuters.
Lula recebeu muitos aplausos na reunião do clima COP27 no Egito, no mês passado, quando disse aos delegados explicitamente que criaria um ministério indígena para garantir "sobrevivência digna, segurança, paz e sustentabilidade" para cerca de 300 povos indígenas que ainda existem no Brasil.
Sob o governo do presidente Jair Bolsonaro, a quem Lula derrotou nas eleições de outubro, a violência aumentou contra as comunidades indígenas, cujas terras foram cada vez mais invadidas por garimpeiros, madeireiros e criadores de gado ilegais.
“A homologação de terras indígenas que foram paralisadas sob Bolsonaro deve ser reiniciado e ações urgentes são necessárias para proteger os indígenas, bem como os defensores do meio ambiente e defensores de nossos direitos que estão em risco”, disse Guajajara.
Bolsonaro reduziu as medidas de fiscalização ambiental e apoiou a legislação para permitir a agricultura comercial e a mineração na Amazônia, e até mesmo em terras protegidas de reservas indígenas -- medidas que a Apib agora está procurando reverter.
Guajajara disse que a violência do crime organizado aumentou em áreas de fronteira, como o Vale do Javari, na fronteira com o Peru, onde o jornalista britânico Don Phillips e o indigenista Bruno Pereira foram assassinados por pescadores ilegais em junho.
Especialistas indígenas disseram que a criação de uma secretaria diretamente sob a alçada da Presidência poderia ser mais rápida de configurar, mais eficaz e de menor custo.
Mas os líderes indígenas disseram que era necessário um ministério para apoiar suas comunidades com o poder de mobilizar outros ministérios e até mesmo a polícia e as forças de segurança para protegê-los.
“Nossa situação é tão complexa hoje que precisamos de um ministério bem robusto com muitas atribuições para nos defender”, disse Eliesio Marubo, advogado do grupo indígena Univaja, do Vale do Javari.
Uma das principais demandas indígenas é a reforma da Funai, que atualmente é chefiada por um policial nomeado por Bolsonaro e visto pelas pessoas que deveria proteger como uma ferramenta dos interesses fundiários do setor agrícola.